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Visibilidade no mundo da arte

Além de criatividade e domínio de técnicas, viver de música requer uma boa dose de coragem. Ainda mais em uma cidade do tamanho de São Paulo. Por Luiza Fernandes (luizafc00@gmail.com) Não é de hoje que a cena musical de São Paulo é efervescente e que o que se faz nela ecoa Brasil afora. Foi nessa cidade …

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Além de criatividade e domínio de técnicas, viver de música requer uma boa dose de coragem. Ainda mais em uma cidade do tamanho de São Paulo.

Por Luiza Fernandes (luizafc00@gmail.com)

Não é de hoje que a cena musical de São Paulo é efervescente e que o que se faz nela ecoa Brasil afora. Foi nessa cidade que a Bossa Nova e os famosos Festivais da Música Popular Brasileira – que exibiram, principalmente em 1967, os ousados tropicalistas – aconteceram de fato.

Entretanto, os grandes destaques desses movimentos não são paulistanos. Artistas consagrados hoje em dia, como João Gilberto – tido como mentor da Bossa Nova, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gal Costa e Tom Zé – envolvidos na Tropicália – eram baianos, por exemplo; Elis Regina, gaúcha. Esses músicos, em especial os tropicalistas, vieram para cá para crescer, romper com a realidade de sua época e conseguir a abertura da música brasileira a um som universal, que unisse regionalismos com as influências do exterior; que possuísse potencial crítico e criativo.

Todos escolheram trabalhar e viver de algo que não é o caminho mais convencional que se poderia escolher e que não possui fórmula de sucesso. Se viver fora de casa já é um processo complicado, imagina quando se fala em viver de algo incerto.

Na verdade, pouco se comenta dos detalhes desse fenômeno que de lá pra cá só aumentou. Apesar de algumas décadas terem se passado, São Paulo ainda é o destino mais procurado pelos músicos e o motivo ainda é mesmo: a busca por uma chance.

Chances

Músico carioca revela sua trajetória em São Paulo (Foto: Arquivo pessoal)

“Aqui [em São Paulo] é tão difícil quanto no Rio, mas lá não tem nem a chance. Quando você não tem nem a chance de mostrar alguma coisa, não tem porque ficar nesse lugar”, diz Pedro Terra, músico carioca que participou da primeira edição do programa televisivo Geléia do Rock, do canal Multishow. Recém chegado à cidade de São Paulo, ele decidiu se mudar em maio desse ano, buscando trabalhar como produtor musical, principalmente no ramo de trilha sonora.

Para ele, o Rio de Janeiro, que é tido por muitos como um polo da música também, não é aberto para esse ramo. Ele explica o porquê dessa imagem: “As maiores gravadoras do mundo têm sede no Rio, o que nos faz pensar que lá existe um mercado muito rico musicalmente, mas é um mercado muito fechado. Eles só querem trabalhar com a mesma galera, chamar as mesmas bandas. As duas semanas que eu tive em São Paulo foram mais produtivas do que os seis meses que passei no Rio procurando trabalhar com música”. E sobre o Rio, ele completa: “Lá é dificil, o pessoal quer mesmo ir pra boate, ao invés de ver uma banda. Aqui tem mais lugar e tendo mais lugar, fica mais fácil de acontecer. Você pode estar em qualquer esquina, praticamente”.

Por quê?

São Paulo possui muitas vantagens em relação a outras capitais brasileiras quando a questão é arte. Na cidade, existem públicos que procuram por eventos culturais, lugares que possam comportá-los e pessoas que promovam tais eventos, tanto da esfera pública quanto da privada.

A Virada Cultural é uma forte prova disso, pois é um evento promovido pela prefeitura, desde 2004, no qual todo o centro da cidade abriga eventos culturais diversos, simultaneamente, durante 24 horas ininterruptas. É a única capital em que um fenômeno dessa magnitude acontece. “É um evento inacreditável; a quantidade de gente que se mobiliza pra ver as coisas é impressionante. Eu toquei nela uma vez e vi um mar de gente que não acabava mais. Tem gente interessada em fazer as coisas, em investir dinheiro nisso e é por isso que tudo acontece”, diz Pedro.

Para Regis Damasceno – guitarrista da banda cearense Cidadão Instigado, os estabelecimentos de Pinheiros são mais conhecidos, mas as 19 unidades do SESC espalhadas pela cidade, as casas de show no centro, na Barra Funda e na Augusta ajudam a descentralizar isso.

Regis, que já tocou com músicos como Nina Becker, Tom Zé, Vanessa da Mata, Arnaldo Antunes e Otto, saiu de Fortaleza, sua cidade natal, há nove anos e veio para São Paulo em busca de maiores oportunidades no ramo musical: “Eu vim pra tentar mesmo, porque eu já estava meio de saco cheio de fazer o que eu fazia lá em Fortaleza. Eu toquei durante cinco anos em uma banda cover dos Beatles e depois em bandas de barzinho. Não tinha como tentar nada mais artístico. Eu vim pra tentar viver em São Paulo como músico. Já sabia que não ia ser fácil, mas resolvi tentar”.

A falta de infra-estrutura e de profissionais capacitados nas regiões de origem da maioria dos artistas é algo que contribui para que o fluxo deles em direção à capital paulista seja grande. A cantora maranhense Luciana Simões – que já participou das bandas Mystical Roots, Natiruts e hoje compõe o Projeto Criolina, ao lado de Alê Muniz – frisa aspectos técnicos: “Há mais oportunidade, trabalha-se em condições diferenciadas, que vão atender as necessidades do espetáculo, como, por exemplo, bons equipamentos de som, bons técnicos de áudio e de iluminação. Em São Luís, não existe formação para esses tipos de trabalho”.

Mudanças: dificuldades e adaptação

Antes de a banda receber o convite para morar na cidade, Luciana já havia decidido romper com São Luís e buscar novos horizontes. Nesse meio tempo, a cantora ficou na casa de um amigo. Entre idas e vindas, ela morou 10 anos em São Paulo. “Em 1999, me mudei. Fui com a banda, a Mystical Roots, e durante 1 ano moramos juntos na mesma casa, com outra banda”, diz Luciana. “Essa época foi muito difícil porque ficamos em uma casa que não tinha estrutura nenhuma. A gente não tinha móvel, não tinha porta, não tinha quase nada”.

Resultado do esforço da Banda Criolina, vídeo ilustra o trabalho de Luciana Simões e sua equipe: “Quem trabalha com arte não empreende, desbrava. Não existe um caminho formado, uma trilha a seguir. Você vai empreendendo e apreendendo com a prática”.

Pedro e Regis também se hospedaram em casa de amigos no início. O carioca conseguiu fazer um trato com o seu: “eu cozinharia na casa e se os gastos dele, comprovadamente, diminuíssem com a comida, eu já pagaria minha estadia ali”. Já o cearense, dividiu um apartamento na Lapa com o seu parceiro de banda, Fernando Catatau. Apesar de vir pensando em morar na cidade, o guitarrista não conseguiu se adaptar de imediato. Após lançar o primeiro CD da banda O Ciclo Da de.Cadência e passar seis meses em São Paulo, decidiu voltar para Fortaleza. “Em 2002, a metade do ano que eu estive aqui não foi boa pelo fato de ser muito diferente. Eu nunca tinha morado fora de Fortaleza, que é um lugar litorâneo e é outra dinâmica. São Paulo é uma cidade muito grande, tudo parecia muito longe e caro. Não gostei, minha adaptação foi muito ruim. Passei muito tempo considerando se viria pra cá de novo”.

E o medo? O carioca Pedro Terra entrou tanto de cabeça que a ficha da mudança só caiu quando ele estava a caminho de São Paulo: “Bateu medo quando eu estava vindo no ônibus. Pensei: ‘Caralho, tô fodido! Agora sou eu por mim’. Me dei conta de onde estava me colocando”.

É preciso, além de se mudar, estar disposto a acompanhar o ritmo da cidade. Regis acredita que a teimosia em aceitar a dinâmica paulistana foi o que o que fez voltar para Fortaleza. Entretanto, em 2005 o músico resolveu se aventurar novamente e, dessa vez, ficou pra valer até os dias de hoje: “Apesar de ter visto que aqui é difícil, parece que é uma questão de tempo ou de exposição; de você se dispor a entrar de cabeça no negócio pra ele dar certo. Na época, eu não fiz isso, tentei pouco e não me dispus. Quando entrei no ritmo da cidade – comecei a ir assistir shows, a conhecer pessoas, a mostrar a cara, as coisas vieram de uma forma mais legal. Muita coisa boa aconteceu nesses anos que eu moro aqui”.

Já a maranhense Luciana Simões, procurou fazer o máximo de coisas possíveis quando chegou a São Paulo. Ela buscou estar dentro do meio musical entrando na Universidade Livre de Música (ULM), que também é conhecida como Escola de Música do Estado de São Paulo (EMESP), frequentando lugares ligados ao meio e procurando parcerias com pessoas que ela achava que poderiam lhe proporcionar visibilidade ou conhecimento.

Sonoridade

A mudança de ares, sem dúvida, provoca também alteração nas influências artísticas, principalmente quando se fala em uma cidade tão cosmopolita quanto São Paulo. Mais concreto, mais prédios, mais carros, mais gente, mais gente diferente. Você sai da sua zona de conforto, daquilo que já se conhece com propriedade e entra em uma verdadeira selva de concreto. Luciana concorda com isso: “[A sonoridade] deu uma ligada com a música contemporânea, porque incorporou o cenário urbano, o contato com as pessoas e com a vida de lá. O que acontece em São Paulo acontece no mundo, é uma cidade cosmopolita. Eu não tinha mais só uma referência regional, da minha terra; passei a me sentir parte de São Paulo”.

A cantora considera que viveu várias fases na cidade, a primeira com a banda Mystical Roots e outra com Alê Muniz, seu parceiro no Projeto Criolina e também seu marido. “Acho que temos uma forma muito legal de trabalhar com essas referências, porque ao mesmo tempo em que fazemos uma coisa do norte, fazemos uma mistura, trazendo uma sonoridade mais atual justamente pela vivência em São Paulo. Nosso som não perde sotaque, mas comporta uma linguagem moderna, que dialoga com a juventude. Acho que misturar muito é a sabedoria que a gente tem que extrair desse mundo de hoje”, diz ela.

"Resultado de uma mescla de experiências entre São Luís e São Paulo, a música da Banda Criolina possui "um toque daqui e de lá", segundo Luciana Simões (Foto: Site oficial da Banca Criolina)

Regis Damasceno também reconhece a influência de São Paulo em músicas do Cidadão Instigado que falam do período de transição. “Talvez o que a gente vive de música aqui tenha influenciado nosso jeito de tocar, compor, criar. Acho que quando você está em um ambiente você é influenciado por ele”.

Vale a pena?

Pedro Terra é categórico: “Vale a pena ficar aqui e tentar. Não sinto vontade de voltar a morar no Rio. Gosto muito mais de São Paulo do que do Rio pra ter um lugar pra chamar de lar. Eu procuro ao máximo não ter expectativas porque quanto menos expectativas, menos decepções”. Ele quer trabalhar com produção de trilhas sonoras, mas tem consciência dos desafios que vai enfrentar.

Vídeo feito por Raphael Martins e Artur Medina e trilha sonora de Pedro Terra. Ele explica: “Um amigo tava fazendo um trabalho, ficou entediado uma hora e resolveu jogar tinta no copo de água que ele tava bebendo. Ele achou bem legal, filmou, editou e publicou no facebook. Aí eu me ofereci pra fazer uma música para aquele vídeo. Filmamos em HD e ficou melhor ainda.”

“É um investimento, não só de dinheiro, que é o menor investimento de todos, mas de ânimo mesmo”, diz Regis. (Foto: My Space da Banda Cidadão Instigado)

Se São Paulo é terra de chegada, também é de saída. Luciana e Alê decidiram voltar a morar em São Luís para ajudar a criar uma cena cultural independente na cidade. “Moramos lá como Criolina, mas achamos que a cidade de São Luís tem muitas manifestações culturais e resolvemos trabalhar isso, não ter oportunidades e cria-las”. Apesar de não morar mais em São Paulo, a dupla ainda vai muito para lá, pois quase todo mês retorna para fazer shows. Ao mesmo tempo, Luciana diz que não quer se desligar de São Luís. “Eu sempre estou indo e voltando e quero permanecer fazendo isso. Pretendo ter uma casa lá e uma casa aqui, pra poder conciliar: eu tenho uma ligação muito grande com São Luís e não quero perder isso, mas ao mesmo tempo vou e preciso ir muito para São Paulo”. De todo esse percurso, Luciana acredita que fica seu aprendizado e a troca cultural. Para ela, esse processo de mudança, de sair de casa, conhecer outras culturas e hábitos é muito importante, pois proporciona crescimento profissional e pessoal. “Acho que se eu tivesse que voltar atrás, teria feito a mesma coisa”, diz ela.

Já Regis, que ainda mora em São Paulo, pretende continuar na cidade. “Eu acabei gostando daqui depois de algum tempo e pretendo ficar pelo tempo que eu tiver trabalho”, diz ele. De todo esse caminho, ele também considera que ganhou muita experiência: “Dá muita satisfação ter tocado com tanta gente legal. Você ganha dinheiro, obviamente, pra se manter e ter uma vida. É isso. Tem que correr atrás, focar bastante pra continuar gravando as coisas, produzindo e continuar sendo chamado pra fazer os trabalhos”.

Para saber mais sobre a banda Cidadão Instigado, acesse o myspace:

http://www.myspace.com/cidadaoinstigado/photos/60922485

E para saber mais sobre o Projeto Criolina acesse a página oficial da banda:

http://www.criolina.com.br/

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