O fim do mundo é um tema manjado no mundo do cinema. Filmes como O Dia Depois de Amanhã (The Day After Tomorrow, EUA, 2004), Armageddon (Idem, EUA, 1998) e o tão atual 2012 (Idem, EUA, 2009) já trataram desse temido dia, presente no imaginário popular. Porém, nenhum deles deve ser tão tocante como Procura-se um Amigo para o Fim do Mundo (Seeking a Friend for the End of the World, EUA, Singapura, Malásia e Indonésia, 2012).
Aqui, o fim da vida humana na Terra vem na forma de um cometa que atingirá o planeta em três semanas. Com seus destinos já traçados, as pessoas reagem diferentemente aos seus últimos dias: alguns se matam, alguns vivem a vida intensamente. Já a mulher de Dodge (Steve Carell) decide largá-lo. Sozinho, Dodge acaba conhecendo Penny (Keira Knightley), sua vizinha, que também acaba de passar por uma separação. Após uma série de eventos, ambos decidem se ajudar a realizar seus últimos desejos antes do fim do mundo: para ele, reencontrar Olivia, seu verdadeiro amor de infância; para ela, reencontrar sua família. Porém, à medida que as semanas passam, a amizade entre eles transforma-se em algo maior.
Para fazer justiça a esse filme, deve-se fazer duas observações iniciais. Primeiro: embora trate sobre um apocalipse, não há aqui efeitos especiais, grandes explosões e destruições. O foco não está no desastre em si, mas nas pessoas envolvidas nele. Segundo: apesar de ter bastante cara de comédia – principalmente pela presença de Carrel, mais conhecido por filmes e séries cômicas –, Procura-se um Amigo não é um filme humorístico. Sim, há cenas bastante engraçadas e memoráveis, mas o roteiro/direção de Lorene Scafaria tendem a uma mistura de humor, drama e romance, sem a pieguice de uma comédia romântica.
Esclarecidos esses pontos, a verdadeira beleza do filme se mostra. Ao tratar sobre pessoas, ele sai da zona de conforto dos filmes catastróficos e introduz questões mais profundas sobre os sentimentos humanos e o valor de nossa vida. Assistir a Dodge e Penny encontrar e reencontrar pessoas, familiares e o amor, em um belo enredo fortemente baseado nos road movies, além de entreter, leva-nos a pensar em tudo aquilo que fizemos ou deixamos de fazer, em tudo que amamos ou nos arrependemos, culminando na pergunta essencial: será que eu aproveitei minha vida antes da chegada do fim?
Mas, o mérito de Procura-se um Amigo não está somente em um roteiro bem escrito. Os dois atores principais também fazem um belo trabalho. Carell, dono de atuações espalhafatosas vistas na série de televisão norte-americana The Office ou no filme Agente 86 (Get Smart, EUA, 2008), é muito convincente ao encarnar um vendedor de seguros inicialmente desiludido com a procura de um novo amor no fim do mundo, um papel bem mais sério e introspectivo que os citados anteriormente.
Porém, quem realmente rouba a cena é Knightley. Mais lembrada por seus papeis como a dama em apuros em Piratas do Caribe (Pirates of the Caribbean, EUA, 2003, 2006, 2007) ou por personagens de época como em Orgulho e Preconceito (Pride and Prejudice, França, EUA e Reino Unido, 2005) e A Duquesa (The Duchess, EUA, França, Itália e Reino Unido, 2008), aqui Keira interpreta uma mulher contemporânea comum, com seus gostos por discos de vinil e dificuldade para acordar.
A simplicidade, o carisma e a espontaneidade de sua personagem criam não somente um contraste interessante com a introspecção de Carell, no clássico “os opostos se atraem”, como também uma compaixão por parte do público (ou, pelo menos, por minha parte), levando a olhos mareados em cenas realmente emocionantes (novamente, pelo menos, por minha parte). A dinâmica entre os personagens e suas histórias são tão envolventes que não se surpreenda se, uma vez ou outra, você esqueçer toda a melancolia que os últimos dias de vida trazem e simplesmente se deixar levar. Tudo isso embalado por canções que se encaixam perfeitamente no clima do filme e só aumentam essa sensação de imersão.
Se separarmos Procura-se um Amigo para o Fim do Mundo em partes, vemos que ele é um filme sobre o apocalipse e sobre o amor que nasce entre dois desconhecidos.
Nenhuma dessas partes é lá muito empolgante ou original. Porém, o filme é bem maior que a soma de suas partes. É engraçado, romântico, sutil e profundo nas doses
certas.
E você? O que faria se, em três semanas, seu mundo chegasse ao fim?
Por Daniel Morbi
daniel.morbi@gmail.com