Ya no estoy aquí (2019) conta a história do jovem Ulisses (Juan Daniel García Treviño), um mexicano de 17 anos que se vê obrigado a emigrar para os Estados Unidos em decorrência de uma repentina desavença com uma gangue local. Mais do que isso, o filme é uma narrativa de desigualdade, amor e resistência cultural.
Ulisses é um rapaz que mora na periferia de Monterrey, no nordeste do México, e que desde pequeno é apaixonado pela Cúmbia, dança originária da América Central que mistura ritmos negro, espanhol e indígena. Junto de alguns amigos, compõe Los Terkos, grupo que ele lidera e que faz presença nas rodas de Cúmbia. A dança é protagonista assim como o jovem, devido a originalidade e criatividade dos passos, das roupas, acessórios e penteados é quase impossível não se deixar seduzir em ao menos uma das cenas em que Los Terkos mostram o motivo da popularidade na cidade.
Ya no estoy aquí é forte e real sem se deixar cair na obviedade e monotonia comum a longas que tentam trazer uma realidade que não costuma brilhar nas telas. Além de oferecer uma direção de fotografia impecável que, ainda assim, não romantiza a realidade pobre na qual vive o protagonista. A riqueza das imagens impressiona e emociona, principalmente quem vive no Brasil e enxerga um país não tão diferente do seu.
A trama se passa no passado de Ulisses, no México, e na pós emigração ilegal, nos Estados Unidos. Neste primeiro momento, o jovem é popular, costuma sair constantemente com o grupo e é respeitado, inclusive, por traficantes do bairro.
A questão das gangues é mostrada com sutileza e parece não interferir diretamente na vida dos jovens. Acontece que, por conta de uma brincadeira, aparentemente inocente, Ulisses é obrigado a sair do México e é em Nova York que ele tenta reconstruir sua vida.
Na nova cidade, o protagonista já não é mais popular, pelo contrário, ele é constantemente hostilizado pelos colegas de quarto que também são companheiros no emprego. Apesar de ser corriqueiramente ofendido por causa do seu estilo, mais do que nunca, único, Ulisses é observado por um fotógrafo (Brandon Stanton) tipicamente estadunidense (branco, loiro e alto). O fotógrafo vendo um menino diferente de seu padrão “superior” com olhos claros e evoluídos se interessa como um pesquisador se interessaria por uma espécie diferente da sua.
Mas o estadunidense não é o único a enxergar Ulisses dessa forma. Uma das personagens mais importantes na construção da obra aparece também em Nova York, neta de um imigrante japonês. Lin (Angelina Chen) é uma jovem que se encanta com o protagonista, sua aparência e seu estilo pouco conhecidos.
O pouco conhecimento que um tem sobre o idioma do outro impede que eles se conheçam de verdade, o que Lin está sempre tentando fazer. Algumas vezes a menina acaba, inclusive, passando do limite e irritando Ulisses com sua insistência. Animada com a novidade que é a presença dele e de sua cultura, ela começa a usar roupas que lembrem o estilo cholombiano, como são chamados os que, assim como o protagonista, seguem o estilo da Cúmbia. A jovem parece não entender o limite de estudar ou se deixar fascinar por uma cultura sem tentar se apropriar dela.
Como bem deixa claro Ya no estoy aquí, a vida de um imigrante, sobretudo mexicano, nos Estados Unidos, é a última situação que se deseja a alguém. Ulisses acaba retornando ao seu país de origem e encontrando tudo completamente diferente da forma como deixou, assim como ele próprio.
Ya no estoy aquí está disponível para todos os assinantes da Netflix. Confira o trailer:
*Imagem da capa: Reprodução/ Netflix