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Agências de intercâmbio esportivo: um lucrativo mercado de sonhos e possibilidades

Por Pedro Smith Quem nunca pensou, um dia, em se tornar jogador de futebol? O sonho de ser um grande astro do esporte mais popular do mundo é comum a muitos brasileiros. Entretanto, a gigantesca concorrência, a superlotação e defasagem das “peneiras” (que transformam o ingresso de jovens atletas em clubes obra, em grande medida, …

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Por Pedro Smith

Quem nunca pensou, um dia, em se tornar jogador de futebol? O sonho de ser um grande astro do esporte mais popular do mundo é comum a muitos brasileiros. Entretanto, a gigantesca concorrência, a superlotação e defasagem das “peneiras” (que transformam o ingresso de jovens atletas em clubes obra, em grande medida, da sorte), a falta de infraestrutura e apoio públicos e a promíscua relação entre clubes e empresários são alguns dos obstáculos a serem superados por aqueles que, muitas vezes, deixam tudo para trás em busca do sucesso.
Alguns desses atletas, por sua vez, buscam em ligas menos tradicionais e competitivas uma segunda chance. Muitos deles, inclusive, largaram os estudos para praticar o futebol, o que dificulta sua inserção no mercado de trabalho em outras áreas.
Muitos países, em que se destaca os Estados Unidos, buscam corrigir essa questão tornando as ligas universitárias nacionais a principal porta de entrada para os clubes profissionais. Assim, mesmo que o esportista não seja aprovado em nenhum campeonato profissional, um diploma universitário garantirá, em tese, um futuro profissional exitoso. Tal cenário seria ideal para aqueles brasileiros que não “vingaram” na liga nacional.
Não à toa, segundo dados da Association of Language Travel Organizations (a associação responsável pelas agências de intercâmbio de todo o mundo), o Brasil é o sexto maior exportador de estudantes do mundo (foram mais de 35 mil alunos no ano de 2015). Os Estados Unidos são o destino predileto – entre 2011 e 2016, o número de brasileiros estudando em universidades americanas cresceu 65,8%.
Pensando nesse nicho de mercado, algumas empresas especializaram-se em fornecer treinamento – tanto esportivo, quanto acadêmico – para jovens brasileiros que buscam realizar seu sonho, mas com a certeza de que terão um futuro repleto de outras possibilidades. É o caso da MVP Exchange, por exemplo, fundada em agosto de 2016 por quatro amigos que viveram a experiência de dividir o estudo e o futebol em solo norte-americano.

“Negócio da China”

Hoje o mercado de intercâmbio gira mais de US$ 2 bilhões por ano, aproximadamente 7,5 bilhões de reais, sendo o destino preferido países de língua inglesa – 88% dos brasileiros que vão estudar procuram esse idioma.
Diante desse cenário, não parece muito difícil entender o surgimento massivo de agências de intercâmbio por todo o Brasil, que crescem e alcançam, ano após ano, lucros cada vez mais animadores.
Para Igor Lima, sócio-diretor da MVP Exchange, há dois fatores essenciais a tamanho crescimento. Primeiramente, “estudar em uma universidade americana com bolsa hoje tem um custo beneficio bem melhor do que estudar em faculdades particulares aqui no Brasil”. Além disso, “o momento de crise econômica/política que nosso pais vive faz com que muitos pais queiram que o filho saia e tenha uma qualidade de vida e acesso ao ensino de alto nível em outro país”.
A procura é tanta que a previsão de faturamento da MVP é de 1,6 milhão de reais em 2018, o que corresponde a um crescimento de 40% em relação a 2017. Isso supera – e muito – os 125 mil reais investidos inicialmente para tirar o sonho do papel.
Todo esse rendimento provém exclusivamente dos atletas atendidos pela empresa. “Atualmente temos 140 atletas em nossa academy. Os alunos pagam uma mensalidade para ter acesso aos treinos (3 a 5 vezes por semana) e aulas de inglês com nossa parceira [a escola de idiomas] OpenEnglish que varia de 289,00 a 389,00 reais. Quando conseguimos a universidade e a bolsa de estudos desejadas pelo atleta, é cobrada nossa “taxa de embarque”, que hoje custa US$ 2.400,00 [a qual cobre todos os trâmites burocráticos e logísticos do processo de transferência]”, explica Igor, formado em Administração pelo Missouri Valley College como estudante-atleta.
Um dos grandes trunfos dessas empresas é a amplitude de seu mercado consumidor: “hoje atendemos jovens entre 14 a 23 anos de idade, de classes sociais A, B e C [muito devido aos programas de bolsas da empresa]. Oferecemos bolsas para jovens de outros esportes, inclusive jovens de esportes eletrônicos como LoL e também jovens que vão apenas para estudar”, completa, expondo a tentativa de muitas empresas para ampliar suas áreas de atuação.
Entretanto, apesar de aquecer a economia local, o enorme sucesso das agências de intercâmbio para estudantes-atletas (como são chamados os jovens que jogam e estudam em universidades norte-americanas) reflete a fragilidade tanto do sistema educacional e cultural brasileiro, em que esporte e educação não andam juntos.
E é em busca da possibilidade da conciliação entre ambos que tais empresas operam – e lucram. “Os jovens que nos procuram sabem que no Brasil é impossível você conciliar esporte e educação de alto rendimento. Alguns ainda têm o sonho de se tornarem jogadores profissionais nos EUA, enquanto outros [priorizam] uma formação que seja diferenciada”, explica o diretor comercial na Next Academy.
Mas ele atenta: a “preocupação é colocar na cabeça de todos os atletas que nos EUA eles serão student-athletes e não athlete-students, ou seja, primeiro eles precisam se preocupar com a formação deles como pessoas e profissionais. (…) O futebol pode acabar da noite pro dia; o conhecimento eles levarão para o resto da vida”.
E ainda completa, elogiando o sistema de ensino estadunidense: “acredito que o diferencial do sistema educacional já é ‘mais justo’ nos EUA comparado ao Brasil, pois nos EUA as universidades levam em consideração toda a carreira do aluno desde o primeiro ano no colegial até se formar (trabalhos voluntários e atividades extracurriculares inclusive). Dessa forma, os melhores alunos e pessoas pegam as melhores vagas nas melhores universidades; já no Brasil, a pessoa pode ter sido o pior aluno por três anos no colegial, mas se os pais pagarem um cursinho, por exemplo, ele pode fazer o vestibular e conseguir as melhores vagas nas boas universidades.”

Next Academy em amistoso contra a categoria de base do Vasco da Gama (Créditos: Reprodução)

O processo de preparação e admissão

Em linhas gerais, há dois processos simultâneos para que os estudante-atletas alcancem seu objetivo: por um lado, a preparação acadêmica e esportiva e, por outro, todos os trâmites burocráticos de contato e elaboração dos contratos com as universidades.
“Esportivamente os atletas treinam de três a cinco vezes por semana em nossa academy, sendo que uma vez por semana temos um treino funcional para evitar lesões. Academicamente oferecemos aulas de inglês para todos atletas, além de um professor particular para aulas específicas de TOEFL (a admissão nesse exame é requerida para que se possa cursar uma universidade em língua inglesa; cada uma estabelece sua nota mínima) cobrado à parte”, descreve.
Já para as questões burocráticas, “hoje temos contato com mais de 200 universidades, temos uma área académica dedicada 100% para conversar e negociar bolsas com universidades e treinadores”. E completa: “nós temos duas formas de oferecer o atleta: a primeira é por meio de vídeos (temos uma área que faz edição) e a segunda é por meio de nossas viagens, em que levamos grupos de jovens para treinar e jogar em clubes e universidades nos EUA. Assim, eles têm contato direto com os treinadores e vivem um pouco da college life (“vida de universitário”) por uma ou duas semanas”.
Em casos bem sucedidos, a empresa também cuida de todos os trâmites e logística da mudança e hospedagem do, agora, universitário.

Equipe campeã da National Cup, torneio entre as unidades da franquia (Créditos: Reprodução)

Quem são os estudante-atletas?

João Victor Ulmo é kicker na The University of Tennessee at Chattanoga. Apesar de tomar rumos incomuns, Juba, como é conhecido, teve trajetória muito similar à maioria dos brasileiros que dividem estudos e esporte em solos estrangeiros.
Tudo começou com a influência de seu irmão mais velho: “Ele foi para os Estados Unidos com 10/11 anos e foi fazer a mesma coisa que eu fiz, que é ir para o High School e, depois, fazer faculdade. Eu sempre me inspirei muito no meu irmão, eu sempre vi o quanto ele estava feliz, o quanto as coisas estavam dando certo para ele, e decidi que talvez seria um bom caminho também para mim seguir essa escolha. Tinha 14 anos quando decidi o que eu queria fazer”.

João Victor em partida pela NCAA. (Créditos: Reprodução)

Para alavancar seu sonho, ele teve o apoio da agência de intercâmbio esportivo 2SV Sports, que lhe ofereceu aulas de inglês e preparação física e técnica voltadas ao futebol.
“Eles me ajudaram muito na preparação de cerca de dois anos. Sempre fazendo algo em inglês às quintas-feiras, treinos físicos segunda, quarta e sexta, e, no sábado, treino com bola”, completa o atleta-estudante do curso de Finanças.
Entretanto, apesar de todo o preparo e suporte, a chegada em território americano exigiu certas adaptações e aprendizagens: “Para mim, no começo foi difícil porque, mesmo fazendo as aulas [de inglês], quando você chega nos Estados Unidos não está tão pronto para falar inglês. É tudo muito rápido, as aulas são muito rápidas. Então precisa pegar ali na hora, falando, aprendendo, errando. Acho que até eu conseguir me acostumar a falar em inglês tranquilo, sem problema, deve ter demorado uns quatro meses”.
Já adaptado, ele garante que a escolha de mudar de país não foi tomada por razões meramente afetivas e familiares, mas sim, em aspectos escolares e esportivos. “As coisas foram baseadas nos dois. Eu gostava muito de jogar futebol, ainda queria jogar em um nível competitivo e não ia conseguir fazer isso no Brasil; só que, do mesmo jeito, também não queria abandonar a escola. Então, eu decidi vir para cá, onde eu tenho a oportunidade de estudar e jogar ao mesmo tempo”.
Tal possibilidade é, inclusive, a principal vantagem de se cursar faculdades americanas para ele: “ainda conseguir fazer esporte em nível top e, ao mesmo tempo, me formar muito bem, ficando fluente em inglês, são fatores muito bacanas”. Entretanto, “estar longe da família, dos amigos, do Brasil – eu gosto muito do Brasil! – são, com certeza, as principais desvantagens”.
O caminho esportivo de João Victor destaca-se, porém, por uma particularidade: hoje, ele joga futebol americano em sua universidade, como kicker. “Ouvi histórias de alguns brasileiros que também tiveram essa transição. Fui fazer um teste e comecei a jogar, ainda durante o ensino médio. No começo eu não curtia muito não, mas comecei a pegar gosto com o tempo”.
Juba é um de muitos exemplos de trajetórias bem sucedidas de ensino superior em solo estrangeiro. A possibilidade de escolhas, oportunidades e caminhos a seguir multiplicam-se a cada passo seu. De jogador de futebol americano a empresário, o futuro é repleto de certezas para aqueles que não querem abdicar dos esportes pelos estudos (e vice-versa).
A saída do país é, infelizmente, uma das únicas formas para que esporte e educação andem juntas. O crescimento do mercado de agências esportivas traz à tona um grave problema educacional brasileiro, projetando-se como ator capaz de proporcionar outros cenários e possibilidades que, entretanto, estão restritas a um elevadíssimo poder aquisitivo.

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