Por Júlia Sardinha (jusardinha.eca@usp.br)
A insegurança pública, a violência urbana e a criminalidade na cidade de São Paulo tornam a metrópole “um espaço repleto de conflitos, tensões e choques”. Bruno Paes Manso, doutor em Ciência Política e pesquisador do Núcleo de Estudos da Violência da USP (NEV-USP), afirma essa premissa. No mês de abril, o também jornalista foi convidado pela Oboré para ministrar uma palestra sobre “Segurança pública e violência urbana”.
A capital paulista é a mais populosa do país – com cerca de 12 milhões de habitantes, segundo o IBGE -, concentração que torna inevitável a ocorrência de conflitos. Paes Manso afirma que a cidade já foi ‘mais violenta’ – como na década de 1960, com os Esquadrões da Morte -, mas que, até hoje, a ‘violência é uma ferramenta de ordem’ utilizada pelos institutos governamentais. Por ‘ordem’, o convidado explica se tratar de um mecanismo fundamentado, principalmente, nas leis, para controlar os comportamentos da população mais pobre.
Por que obedecemos?
Questionar sobre os motivos que nos levam a obedecer as normas e as leis impostas foi um pensamento constante para Bruno Paes Manso. Para o pesquisador, o respeito às regras provém de uma representatividade, uma identificação entre cidadãos e lideranças políticas – formuladores das propostas legais.
“As pessoas passaram a perceber que se você não tem dinheiro, você não sobrevive na cidade”
Bruno Paes Manso
O maior problema, de acordo com Paes Manso, está na ‘formação de bolhas’ dentro da própria cidade, ou seja, na segregação socioeconômica entre ricos e pobres. Enquanto os ricos constroem um vínculo com os políticos que os representam – muitas vezes por terem os mesmos interesses -, a população mais pobre é violentada a partir da imposição da ‘ordem’ estabelecida pelas elites, afirma. Essa falta de representatividade colaborou com o aumento do número de comunidades e com o avanço da violência policial nessas regiões, diz o doutor em Ciência Política.
Entre a fé e o fuzil
No mais recente trabalho de Bruno Paes Manso – “A fé e o fuzil: crime e religião no Brasil do século XXI” – , é discutida a relação entre as igrejas evangélicas e o crime organizado. O autor explica que moradores das periferias buscam na religião ou na criminalidade a identificação que não possuem com o governo.
“Os mais pobres encontram na religião a promessa de serem salvos das suas realidades”, afirma o jornalista. Esse discurso de uma “segurança divina” é aproveitado pelos políticos e pelos criminosos para fazer com que os moradores apoiem a ordem instaurada. Segundo Paes Manso, os mecanismos que ambos os grupos encontram para ‘conquistarem as periferias’ são projetos sociais, como a distribuição de brinquedos para as crianças.
Nos anos da década de 1990, São Paulo era uma das cidades mais violentas do país. Foi neste período que, mais especificamente em 1992, ocorreu o Massacre do Carandiru, tragédia que explicitou o abuso policial no sistema carcerário. Jovens e negros representaram a maioria dos presos e vítimas, fato que promoveu debates acerca da violência contra a população mais necessitada economicamente.
“Ao invés de produzir mais ordem, ela [a violência] produz mais desordem”
Bruno Paes Manso
Esse episódio levou à formação do Primeiro Comando da Capital (PCC), em 1993, na Casa de Custódia e Tratamento de Taubaté – chamado Piranhão. Seu crescimento vem da luta contra o sistema capitalista, o que influenciou jovens – em sua maioria homens e moradores da periferia – a encontrarem no crime uma forma de serem ‘vistos como alguém’ pelas elites, alega Paes Manso.
Na praça Vladimir Herzog, Bruno Paes Manso é homenageado com o prêmio “Pequeno Jornaleiro”, dado pela Oboré. [Imagem: Júlia Sardinha/Acervo Pessoal]
Muito bom!