Por Clara Hanek (clarahanek@usp.br)
Um estudo publicado nesta sexta (29), na revista Ocean and Coastal Research, observou que as bóias de navegação, estruturas aquáticas flutuantes de sinalização, facilitam a passagem de espécies exóticas de um habitat para o outro, como um caminho de pedras.
A pesquisa partiu de uma oportunidade dos pesquisadores que, através de contatos dentro do Porto de Paranaguá, souberam da troca de bóias em 2011. As bóias de navegação servem para marcar o canal, indicar obstáculos e guiar o acesso ao Porto. Normalmente, elas não podem ser acessadas, uma vez que sua manipulação é proibida pela Marinha, para garantir a segurança das navegações.
Já no cais, eles raspavam o material com espátulas e armazenavam as amostras em sacos de plástico, conforme a autoridade portuária trocava as bóias de sinalização. O processo durou alguns dias e, no final, eles recolheram 73 amostras de 23 bóias, desde as mais externas até as no interior do complexo Estuarino de Paranaguá, que estavam há pelo menos uma década no local. Foram encontradas 88 espécies, sendo 44 sésseis, das quais 25 foram identificadas e apenas uma era nativa.
Muitas instalações em ambientes marinhos podem ser utilizadas como substratos artificiais (piers, docas, marinas, cais e as próprias bóias). Como objetos flutuantes, com a maior parte da estrutura submersa, as bóias fornecem condições favoráveis ao desenvolvimento dos organismos. Por serem deixadas por muitos anos sem manutenção ou troca, as comunidades se desenvolvem, potencialmente promovendo a colonização e dispersão dessas espécies introduzidas.
Sendo o Porto de Paranaguá (Dom Pedro II) o maior exportador de produtos agrícolas do Brasil, ele recebe um gigante volume de navios, que são os responsáveis por trazer ao país essas espécies sésseis, muitas vezes em sua fase larval. As correntes marítimas funcionam como dispersoras secundárias, ao ajudar a disseminar as espécies para regiões vizinhas.
O movimento diário das embarcações, originárias de todas as regiões do mundo, torna a Baía de Paranaguá um ambiente muito suscetível à bioinvasão.
O Prof. Dr. Rafael Metri, biólogo pesquisador da UNESPAR (Universidade Estadual do Paraná), em entrevista à Jornalismo Júnior, explica que “uma espécie exótica é invasora quando ela se espalha em relação ao ponto de chegada, ocupa diferentes áreas na região e se reproduz de forma bem sucedida.”
Têm menos espécies nas bóias originadas das áreas mais internas do canal. Isso porque, para muitas, a alta salinidade é um pré-requisito da sobrevivência. Os poríferos, por exemplo, foram pouco encontrados, uma vez que a maioria das esponjas não são de água doce. Já o grupo dos Bivalves estava presente em todas as bóias analisadas, pois sua sobrevivência, em maioria, não depende da salinidade.
A autoridade portuária monitora a biota com programas em alguns substratos consolidados, mas nenhum que foque nas espécies não nativas: “A partir desse levantamento (pesquisa e análise de amostras) começam a surgir as primeiras sugestões de manejo ou de políticas públicas para conter um pouco esse problema, mas ainda não tem nada que aconteça efetivamente, a não ser o monitoramento, que é o primeiro passo.”
O professor completa com: “Precisamos pelo menos saber quais espécies estão ali, para monitorar as novas assim que chegarem. Se forem espécies problemáticas, às vezes é possível combatê-las.” Depois que elas se proliferam, é mais difícil de conter.
A introdução de espécies ‘alienígenas’ ameaça a biodiversidade porque pode comprometer as nativas, seja por competição de recursos ou a própria predação. Além disso, ela ameaça a economia local, como os pescadores (por afetar as espécies pescadas) e danifica as estruturas portuárias a longo prazo.
O estudo mostra a importância da manutenção (limpeza) frequente, monitoramento periódico do Porto e até do uso de tintas anti-incrustantes, que impedem a fixação de organismos. A publicação do artigo foi feita em uma edição especial do periódico Ocean and Coastal Research, em homenagem ao pesquisador Paulo Lana, grande cientista e professor dos autores.
*Imagem de capa: Reprodução/Rafael Metri