Por Larissa Silva (larissa.carolina_@hotmail.com)
Espiar a casa do vizinho pela janela ou instalar câmeras escondidas em quartos de motéis são ações consideradas repugnantes pela sociedade. No entanto, ver o que as pessoas fazem, sem que elas saibam que estão sendo observadas, é um impulso tão habitual no ser humano que todos, em algum momento da vida, podem ser chamados de voyeurs. Para se ter noção do quão usual essa prática pode ser, em 2017 o ‘BBB’ (Big Brother Brasil), considerado “a casa mais vigiada do Brasil”, foi o termo mais pesquisado no Google.
Ser um voyeur é sentir prazer em observar outras pessoas sem o consentimento destas ― podendo ser considerado como uma psicopatologia em casos em que essa prática se torna frenética na vida sexual do indivíduo. Muitos voyeurs afirmam que esse desejo vem da infância, quando seus pais os privaram de assuntos sexuais, despertando a curiosidade em espiar o que lhes era proibido. Assim, em junção ao sucesso estrondoso que o BBB faz, é possível perceber o quanto nossa satisfação está ligada ao olhar, conhecido pela psicanálise por pulsão escópica.
Para Sigmund Freud, a satisfação está ligada à pulsão, que é uma fronteira entre o corpo e o psiquismo, sendo que para diferentes partes do corpo há diferentes tipos de pulsão ― no caso da pulsão escópica, ela está ligada aos olhos. Assim, “dar uma espiadinha” é uma ação que desperta rapidamente os sentidos íntimos dos indivíduos, por isso é tão difícil ignorar esse convite.
Para uma empolgada fã do reality show e seguidora fiel de diversos grupos do Facebook sobre o Big Brother Brasil, é complicado explicar sua paixão pelo programa: “Não sei por que gosto. Talvez seja porque sempre me identifico com alguém da casa e torço por ele ou ela até o fim. Também gosto porque traz muito a realidade, não é como as novelas”.
Confinar pessoas com diferentes histórias e diferentes estilos de vida em uma casa e possibilitar que o telespectador decida quem sai e quem fica traz para os indivíduos não somente o prazer propiciado pela pulsão escópica, mas também o prazer de poder decidir o destino de outras pessoas. Esse último prazer se refere ao desejo de ter controle ― controle que muitos acreditam não ter em suas próprias vidas. Por outro lado, se há aqueles que querem apenas ver e/ou interferir, também há aqueles que querem ser vistos ― nesse caso, de voyeur o sujeito passa a ser um exibicionista, se refletindo em um participante e o transforma em seu próprio representante, o que demonstra o desejo de querer ser visto por outros.
Sobre a ideia entre o espiar e o se exibir, a psicanalista Thaís Limp explica essa relação de acordo com os estudos teóricos de Freud sobre pulsão: “Freud elabora que olhar o outro parte primeiro de uma fase anterior, a qual se trata de olhar a si próprio. Em um primeiro momento a pulsão escópica está ligada ao eu, depois dirige-se para objetos externos, e, em um terceiro momento pode haver uma inversão: aquele que olha pode tornar-se um exibicionista e se colocar como objeto de olhar de outro”.
Dessa forma, o BBB demonstra ser um combo de ações que satisfazem as necessidades dos indivíduos, mesmo de forma ilusória. “Acredito que a entrada de pessoas menos idealizadas no BBB cause ao público esse sentimento de que é possível a todos estarem ali, mesmo que saibamos que isso é, na verdade, uma mentira”, afirma a psicanalista.
“Dar uma espiadinha”, seja nos reality shows, na rede social de alguém ou até mesmo atrás de uma porta, expressa que todos nós lidamos com um voyeur interior. Em alguns mais intensos e em outros mais ocultos, nosso lado voyeurista está apenas esperando o momento certo para se revelar ― ou não, pois estamos falando de alguém que não se deixa ser visto. Nesse caso, quem você já espiou hoje?