Baseando-se em Jurassic Park, professores comentam a possibilidade de resgatar os grandes répteis
Por: Thaís Navarro (thaisnavarro@usp.br)
A trilogia Jurassic Park (1993, 1997, 2001) e o mais recente Jurassic World: O Mundo dos Dinossauros (Jurassic World, 2015) são, sem dúvida, filmes que despertam paixão em muita gente. Desde que foram lançados, inspiraram uma geração de crianças e mesmo de adultos a se interessarem pelo fantástico e gigantesco mundo dos dinossauros, e levaram muitos a imaginarem como seria se esses grandes répteis realmente voltassem a existir.
Mas isso seria possível? Alguém já tentou? Os professores Fabio Villar, do curso pré vestibular Anglo , e Luiz Anelli, do Instituto de Geociências da Universidade de São Paulo, embarcam conosco nessa jornada e debatem sobre tal possibilidade.
A ficção científica do filme
Nos filmes clássicos, existe uma técnica que os cientistas usam para trazer os dinossauros à vida. A partir de um mosquito fossilizado em âmbar, retirou-se parte do sangue desse inseto e descobriu-se que ele havia picado um dinossauro enquanto em vida. Logo, o DNA do dinossauro foi extraído desse sangue e, a partir de avançados procedimentos laboratoriais, foi possível fecundar um ovo e os dinossauros voltaram a nascer.
Mas hoje, no mundo real, esse procedimento não seria possível pois o DNA não sobrevive tanto tempo assim – tempo esse de, no mínimo, 65 milhões de anos, que foi o que se passou desde a grande extinção. O Professor Anelli explica: “O DNA não foi feito para sobreviver assim. Foi feito para sobreviver dentro de uma célula viva. Além disso, é a menor e mais complexa molécula que existe nesse universo. Já é uma coisa muito difícil, é celular. Então, preservar isso numa rocha ou dentro de um sangue de um mosquito fossilizado há mais de 60 milhões de anos é muito difícil. O DNA se decompõe.”
Mas vale ressaltar que, naturalmente, a ciência e seu desenvolvimento estão em constante e eterno aprimoramento. E é essa percepção que conduz o professor Villar a afirmar que, mesmo que essa técnica do filme não seja possível atualmente, não se pode afirmar que nunca será viável com o desenvolvimento da engenharia genética. “No que diz respeito ao resgate de grandes répteis a partir desses procedimentos, não existe hoje tecnologia para tal, mas não dá para dizer que nunca seria possível,” diz ele.
Conheça aqueles que já estão tentando
O método utilizado pelos filmes, por enquanto, não é possível, mas existe outro que já vem sendo estudado por diversos cientistas. Esse método consiste na ativação de atavismos. Atavismos são como características genéticas ancestrais de um ser, uma espécie de hereditariedade biológica. Basicamente, no ser podem existir genes que podem ser ativados ou desativados a partir de estímulos, e é isso que alguns pesquisadores vêm realizando.
Matthew Harris, da Universidade de Wisconsin, conseguiu, através desse método, ativar os genes de dentes em uma galinha. Hans Larsson, da Universidade de McGill, estuda como as aves perderam a cauda – ou seja, como o gene para essa característica se desativou – e como os braços foram gradualmente convertendo-se em asas. Um outro nome renomado nessa área é o paleontólogo Jack Horner, da Universidade de Montana: o pesquisador norte americano é referência nos estudos sobre a sociabilidade dos dinossauros e acompanha o desenvolvimento da técnica do atavismo. Além disso, ele foi conselheiro técnico dos filmes de Jurassic Park, envolvendo-se ainda mais com o tema
As condições do mundo hoje
Suponha que, seja pelo método da ativação e desativação de genes ou seja pelo método do filme, um dia se consiga trazer dinossauros ao mundo tais quais aqueles vistos nos parques dos filmes. Será que as condições atuais para a vida na terra – isto é, o clima e a geografia, por exemplo – dificultariam ou mesmo impediriam o desenvolvimento desses grandes animais?
“É certo que sim”, afirma o professor Villar. “As condições não são mais as mesmas. Hoje, elas são muito favoráveis à presença de pequenos répteis, porque eles têm uma adaptação à variação de temperatura de forma comportamental: eles se expõe ao sol, se protegem do sol, enterram, desenterram e é dessa forma que controlam sua temperatura. Para os grandes répteis, é um pouco difícil essa alternativa de se controlar a temperatura por esse mecanismo.”
Ele alerta, também, para o risco do desequilíbrio de ecossistemas que pode acontecer caso um animal totalmente novo seja introduzido no ambiente terrestre. “O maior problema seria essa introdução. A gente sabe de histórias de peixes que foram pegos em um rio e colocados em outro e isso gerou uma catástrofe em termos de desequilíbrio das relações ecológicas naquele ecossistema, fazendo com que espécies nativas morressem. Imagina o resgate de um organismo como esse. Certamente, teria que ser pensado o dano ambiental.”
A ética envolvida
Trazer um animal como esse de volta para a Terra, além de não ser tarefa simples, envolve questões éticas que não podem ser ignoradas. Qual seria a finalidade de tanto esforço? Seria o puro entretenimento e que colocaria a vida humana em risco, seria o avanço da pesquisa científica?
Para o professor Luiz Anelli, “toda a ética foi comprada pelo capitalismo. A ética se compra. Você produz vários dinossauros e faz um parque daqueles, todo mundo vai visitar, vai gerar dinheiro, seria pelo entretenimento. Mas sim, seria também pelo avanço da ciência.” Ele alerta também para o fato de que vírus e enfermidades poderiam ser ressuscitados. Villar compartilha de semelhante opinião. “Em ciência, o desvendar os mecanismos, conhecê-los, desenvolver essas possibilidades, muitas vezes é o propósito por si só. O que se faz com essa conquista do saber é o que entra nesse campo ético”, diz ele, acrescentando que “uma aquisição que nos fizesse crescer como sociedade e humanidade, em todos os níveis e relações, está valendo. Se o propósito for outro, não se justifica.”
Não se pode dizer que é impossível que não se vejam dinossauros na Terra novamente. Enquanto você lê esse texto com a clássica música dos filmes na cabeça, existe muita gente empenhada nessa ideia e a estudando. O desenvolvimento da ciência é imprevisível, o que expande ainda mais as possibilidades.