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Da vitória à queda: 10 anos do dia em que Massa quase conquistou o mundo

Por Amanda Capuano Domingo, 2 de Novembro de 2008. O céu de São Paulo ostentava um cinza característico. A chuva forte molhara a pista recém reformada de Interlagos momentos antes da mais importante corrida do automobilismo brasileiro desde os tempos áureos de Ayrton Senna. Era a primeira vez que o país sediava uma final com um …

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Por Amanda Capuano

Felipe Massa. (Imagem: Twitter/Reprodução)

Domingo, 2 de Novembro de 2008. O céu de São Paulo ostentava um cinza característico. A chuva forte molhara a pista recém reformada de Interlagos momentos antes da mais importante corrida do automobilismo brasileiro desde os tempos áureos de Ayrton Senna. Era a primeira vez que o país sediava uma final com um brasileiro na busca pelo título e o clima nas arquibancadas, diferente do dia chuvoso, era de otimismo: um piloto da casa não vencia um campeonato desde o tri de Senna em 1991, 17 anos antes, e nunca estivera tão perto de repetir o feito.

Felipe Massa, aposta da Ferrari, havia feito uma temporada grandiosa e brigava pela primeira colocação ao lado da jovem promessa da McLaren, Lewis Hamilton. Para o paulistano levantar a taça na terra natal, a conta era simples: vencer a corrida e torcer para que o inglês ficasse fora do top 5. Apesar da combinação de resultados, que dava a Hamilton a vantagem de depender somente de si, tudo estava em aberto.

Segundo Marcelo Courrege, comentarista de Fórmula 1 pela TV Globo, o ano de 2008 foi marcado pelo equilíbrio entre as equipes, com alternância de protagonismo entre os líderes. “Havia uma equivalência entre os motores V8 da Mercedes (McLaren) e Ferrari. Em termos aerodinâmicos, o carro da McLaren tinha vantagem em pistas com mais curvas de alta, enquanto a Ferrari tinha melhor desempenho em traçados mais travados”.

A chuva forte que se intensificou com os carros já alinhados no grid forçou a troca dos pneus antes do início da corrida, atrasando a largada. Massa tinha a pole-position, enquanto Hamilton ocupava a quarta posição quando a tradicional bandeira quadriculada balançou no ar dando voz ao ronco dos motores. A partir daí, 71 voltas separavam os dois pilotos do título inédito, para a euforia e ansiedade de quem assistia dos sofás ou arquibancadas do autódromo.

A corrida seguiu como o planejado. Com a chuva do início cedendo, os pilotos voltaram ao pitstop para outra troca de pneus, que se mostraria decisiva mais adiante. Sem nenhum incidente, o brasileiro manteve a ponta sem ameças durante todo o percurso. Foi uma prova perfeita para Massa. O piloto, que brigava pelo título de melhor do mundo, fez jus à sua classificação, mas não dependia apenas dele e Hamilton não estava disposto a facilitar sua vida. O inglês manteve-se entre a terceira e quinta posição durante praticamente toda a prova, administrando a vantagem de pontos sobre o rival.  

Dos boxes da Ferrari, a equipe de Massa acompanhava atenta cada curva da McLaren. A apreensão aumentava conforme o número de voltas diminuía e Hamilton seguia entre os cinco primeiros. Bastava uma posição para o Brasil voltar à glória máxima do esporte. A torcida verde e amarela vibrava por seu representante enquanto esperava por uma falha do adversário. E então tudo mudou em segundos.

69 voltas depois, e a apenas duas para o final, a Toro Rosso do jovem Sebastian Vettel ultrapassou Lewis, deixando o inglês na sexta colocação. Com Massa matematicamente na frente, a vibração nos boxes foi instantânea. Bastava tudo manter-se assim por poucos quilômetros. Do outro lado, a tensão aumentou e, a cada metro corrido por Hamilton, retomar a posição parecia mais difícil.

A chuva caía novamente em Interlagos e, debaixo dela, Felipe Massa cruzou a bandeira sob gritos e aplausos. No rádio, perguntou a posição do adversário: sexto, alguém respondeu. Massa já comemorava, assim como a equipe da Ferrari. O Brasil teria novamente um campeão. Mas a corrida ainda não tinha terminado e a comemoração cobraria o seu preço.

Na quinta colocação, a Toyota de Timo Glock separava Hamilton do título. Bastavam alguns metros e o resultado estaria consolidado. “A chuva aumentou muito naquela parte da corrida e ele [Glock] estava com pneus intermediários. Ele tentou entrar nos boxes duas vezes para trocar, mas a equipe o mandou seguir por causa da confusão que havia ali com tanta gente comemorando o título do Massa antes do tempo”, contou Courrege. Com os pneus errados, a Toyota não parava na pista, era impossível de guiar naquelas condições. Por outro lado, naquela época, Hamilton já mostrava habilidade no molhado. E, então, o cenário mudou pela última vez naquele dia.

A cerca de 700 metros da linha de chegada e 2 minutos e 42 segundos depois da ultrapassagem de Vettel sobre Hamilton – que dera a Massa a dianteira da tabela -, Glock perdeu a posição para o inglês. Não havia mais nada a  fazer: a comemoração antecipada da Ferrari frustrou as tentativas do piloto, que não segurou a habilidade da jovem promessa sob as águas. Ele nunca agradeceu. A chuva que tanto fez Senna brilhar e deu ao público brasileiro inúmeras vitórias, devolveu a Lewis Hamilton a quinta colocação, 17 segundos depois do brasileiro finalizar a prova como o melhor do mundo. E era tudo o que ele precisava para arrancar das mãos de Massa o tão sonhado primeiro título.

Felipe Massa chora ao deixar o carro após saber da perda do título. (Imagem: Associated Press)

O britânico cruzou a linha sob olhares perplexos e consagrou-se o mais jovem campeão mundial até então, aos 23 anos de idade, frustrando a multidão verde e amarela que já comemorava a vitória. O espanto da equipe de Massa foi evidente. A vibração dos segundos anteriores foi substituída por expressões desapontadas e apáticas. A corrida havia terminado e o título não era brasileiro. 98 a 97. Um ponto de diferença. 17 segundos de glória e a queda.

Em casa e sob o olhar esperançoso de uma torcida que reivindicava um novo ídolo, Massa conquistou sua última vitória em um grande prêmio. Não foi suficiente. Seu nome ficou marcado na história pela decepção do segundo lugar. Nas palavras de Courrege: “foi um ápice um pouco precoce, que, infelizmente, foi sucedido pelo acidente de Hungaroring no ano seguinte e uma mudança na característica dos pneus da F1. Essas duas questões o transformaram num piloto menos competitivo”. A promessa da Ferrari nunca mais chegaria tão perto de seu ápice.

No alto do pódio, o piloto não segurou o choro. As lágrimas de quem fez tudo certo e ainda assim não alcançou o que desejava foram compartilhadas com idosos, jovens e crianças. Brasileiros que tiveram a esperança alimentada novamente – ou pela primeira vez – de ver um dos seus conquistar o mundo, e assistiram sua queda nos últimos minutos… segundos. O champanhe da vitória nunca antes teve um gosto tão amargo.

Órfãos de Ayrton Senna e há 17 anos sem vitórias, a perda do título recaiu com força sobre a torcida tupiniquim. Para muitos, aquele 2 de novembro ficou marcado por frustrar a paixão pelo automobilismo e pelo abandono do esporte. A esperança revivida por Massa, de ter de volta os tempos de ouro de Senna e Piquet, escorreu pelos dedos e ficou só na promessa de uma temporada brilhante, mas com um final dolorido. Para Courrege, o interesse dos brasileiros pela F1 sempre esteve muito associado às vitórias – ou à possibilidade –  dos nossos pilotos, o que explica a redução de torcedores após 2008.

Por outro lado, novos amores surgiram: na contramão do patriotismo, Hamilton virou ídolo daqueles que se encantaram com a garra e talento do jovem piloto, que protagonizara um dos finais mais eletrizantes da história da Fórmula 1. Ao buscar o título com uma ultrapassagem nos últimos metros da competição e debaixo de chuva, o primeiro negro a vencer na categoria escreveu sua história de maneira brilhante. A determinação do inglês cativou multidões que o viram se transformar em um fenômeno das pistas, um dos maiores do mundo, hoje cinco vezes campeão. Para esses, a tristeza daquele domingo chuvoso foi logo superada pelas alegrias trazidas por Lewis. “Nesse período, a F1 deixou de ser um esporte de grande apelo popular aqui no Brasil, mas continuou tendo um público fiel, que ama automobilismo independentemente de brasileiros na pista”, analisou o comentarista.

Campeão do Mundo, Hamilton comemora título inédito com a bandeira do Reino Unido. (Imagem: Sutton Images)

Uma década depois da vitória com sabor de derrota, Felipe Massa ainda carrega consigo o seu peso. Em 2010, ainda pela Ferrari, após recuperar-se do acidente que o tirou da temporada anterior, subiu ao pódio algumas vezes na segunda e terceira posição. Sem conseguir voltar ao degrau mais alto, terminou em sexto na classificação geral após polêmicas de favorecimento de Fernando Alonso, companheiro de equipe que foi vice de Vettel naquele ano. Em 2014, passou a correr pela Williams, conquistando a sexta colocação em 2015, melhor campanha pela escuderia em que finalizaria a sua carreira na categoria. Massa deixou a F1 em 2017, nove anos depois do vice, despedindo-se com um modesto décimo lugar no GP de Abu Dhabi, longe das graças do público e sem nunca ter conseguido repetir o feito.

A virada eletrizante de Hamilton, por sua vez, foi apenas o início de uma carreira gloriosa para o piloto, que 10 anos depois, segue levantando e acumulando troféus. Para o Brasil, não houve mais esperanças de vitória, mas a Fórmula 1 segue viva naqueles que, apaixonados pelo barulho dos motores, ousam desprender-se da torcida patriótica. E a cada novo GP, a tradicional bandeira quadriculada manda o recado: o esporte resiste, apesar das frustrações verde e amarelas.

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