Ricky Hiraoka
Foram necessários três anos de muita pesquisa sobre um tema tão polêmico quanto espinhoso para que se iniciassem as gravações do documentário O Aborto dos Outros. A diretora Carla Gallo e sua equipe percorreram hospitais públicos para mostrar o drama das mulheres que decidem interromper a gravidez seja porque foram estupradas, seja porque correm risco de morte. Com muita sensibilidade, Carla não se limitou a retratar mulheres que estavam prestes a abortar, ela conversou com quem havia recorrido a métodos clandestinos de aborto, como remédios e ajuda das “mães de anjo”.
A câmera parada de Carla se mostra essencial e certeira para expor os conflitos psicológicos, morais e religiosos de cada mulher. Da menina de 13 anos que foi violentada à mulher que fez cinco abortos clandestinos, Carla, em nenhum momento, trata as “personagens” do filme como meras vítimas. Elas são mostradas como verdadeiros seres humanos com dilemas e preocupações reais. Todas questionam a importância da maternidade, falam do sentimento de solidão e sobre como foi tomar a decisão de abortar. Assistir ao documetário é exercitar a compreensão e ver que a contradição é uma caracterítica intrínseca a todas as pessoas.
Além das mulheres, Carla ouviu autoridades médicas e jurídicas sobre o aborto. A diretora conseguiu traçar um panorama dessa prática no Brasil sem defender qualquer posição em relação ao tema. No momento em que o aborto volta às discussões no Supremo Tribunal Federal, O Aborto dos Outros se mostra um instrumento válido e necessário para debater junto à sociedade um problema que concerne a todos.