Por Leticia Yamakami (leticiayamakami@usp.br)
Nesta quinta-feira (12), o documentário ‘O Instante Decisivo’ foi oficialmente lançado no canal televisivo SporTV e disponibilizado de forma ilimitada na plataforma de streaming Globoplay. Dirigida por André Bushatsky e produzida com apoio do Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB), a obra acompanha a preparação física e mental dos atletas brasileiros até as Paralimpíadas de Paris 2024.
São 74 minutos de mergulho pelos bastidores do cotidiano dos esportistas de alto rendimento, o que inclui depoimentos e imagens dos treinadores, psicólogos, cientistas da saúde, membros do CPB, fisiologistas e dos próprios paratletas. A narrativa acompanha, desde o final dos Jogos Paralímpicos de Tóquio 2021, os treinos — e uma pincelada da vida pessoal — de sete protagonistas: a arremessadora de peso Beth Gomes, a tenista de mesa Bruna Alexandre, o jogador de futebol Cássio Reis, a nadadora Carol Santiago, o nadador Gabrielzinho, o velocista Petrúcio Ferreira e a lançadora de dardo Raíssa Machado.
Neste ano, Bruna Alexandre se tornou a primeira atleta paralímpica do Brasil a jogar também nas Olimpíadas; ela é a maior medalhista brasileira do tênis de mesa [Imagem: Divulgação/YouTube/Comitê Paralímpico Brasileiro]
A construção de inspirações
O filme inicia seguindo a lançadora de dardo até a sua residência. A câmera a acompanha dirigindo seu próprio carro e chegando em seu apartamento para dar um depoimento às telonas. Filmar os atletas realizando tarefas diárias simples é um indicativo da não-romantização de suas deficiências por parte da obra, já que não são destacadas as dificuldades enfrentadas por eles, mas sim como eles são adaptados a todos os momentos do dia a dia independente da deficiência.
Apesar de contar sua história de vida e pelo que passou na infância durante o desenvolvimento do transtorno responsável por não fazê-la andar, Raíssa Machado afirma que não gosta quando a mídia caracteriza a sua vida e a de seus colegas paratletas com a palavra “superação”. “O filme mostra que nós já superamos o que era preciso superar. Agora nós somos inspiração”, disse em coletiva de imprensa após a estreia.
Esse pensamento é concretizado pela mesclagem de depoimentos dos protagonistas e falas de profissionais da saúde e do esporte, aspecto importante que possibilita ao espectador uma visão mais impessoal e técnica do que está assistindo, reforçando o lado profissional da trama.
Outra característica enriquecedora do documentário é a inclusão da temática da saúde mental alinhada ao atendimento psicológico. Mesmo que breves, os comentários de uma psicóloga esportiva e menções dos atletas em relação ao cuidado e à manutenção de seus psicológicos relembram que, sobretudo na atualidade, é impossível negligenciar um dos principais pilares da construção de esportistas de alto rendimento.
Raíssa Machado menciona que se conecta mentalmente com o dardo: se seu mental está desgastado, seu treino também fica [Imagem: Divulgação/YouTube/Comitê Paralímpico Brasileiro]
Diferentes experiências traçam semelhantes objetivos
Além de Machado, as demais personagens também buscam contar os destaques de suas rotinas como atletas de forma única e pessoal. O nadador mineiro Gabrielzinho, por exemplo, comenta que o achocolatado Nescau não pode faltar nas suas manhãs e que sua dieta foi adaptada para encaixar o seu consumo. “Mesmo em competições fora do país, eu levo meu leite com Nescau para tomar”, diz de forma descontraída em seu depoimento.
Carol Santiago, por outro lado, conta como genuinamente gosta de seus treinamentos pesados, da sua alimentação restritiva e de dar o seu melhor desempenho independentemente de seu humor ou de sua motivação do dia. Aparentemente, os esforços valem a pena: em Paris 2024, a nadadora tornou-se a mulher brasileira com mais medalhas de ouro (6) na história dos Jogos Paralímpicos, fato destacado no filme por meio de trechos de jornais televisivos anunciando a notícia.
Santiago é natural de Recife – PE, uma das muitas diversas cidades de onde os protagonistas vêm [Imagem: Divulgação/YouTube/Comitê Paralímpico Brasileiro]
Cássio Reis e Petrúcio Ferreira escolhem evidenciar em suas entrevistas a importância que suas parceiras têm para o seu bom desempenho. Apesar de suas rotinas rígidas, chegar em casa e se deparar com suas famílias é incomparável para eles. “Nenhuma medalha supera o nascimento da minha filha”, afirma o jogador de futebol.
O que todos os indivíduos que realizaram entrevistas para a montagem de “O Instante Decisivo” (2024) têm em comum é a empolgação com um mesmo objetivo: as Paralimpíadas de Paris de 2024. Durante os quatro anos de preparação, as expectativas de todo o time por trás dos atletas era de fazer o Brasil ultrapassar o seu próprio recorde de medalhas — 72 medalhas em Rio 2016 e Tóquio 2021.
O sonho se concretizou com gosto: em 2024, os paratletas brasileiros subiram 89 vezes ao pódio. O recorde fez o país entrar, pela primeira vez na série histórica, entre os cinco primeiros colocados dos Jogos, em 5º lugar. O carro-chefe das conquistas foi o atletismo, seguido da natação.
Ao finalmente chegar no tão esperado evento paralímpico na capital francesa, o filme avança muito rapidamente para seu fim. O diretor André Bushatsky explica, em coletiva, que as filmagens das partidas são proibidas devido aos direitos de imagem dos Jogos Paralímpicos, mas a falta de imagens dos protagonistas dentro ou até fora das quadras faz com que a obra perca parte de sua força.
A última cena de preparação pré-Paralimpíada é cortada diretamente para depoimentos dos esportistas com medalhas no pescoço, a fim de deixar subentendido as vitórias da nação. A escolha artística é compreensível, porém, faz com que quem assiste seja pego de surpresa pelo final brusco. Uma transição com filmagens descontraídas, screenshots de notícias e fotos do pódio com os devidos créditos seriam bem-vindos nessa ocasião.
O filme já está disponível na plataforma de streaming Globoplay. Confira o trailer:
O Instante Decisivo – Trailer final
*Imagem de capa: Divulgação/YouTube/Comitê Paralímpico Brasileiro