Por Clara Zamboni (clara.candiotto@usp.br)
A iniciativa Sinfonia na Paulista oferece concertos gratuitos no Centro Cultural Fiesp como parte do projeto da Orquestra Bachiana Filarmônica, mantido pelo Serviço Social da Indústria de São Paulo (SESI-SP). Sob regência do maestro João Carlos Martins, diretor artístico da orquestra, a edição de setembro contou com a presença do maestro Wallas Pena e do pianista Dersu Soares. O Sala33 acompanhou o evento, que mostra que o universo da música de concerto merece — e pode — ser explorado por todos.
A apresentação ocorre toda primeira quarta-feira do mês, no Centro Cultural Fiesp, localizado na Avenida Paulista, número 1313. Entre os prédios comerciais, as estações de metrô e o trânsito incontrolável da metrópole, o espaço abriga um teatro para eventos artísticos.
No dia 4 de setembro de 2024, a casa estava cheia, à espera da Orquestra Bachiana Filarmônica. Logo, as expectativas deram lugar ao maestro Wallas Pena, membro assistente da Orquestra Bachiana, que abriu o concerto regendo a Sinfonia 17 em sol maior (K 129), de Mozart.
Em seguida, o maestro João Carlos Martins subiu ao palco e assumiu a regência do Concerto para Piano (Op. 16) em lá menor, de Edvard Grieg, com o solista Dersu Soares.
O conhecido concerto para piano mostrou porquê faz sucesso em todos os públicos. O virtuosismo e intensidade do conjunto arrancaram comentários como “Olha o que ele (o pianista) sabe fazer!”, vindo de uma senhora nos primeiros assentos. Outra integrante da plateia, Janaína, comentou sobre sua experiência: “Ah, uma poesia para a alma. É espetacular, eles são maravilhosos”. Na edição anterior, ela assistiu ao concerto pela transmissão on-line, no canal Centro Cultural Fiesp, e ficou motivada a prestigiar a apresentação ao vivo.
A próxima apresentação da série acontecerá no dia 4 de dezembro, quarta-feira, às 20h. As entradas serão liberadas no site do SESI-SP a partir do dia 2 de dezembro, segunda-feira, às 8h.
Por dentro do teatro: as engrenagens da orquestra
Ao lado dos assentos da plateia, uma pequena cortina permite o acesso da equipe técnica aos bastidores do teatro. Após lances de escadas e corredores que abrigavam caixas de instrumentos, encontravam-se os músicos da orquestra, reunidos, à espera do momento de subir ao palco.
Longe dos olhos do público, uma nova face da performance musical se revela: a preparação. Uma série de ensaios em conjunto entre a orquestra, o solista e o maestro foi necessária para garantir a unidade do trabalho.
O solista do concerto para piano, Dersu Soares, graduado pela Universidade de São Paulo e, atualmente, mestrando na mesma instituição e bolsista da Orquestra Bachiana Jovem, relatou o processo de ensaio para o concerto. Segundo ele, a peça já fazia parte de seu repertório como intérprete e já havia sido tocada em público, mas teve que ser estudada novamente. Para que toda a obra fosse retomada, foram necessários longos períodos de estudo. Além disso, o pianista destacou a importância da orientação do professor Eduardo Monteiro nesse processo.
A união entre o solista, o maestro e a orquestra também apresentou desafios. “Naturalmente, precisaram ser feitos alguns ajustes de andamento e de entradas, que são pontos ao longo da música em que o piano e a orquestra devem tocar juntos, mas a partir dos diálogos com o maestro, tudo foi chegando ao lugar certo.”
O repertório tocado também agradou aos músicos da Bachiana Filarmônica. Esse é o caso de Sérgio de Oliveira, contrabaixista da orquestra, que acredita que o concerto para piano tem grande capacidade de prender a atenção do público. Além disso, foram tocados o primeiro e o quarto movimento da Suíte Peer Gynt, outro trabalho canônico do compositor norueguês Edvard Grieg.
O Concerto que imortalizou Grieg
Composição de Grieg, o Concerto para Piano em lá menor (Op.16) é uma das obras românticas mais conhecidas do repertório para piano e, com o tempo, se tornou uma das favoritas do público. A peça já foi tocada e regida por grandes nomes da música erudita. Dentre eles, João Carlos Martins. Em entrevista concedida ao Sala33, o maestro recordou sua carreira de concertista, quando ocupou o papel de solista ao piano, e refletiu sobre as transformações na forma como trabalhou com essa obra.
“Eu gosto de fazer esse concerto. Quando o toquei, tinha 24 anos na cidade do Porto, em Portugal. Lembro que nós fizemos entre três e quatro ensaios. É um concerto que demonstra a genialidade de Grieg e um romantismo que fez época. Toquei e agora regi, quem diria…”
O maestro também ressaltou a necessidade de comunicação entre o solista e o regente e a importância do diálogo através do olhar, durante a performance. Dersu Soares também expressou seu gosto pela peça do compositor norueguês. “Um dos meus trechos favoritos é o tema central do terceiro movimento. A harmonia e o colorido orquestral presentes nesta passagem sintetizam algumas das melhores qualidades do compositor e, para mim, sempre evocam a imagem de uma cena bucólica.”
A ponte entre a população e as salas de concerto
“Acho que esse projeto, que acontece regularmente, gratuitamente, em um lugar próximo a uma estação de metrô, permite que as pessoas possam chegar com facilidade, gratuidade e qualidade.” Assim afirmou Maria Fernanda Guerra, mediadora cultural do SESI-SP. Segundo ela, realizar o Sinfonia na Paulista no Centro Cultural Fiesp contribui para a difusão artística para públicos mais amplos. Isso porque o espaço já é conhecido por proporcionar eventos variados como peças teatrais, performances musicais e palestras.
“É um público eclético”, disse. Para ela, muitos dos que vão ao Centro Cultural para assistirem apresentações de música popular descobrem o Sinfonia na Paulista e ficam interessados. A presença de crianças, apesar de pouco expressiva, é destacada por ela. Trazidos pelos pais, os pequenos gostam dos concertos e os indicam para seus colegas.
O incentivo à música de concerto não se limita ao público, mas se estende aos jovens músicos. Com a direção artística do maestro João Carlos Martins, a Orquestra Bachiana Jovem SESI-SP é uma parceria entre o SESI-SP e a Fundação Bachiana. O grupo oferece bolsas para músicos que tenham entre 18 e 27 anos, promovendo a manutenção da prática musical e o incentivo à profissionalização no meio.
Em meio aos aplausos da plateia e dos agradecimento à orquestra, o concerto terminou com um aperto de mãos entre uma senhora da primeira fila e o Maestro João Carlos Martins. Mais do que uma demonstração amigável, o gesto deixou um recado: a importância da integração entre a música de concerto e o grande público, que aos poucos é concretizada — pelo bem do acesso democratizado à cultura na cidade.
*Imagem de capa: Divulgação/SESI-SP