Em 2011, Sexo sem Compromisso e Amizade Colorida tentaram subverter, com sucesso discutível, as comédias românticas típicas de Hollywood. A alma gêmea não é incansavelmente perseguida, e o sexo pelo sexo é colocado como elemento “transgressor”. Solteiros com Filhos também tenta inovar o gênero, porém com outro viés.
Nele, os amigos de longa data Jason (Adam Scott, da sitcom “Parks & Recreation”) e Julie (Jennifer Westfeldt, também roteirista e diretora do longa e conhecida por alguns pelo filme Beijando Jessica Stein) observam o caos que o nascimento de filhos trouxe aos casamentos de seus melhores amigos. Ao mesmo tempo, porém, percebem que querem ser pais e que a idade os está alcançando.
Assim, cada um enxerga no outro a realização desse sonho, pensando que não haveria desgaste e exaustão. Decidem, então, se submeter a uma noite de sexo estranha e desajeitada com um único objetivo: criar um filho juntos, sem estarem, de fato, juntos. O bônus desse acordo seria a possibilidade de continuar buscando, nas ruas de Nova York, aquele tal de amor verdadeiro.
O filme corre como esperado. O bebê Joe nasce e tudo vai bem até que uma das partes se apaixona pela outra, enquanto esta está feliz em um novo relacionamento. História vai, história vem, Megan Fox faz uma pontinha interpretando ela mesma (que parece ser uma compensação pela falta de sal dos protagonistas), e segue com a clássica obviedade que o público gosta.
Além da estrela da franquia Transformers o elenco não é muito familiar aos brasucas. Porém, se você assistiu, no início do ano, a Missão Madrinha de Casamento (comédia escrachada que por algum motivo foi extremamente bem recebida pela crítica e pelo público), irá reconhecer diversos rostos.
Parece que o diretor de elenco simplesmente foi ao set de filmagem do filme das madrinhas de casamento e berrou “Tenho esse projeto aqui, quem quer?”, pois Kristen Wiig e Maya Rudolph (que também trabalham juntas no programa “Saturday Night Live”), Chris O’Dowd e Jon Hamm estão todos nos dois longas.
Quem sabe essa combinação repetida justifica a falta de graça de ambos os filmes. O que é uma surpresa, já que muitos desses atores são mais do que bem sucedidos em seus projetos na televisão. Porém não se pode culpar somente os atores. Há um problema claro na concepção dos personagens.
Por exemplo: Kristen Wiig, uma das principais comediantes do programa “Saturday Night Live”, foi escalada em Solteiros com Filhos como uma mulher deprimida e ressentida pelo fracasso de seu casamento, eliminando assim qualquer janela para o humor.
Jon Hamm, protagonista da aclamada série “Mad Men”, interpreta o marido de Wiig. É um papel que se fosse uma cor, seria cor de burro quando foge. Não há desafios, e a atuação não faz justiça ao Globo de Ouro que levou para casa em 2007, fora diversas indicações em prêmios como o Emmy e o Screen Actors Guild.
O roteiro também peca nas piadas, que, infelizmente, não tem graça. São todas de tom grosseiro e sem grande elaboração. Piadas que qualquer um faria corriqueiramente nas ruas e que passariam por despercebidas se não estivessem sendo transmitidas nas telonas por aí. Até mesmo a grande cena de declaração (porque sempre tem uma dessas) é uma tentativa falha de provocar uma combinação de risos e lágrimas de emoção.
Há, no entanto, alguns aspectos – detalhes, na verdade – que tornam o filme mais agradável. Toda a ambientação de Nova York está impecável. O outono e inverno, principalmente, fazem com que o espectador queira estar dentro do filme. Fora as localidades internas, como apartamentos e casas extremamente bem decorados em Manhattan e no Brooklyn.
Também há algumas cenas em uma cabine de inverno e estação de esqui em Vermont. Ou seja, uma vantagem do filme: você pode aproveitar para começar a elaborar um roteiro de férias, isso se tiver o dinheiro sobrando.
Outro aspecto positivo: há um ator que provavelmente foi escolhido a dedo. O que interpreta o bebê Joe. Quando ele aparece na tela não há como não derreter na cadeira de tanta fofura. Claro, parece um tanto absurdo comentar algo assim tão irrelevante, mas na falta do que elogiar…
No entanto, não se pode assistir a uma comédia romântica esperando uma grande obra cheia de complexidades. Deve ser o gênero que quase nunca é inovado, mas que constantemente se renova. Solteiros com Filhos acaba sendo exemplo disso. É uma mistura do aspecto de não comprometimento dos filmes de sexo por sexo com a parte mais romântica daquele filme Juntos por Acaso, onde Katherine Heigl e Josh Duhamel, que inicialmente se odeiam, criam juntos a filha órfã de um casal de amigos até que se apaixonam.
Porém, mesmo encaixotado dentro da categoria “comédia romântica”, Solteiros com Filhos tem mais falhas que acertos. É, assim, uma opção no máximo viável caso o filme que você realmente quer ver só tenha lugares sobrando lá na frente. Afinal, ninguém gosta de sair do cinema com torcicolo.
Por Letícia Sakata
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