Por Luiz Dias (lhp.dias11973@usp.br)
No dia 16 de janeiro, entra em cartaz a nova obra do diretor Robert Zemeckis: Aqui (Here, 2024), adaptação cinematográfica da graphic novel homônima de Robert McGuire, que conta com grande elenco composto por estrelas como Tom Hanks, Robin Wright e Paul Bettany. É um filme com uma proposta ousada, mas com desempenho agridoce.
Aposta arriscada
Aqui se baseia em uma premissa simples: acompanhar diversas histórias de forma não linear, tendo como único elo a casa, que se estabelece como a verdadeira protagonista da trama, sempre vista a partir de um ponto fixo da câmera. Apesar de seu caráter experimental, a proposta é clara: evocar nostalgia por meio da identificação entre espectador e personagens, como reforça o slogan do filme “Alegria, esperança, perda, amor, a vida acontece aqui”.
Com isso em mente, a experiência torna-se condicionada ao grau de conexão emocional do público em relação aos acontecimentos, o que faz o filme explorar diversos núcleos familiares na busca de ampliar o escopo de identificação. Contudo, o desenvolvimento dos núcleos menores acaba por parecer aleatório, surgindo na história sem muita correlação entre si ou com o núcleo principal, o que pode atrapalhar a experiência e levantar dúvidas sobre sua relevância no roteiro.
Ainda nesse aspecto, a montagem também apresenta fragilidades em alguns momentos. Apesar de haver a necessidade de conexão emocional com os acontecimentos, frequentemente são aplicadas transições abruptas entre os núcleos em momentos importantes da trama. Elas não possuem justificativa narrativa aparente para tal, o que causa uma quebra na imersão.
Embora seja dissonante com a narrativa, a montagem tem pontos positivos durante o longa. Aliada a um ótimo design de produção, ela evita um erro comum a filmes que se passam em um único ambiente: a repetição. Em clara alusão aos quadrinhos, o montador utiliza quadros que atuam como janelas, que mostram imagens e fragmentos de outros núcleos mesclados ao atual. Além das decorações que evocam a aura da época retratada, um fator que agrega à narrativa e torna a casa mais viva e em constante mudança.
Efeitos especiais
Zemeckis é um conhecido entusiasta de tecnologias novas em suas obras, como em um de seus maiores sucessos De Volta para o Futuro 2 (Back to the Future II, 1989). Esse mesmo fascínio por inovação foi aplicado no título atual com o uso de inteligência artificial (IA) nos efeitos especiais, uma medida que gerou polêmica desde seu anúncio e que acabou se provando falha no decorrer do filme.
Através do modelo de IA Metaphysic, os atores foram rejuvenescidos digitalmente em tempo real utilizando tecnologia de deepfake. Apesar da ideia ousada, os resultados apresentados acabam prejudicando a premissa central do filme — a conexão com os personagens —, pois as expressões dos atores rejuvenescidos se mostram muitas vezes artificiais e robóticas, entrando no Vale da Estranheza.
Assinatura do diretor
Outro ponto massivamente abordado na divulgação de Aqui foi o reencontro da equipe responsável pela produção de Forrest Gump (Forrest Gump – O Contador de Histórias, 1994). Sem dúvidas, o filme guarda muitas semelhanças com seu antecessor, desde a atmosfera aconchegante até as montagens com trechos da história americana, mesmo que esses traços não tenham sido tão bem aplicados quanto no título de 94.
Como destaque positivo, Alan Silvestri, responsável por icônicas trilhas de Zemeckis, como aquelas dos já citados Forrest Gump e De Volta para o Futuro, entrega uma trilha sonora tocante. Mesmo sem grandes variações, ela é fundamental para a imersão no filme. O seu ápice é alcançado no encerramento, quando homenageia outra cena de um dos sucessos do diretor.
Apesar dos pesares, para aqueles que conseguem imergir dentro da proposta ao evitar as distrações citadas, Aqui consegue entregar uma experiência surpreendentemente carinhosa e nostálgica, que leva o espectador a reviver suas próprias lembranças por meio dos paralelos com o longa. Porém, para aqueles que não alcançarem a imersão, a experiência será monótona e superficial, marcada pelos defeitos do filme.
O filme está disponível nos cinemas. Confira o trailer:
*Imagem de capa: Reprodução/IMDb