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Vidas e arte no centro de um belo palco

Vou ser honesto: não sou grande fã de dramas de época. Tenho pouca paciência para eles. Talvez seja os enredos mais complexos, os figurinos muito extravagantes, o linguajar rebuscado… Não sei! Simplesmente não é o meu gênero de filme preferido. Portanto, quando soube que o diretor de Orgulho e Preconceito (Pride and Prejudice, 2005) e …

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Vou ser honesto: não sou grande fã de dramas de época. Tenho pouca paciência para eles. Talvez seja os enredos mais complexos, os figurinos muito extravagantes, o linguajar rebuscado… Não sei! Simplesmente não é o meu gênero de filme preferido. Portanto, quando soube que o diretor de Orgulho e Preconceito (Pride and Prejudice, 2005) e Desejo e Reparação (Atonement, 2007) lançaria um novo filme nesses moldes, com Keira Knightley novamente no papel principal, não pude deixar de ter a sensação de “mais uma obra entediante”. Mas, esse último trabalho de Joe Wright provou que eu estava errado. Muito errado.

Anna Karenina (Idem, Reino Unido, 2012) é a sexta adaptação cinematográfica do romance escrito por Liev Tolstói. Nela, somos apresentados às vidas da alta classe russa, durante o Império do século XIX. Anna (Keira Knightley) está muito bem casada com o Conde Alexei Karenin (Jude Law). Por outro lado, seu irmão, Príncipe Stepan Oblonsky (Matthew Macfadyen), trai constantemente a esposa. Com o objetivo de salvar o casamento do irmão, Anna viaja ao seu encontro e acaba conhecendo o Conde Alexei Vronsky (Aaron Taylor-Johnson), pretendente da Princesa “Kitty” Shcherbatskaya (Alicia Vikander) – cunhada de Oblonsky e amor não correspondido do jovem Konstantin Levin (Domhnall Gleeson).

Os sentimentos entre Anna e Vronsky começam a florescer a ponto de se tornarem amor. Porém, um confuso e conflituoso amor, já que Anna se vê agora entre a felicidade com seu novo amante e a fidelidade para com seu esposo. Isso em uma sociedade que vê, com maus olhos, o adultério.

Esse enredo, apesar de envolvente e interessante, acaba sendo pouco surpreendente para nós, já acostumados com o estilo das histórias realistas da época. Isso acaba refletindo , de certo modo, no roteiro. As falas escritas por Tom Stoppard não são extraordinárias, mas são boas em retratar as personagens e em conduzir a narrativa. O mesmo pode ser dito sobre as atuações: nenhum dos atores entrega interpretações espetaculares, mas são bastante competentes, destacando-se a representação irônica que Matthew Macfadyen dá a Oblonsky.

Porém, o filme se sobressai muito na parte artística. As escolhas na direção de arte e fotografia, juntamente com tomadas belas e diferentes, tornam-no um dos filmes mais visualmente bonitos da temporada. E é justamente apoiado nesse ponto que o script encanta.

Assumindo seu foco no lado artístico, Anna Karenina se dá a liberdade de explorar além da estrutura cinematográfica corriqueira. Um trenzinho em miniatura é, em um momento, brinquedo do filho de Anna para, imediatamente depois, representar o trem em que ela viaja para a cidade de seu irmão. O que, inicialmente, é uma espécie de escritório conjunto, com o simples virar da câmera, se transforma em um restaurante em questão de segundos. A dança de um casal ganha destaque em um baile através da imobilidade das outras pessoas. Várias cenas são encantadoramente montadas com uma mistura de coordenação e estética quase teatrais.

Aliás, o teatro tem papel bem importante nesse filme. Para Joe Wright, pode-se dizer que a maneira como as pessoas se comportavam na sociedade russa da época era, de certa forma, uma atuação (saiba mais nesse vídeo voltado ao público português). Portanto, para abrigar todas essas interpretações, um teatro real é usado como locação em algumas cenas. Porém, nunca como teatro em si. Ele se transforma em diversos outros cenários: casa, quarto, rua, rinque de patinação… E não só o palco é utilizado, como também a parte dedicada à plateia e as cochias – essas últimas de maneira muito criativa, diga-se de passagem.

Ver o teatro assumindo as mais diferentes formas dá ao filme uma certa sensação de unidade. Sua presença recorrente durante os atos torna-o familiar ao espectador após certo tempo, como se o próprio teatro fosse uma personagem extra que interage com os protagonistas e amarra suas histórias. Afinal, cada uma das partes da narrativa passa, invariavelmente, por ele. Além disso, é prazeroso e divertido ver a originalidade da produção ao adaptar vários locais aos limites do espaço teatral. Nunca se sabe no que ele pode se transformar e, assim que uma adaptação inusitada aparece na tela, é difícil não esconder o riso de deleite.

É uma pena, entretanto, que esse aspecto artístico fique mais concentrado na primeira parte do filme, na qual todas as “representações” de que Wright fala acontecem. Mais para o final, que prioriza os conflitos psicológicos de Anna, a história torna-se um pouco mais arrastada, com menos recursos visuais surpreendentes. Porém, não quer dizer que o filme torna-se tedioso ou menos bonito por causa disso.

Não espanta que Anna Karenina teve seu lado técnico reconhecido pelas grandes premiações. Sua fotografia, direção de arte, música e figurino – vencedor do Oscar – são, quando não surpreendentes, bem acima da média. Espanta, porém, que não tenha concorrido a prêmios de direção ou de melhor filme. Pois, este é um ótimo filme que não deveria ser negligenciado. Nem mesmo por quem não é grande fã de filmes de época.

Por Daniel Morbi
daniel.morbi@gmail.com

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