Quando se digita “vegetarianismo” no Google, o primeiro link que nos é apresentado leva a um artigo do Wikipédia que explica minuciosamente no que consiste essa dieta. São, no entanto, as três palavrinhas que intitulam um dos tópicos desse artigo que melhor conseguem resumir o que foi – e até mesmo o que não foi – abordado ali pelos contribuintes do site: “Confusão de termos”.
Quando se pensa em “vegetarianismo” no Brasil, a primeira associação feita pela maioria das pessoas é à imagem de uma folha de alface. No artigo do Wikipédia ao qual já nos levou o Google, constata-se que vegetarianismo é um “regime alimentar que exclui da dieta todos os tipos de carne”. O senso comum brasileiro, no entanto, prioriza não a eliminação das carnes, mas a presença de saladas ou de comidas “light” na criação desse conceito. Por esse motivo, é raro encontrar um vegetariano que nunca tenha ouvido as perguntas “Mas, e peixe?!” ou “Presunto você come?” por aí.
Da dificuldade em imaginar uma dieta sem a “vangloriada” carne – ou à base de simplórias folhas de alface – ao sacrifício para obter informações precisas sobre o assunto, entende-se o porquê de não se conseguir apurar quem realmente deixa as carnes de fora do prato, no Brasil.
Apesar de, segundo uma pesquisa do IBOPE feita em 2010, 9% dos brasileiros se dizerem “vegetarianos”, muitos deles comem peixe e frango. E essa porcentagem, grande quando comparada com a de países como França, Portugal e Holanda, perde todo o seu valor.
O próprio conceito de “dieta sem carnes” é nebuloso: muitos médicos ou nutricionistas informados pela mídia e pelas próprias instituições de ensino em que se formaram se contradizem e não conseguem tratar adequadamente pacientes que precisam de orientações.

Nutricionista formada e regularmente inscrita no Conselho Regional de Nutricionistas do estado de São Paulo, Ana Luisa Bento Fernandes acredita que a formação acadêmica do profissional dá, sim, o preparo para que ele consiga aconselhar o paciente em qualquer dieta requisitada. “O que pode ocorrer no dia a dia, é que nem todos os profissionais nutricionistas têm uma vivência pessoal com essas dietas, o que faz falta na hora de sugerir cardápios.” Um “mito” comum, com que Fernandes já teve que lidar, é o de que quem é vegetariano precisa de suplementação nutricional. “Já fui procurada por uma pessoa que me solicitou uma receita de suplemento de vitaminas e minerais, justificando ter se tornado ‘vegetariana’, e estar preocupada em ‘estar com falta de vitaminas’. Se estava insegura, o que terá motivado a decisão? Por que não me solicitou uma orientação alimentar e sim uma receita de suplemento?” Médico especializado em nutrição, Eric Slywitch desmente a noção dessa necessidade, adicionando ainda que há vários tipos de suplementação indicados para onívoros presentes em nosso dia-a-dia. Um bom exemplo é a adição de iodo ao sal. “Tal adição tem o objetivo de garantir que o iodo seja fornecido a todos os brasileiros, tendo em vista que a sua deficiência é uma das principais causas de retardo mental em crianças (cretinismo)”, afirma Slywitch. Autor de livros como “Virei Vegetariano, e Agora?” e “Alimentação Sem Carne”, o médico demonstra serem mentiras outras noções também bastante difundidas, como a de que vegetarianos devem necessariamente consumir soja. Segundo Slywitch, na verdade são os feijões os melhores substitutos da carne.

Segundo especialistas como o estadunidense Jonathan Safran Foer, a necessidade nutricional de alimentos de fonte animal é apenas um discurso sustentado na cultura ocidental e na importância da indústria da carne para a economia mundial. Safran Foer passou 3 anos de sua vida pesquisando de perto a indústria da carne, para depois registrar seu estudo e suas perspectivas morais a respeito desse consumo na obra “Comer Animais”, publicado no Brasil pela editora Rocco. Mais do que uma simples apologia à dieta, o livro conta a trajetória desses anos de pesquisa desde a curiosidade inicial do autor, que se dá por motivos éticos, até sua visita a inúmeros frigoríficos e abatedouros norte-americanos.
Devido à confusão de conceitos que percebemos no dia-a-dia, e do qual até o Wikipédia tem consciência, é preciso informar-se e prestar atenção no que se come depois de abandonar as carnes. As leituras aqui mencionadas são altamente indicadas para quem quer adotar e até mesmo para quem já é adepto dessa dieta, que, se não se sentir plenamente seguro e saudável, deve consultar um nutricionista.
por Giovana Feix
gih.feix@gmail.com