Por Davi Caldas (odavicaldas@usp.br) e Diego Coppio (diegocoppio@usp.br)
Na última segunda-feira (24), às 8h, houve a estreia da seleção brasileira na Copa do Mundo Feminina de 2023. Com um domínio do início ao fim, o Brasil goleou o Panamá por 4 a 0, com direito a um hat-trick da, agora, artilheira da Copa, Ary Borges, e a um golaço de placa de Bia Zaneratto.
Pré-jogo e curiosidades
Presente em todas as Copas do Mundo da história, o Brasil, dirigido pela experiente técnica sueca Pia Sundhage, foi campeão da Copa América em 2022, em cima da Colômbia, e disputou a Finalíssima este ano, perdendo para a Inglaterra. Nas duas ocasiões, a seleção não pôde contar com a presença de Marta, já que a atacante vem sofrendo com lesões.
Apesar de reserva da equipe atualmente, Marta é o símbolo do Brasil e, além de já ter o recorde de mais gols na história das Copas do Mundo, com 17 gols — um a mais que Miroslav Klose —, a lenda brasileira também chega nesta Copa com a possibilidade de bater mais um recorde: tornar-se a primeira jogadora, entre homens e mulheres, a marcar em seis edições diferentes do Mundial. A rainha do futebol compete com a canadense Christine Sinclair pelo pioneirismo do feito.
Desde a lesão da Rainha Marta, três pessoas revezaram a faixa de capitã: Rafaelle, Tamires e Debinha. Contra o Panamá, Rafaelle usou a braçadeira.
O Panamá fez a sua estreia em Copas do Mundo Femininas no jogo contra o Brasil, assim como a seleção panamenha masculina fez contra a Bélgica, em 2018, na Rússia.
Escalações e esquemas táticos
O Brasil veio a campo montado em um 4-4-2, com Letícia no gol; Tamires, Rafaelle, Lauren e Antônia Silva na defesa; Adriana, Luana Bertolucci, Kerolin e Ary Borges no meio-campo; e Debinha e Bia Zaneratto no ataque.
Na prática, o time jogava em uma espécie de 2-4-2-2, já que as duas laterais avançavam para o meio-campo, juntando-se à Luana e à Kerolin, e empurravam Ary Borges e Adriana para uma linha a frente das quatro, com a dupla jogando um pouco atrás das atacantes. Porém, o ataque era bem fluido, e Adriana, Debinha, Zaneratto e Ary – as quatro jogadoras mais ofensivas – flutuavam no setor, podendo formar, às vezes, uma linha tripla ou quádrupla no ataque. Já na defesa, o Brasil se portava da mesma forma em que foi escalado.
Escalação do Brasil [Imagem: Reprodução/Youtube/CazéTV]
O Panamá veio em um 5-4-1, com Yenith Bailey no gol; Hilary Jaen, Carina Baltrip-Reyes, Rosi Vargas, Yomira Pinzón e Katherine Castillo na defesa; Marta Cox, Schiandra Gonzalez, Aldrith Quintero e Natalia Mills no meio-campo; e Karla Riley no ataque.
Com o time defensivo, a formação usada no jogo era exatamente igual ao desenho da escalação e, como a equipe passou boa parte do jogo na retranca, esse foi o principal modelo de jogo panamenho.
Nos poucos momentos em que subiu ao ataque, o Panamá utilizava um sistema com três zagueiras. Assim, Jaen e Castillo subiam ao meio-campo, e Cox e Mills se adiantavam um pouco também, formando uma linha atrás da atacante, como um 3-4-2-1.
Escalação do Panamá [Imagem: Reprodução/Youtube/CazéTV]
Primeiro tempo: o ataque retumbante do Brasil
Com menos de um minuto de jogo, o Brasil já mostrou a sua força no primeiro ataque da partida. Após um belo passe enfiado à área de Bia Zaneratto, Adriana chegou chutando de primeira, mas a goleira Bailey saiu bem do gol para fechar o ângulo e fez a defesa.
O time brasileiro seguiu pressionando e atacando, com alguns ataques de Bia e Debinha, além de uma boa chegada de Antônia no ataque. Mas a próxima grande chance da seleção canarinho só veio acontecer aos 19’, e o Brasil aproveitou para marcar seu primeiro gol na partida. Após receber a bola pelo lado esquerdo do campo, Debinha cortou a marcação e cruzou na área para Ary Borges cabecear muito bem e fazer o gol brasileiro.
Aos 22’, Kerolin acertou um chute de muito longe no travessão, mas o lance já havia sido paralisado por marcação de uma falta de ataque. Aos 31’, mais um ataque brasileiro muito perigoso, com Luana roubando a bola no meio do campo e possibilitando o contra-ataque do time. Após isso, Bia passou para Kerolin, que deu um belo passe à Adriana para ela devolver a bola à Bia já dentro da área. Com muita velocidade, deixou escapar um pouco a bola depois de seu domínio, o que deu tempo à goleira para sair bem do gol e bloquear o chute.
Aos 35’, Tamires cobrou uma falta e Debinha tentou de bicicleta. Como a atacante pegou mal na bola, ela acabou indo ao meio da área para Kerolin, que passou para Luana chutar ao gol, o que resultou em uma defesaça de Bailey. Em mais um ataque, aos 39’, Adriana passou para Tamires fazer o cruzamento e Ary Borges chegar de cabeça. A goleira ainda chegou a defender o cabeceio, mas, no rebote, Ary colocou a bola para dentro das redes.
O Brasil ainda tentou ampliar o placar antes do fim do primeiro tempo, aos 45+1’, mas Bia não conseguiu o domínio no cruzamento de Tamires, e a bola ficou nas mãos da goleira do Panamá.
Segundo tempo: uma bela goleada
O segundo tempo começou no mesmo ritmo agitado do primeiro. Aos 48’, Tamires acionou Debinha pela esquerda no ataque, que tabelou com Adriana de letra e cruzou para Ary. A artilheira rolou de calcanhar para Bia Zaneratto sacramentar um golaço, ampliando o placar para o Brasil.
Mesmo com uma vantagem de três gols, o Brasil não deixou de atacar e pressionar as adversárias. Pouco depois do gol, Bia Zaneratto recebeu novamente na área e tentou encobrir a goleira, mas chutou para fora.
Aos 54′, o técnico Quintana promoveu uma alteração dupla no Panamá: saíram Riley e Mills para a entrada de Tanner e Cedeño. A mudança surtiu efeito rapidamente: com três minutos em campo, Tanner fez bom passe para Baltrip-Reyes dar a primeira finalização do Panamá em uma Copa do Mundo.
Tanner chegou novamente com perigo, aos 65′, em bola enfiada para ela em velocidade, mas Lelê estava atenta ao lance e dividiu a bola com a atacante panamenha.
O Brasil fez suas primeiras substituições aos 58′, com Bruninha, Gabi Nunes e Geyse nos lugares de Antonia, Bia Zaneratto e Debinha. Mesmo com a ligeira melhora do Panamá, o Brasil não passou por dificuldades — ofensivas e defensivas — no segundo tempo. Aos 67′, Lauren fez um lançamento do campo de defesa para Kerolin, que cortou para o meio e chutou no canto do gol, levando perigo para a goleira Bailey.
Aos 70′, Geyse cruzou para Ary marcar de cabeça, fazendo 4 a 0 e completando seu hat-trick. Cinco minutos depois, aconteceu um dos momentos mais esperados pelos brasileiros: a rainha Marta entrou em campo no lugar da ovacionada Ary Borges. Duda Sampaio também entrou, no lugar de Luana.
Gabi Nunes entrou bem no jogo, com bastante movimentação no ataque brasileiro. Aos 79′, ela deu um belo chapéu de calcanhar na área, rolou para o meio mas o passe foi interceptado pela defesa. Um minuto depois, ela foi derrubada na área, mas a árbitra mandou o lance seguir após orientação do VAR. A essa altura do jogo, o Brasil finalizou 30 vezes, sendo dez em direção ao gol. Já o Panamá finalizou quatro, com uma no gol de Lelê.
A estreia de Marta na Copa foi discreta. Aos 90+1′, Gabi Nunes sofreu falta próxima a área. A rainha cobrou fraco nas mãos da goleira. Pouco depois, Marta acertou bom passe para Duda Sampaio chutar na rede pelo lado de fora.
Comentários
O Brasil fez um jogo de muita pressão e intensidade no ataque, com boas movimentações do time para criar chances de gols. A tática foi não deixar o Panamá respirar em campo e mostrar toda a superioridade técnica e tática da equipe brasileira, estratégia bem feita. Isso se comprova ao analisarem-se os números da seleção, com 73% de posse de bola e 32 finalizações no jogo, sendo 10 em direção ao gol. Assim, foi uma estreia excelente da canarinho, que não só venceu, mas também convenceu o público de seu potencial.
Já o Panamá não conseguiu equiparar o jogo em nenhum momento da partida e se viu encurralado no incessante ataque brasileiro. O time tentou se fechar e esperar o adversário atacar para que as jogadoras panamenhas pudessem jogar no contra-ataque, mas a eficiência das jogadas brasileiras e a rapidez nos gols acabou com a tática de início do jogo do Panamá.
Destaques
Do time panamenho, o maior destaque foi a goleira Yenith Bailey, que mesmo tomando quatro gols, fez seis defesas durante toda a partida, sendo quatro delas de chutes de dentro da área, o que ajudou o Panamá a não perder por um placar ainda mais elástico.
Outra atleta importante foi a atacante Riley Tanner, cuja entrada conferiu ao Panamá melhor qualidade no passe e mais velocidade no ataque e nas transições. A atacante foi responsável por uma finalização e duas chegadas com perigo ao gol de Lelê.
Riley Tanner, de apenas 23, anos foi o grande destaque ofensivo do Panamá [Imagem: Reprodução/Twitter @fepafut]
Já do lado brasileiro, o grande destaque foi Ary Borges: eleita como a melhor jogadora da partida, a atleta foi “gigante pela própria natureza”. A jogadora foi a primeira na Copa do Mundo de 2023 a fazer um hat-trick e ainda deu a assistência – de calcanhar – para o terceiro gol do Brasil, tendo então participado diretamente de todos os gols brasileiros da partida. Além disso, ela terminou a partida com a incrível marca de 95% de aproveitamento nos passes, com 41 acertos.
Ary Borges ganhando o prêmio de Player of the Match [Imagem: Reprodução/Instagram @fifawomensworldcup]
Outro nome que pode ser citado é o de Bia Zaneratto, que fez o terceiro gol da seleção brasileira e participou ativamente de várias chances do Brasil, jogando entre linhas e aproveitando os espaços cedidos pelo Panamá. Dois pilares para o bom desempenho da canarinho também foram a dupla de meio-campo Kerolin e Luana, já que foram muito importantes nas criações de jogadas e na distribuição do jogo brasileiro. Uma prova disso é a quantidade de passes certos feitos por elas: Kerolin fez 54 (com mais de 91% de aproveitamento) e Luana fez 36 (com 75% de aproveitamento).
Além delas, Adriana também merece um destaque, já que foi outra que contribuiu para a criação de tantos ataques do Brasil e teve 86% de aproveitamento nos passes, com 43 acertos. Mas mesmo com esses destaques especiais, toda a seleção brasileira, de um modo geral, foi bem, com cada jogadora fazendo o seu papel no campo de forma correta.
Futuro do grupo
A vitória sobre o Panamá era fundamental para o Brasil, tanto pensando na tabela como no estado anímico do time.
Com o empate entre França e Jamaica, o Brasil assumiu a liderança do grupo F e tem boa vantagem no saldo de gols. No dia 27, às 7h (horário de Brasília), a seleção enfrenta uma França pressionada. Caso as brasileiras vençam, estarão classificadas para as oitavas de final da competição.
Já o Panamá encontra-se em uma situação delicada. Mesmo que vença a Jamaica no dia 27, às 9h30, ainda terá a França pelo caminho e, dependendo do resultado do jogo contra o Brasil, entrará em campo precisando da vitória para se classificar.
*Foto de capa: [Imagem: Reprodução/Instagram @cbf_futebol]