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Munique, de Robert Harris, é um prato cheio para os amantes de História

Imagem: Letícia Vieira – Audiovisual / Jornalismo Júnior Misturando ficção à realidade, Robert Harris em Munique (Alfaguara, 2018) trata do Acordo de Munique e os quatro dias que precederam este marco do século XX, tudo com muita emoção e perspicácia. O enredo gira em torno de Hugh Legat, secretário do primeiro-ministro britânico Neville Chamberlain, e de Paul von …

Munique, de Robert Harris, é um prato cheio para os amantes de História Leia mais »

Imagem: Letícia Vieira – Audiovisual / Jornalismo Júnior

Misturando ficção à realidade, Robert Harris em Munique (Alfaguara, 2018) trata do Acordo de Munique e os quatro dias que precederam este marco do século XX, tudo com muita emoção e perspicácia. O enredo gira em torno de Hugh Legat, secretário do primeiro-ministro britânico Neville Chamberlain, e de Paul von Hartmann, membro do time de relações exteriores na Alemanha e participante de um grupo anti-Hitler. Os dois haviam sido amigos de faculdade em Oxford, tendo conhecido a Alemanha em 1933 juntos com uma colega. Devido a episódios traumáticos que se revelam ao leitor no decorrer do romance, seguiram cada um seu rumo, até que a ameaça da guerra une-os por uma última vez.

É incrível como o autor desenvolve o desejo de conquista da Tchecoslováquia pelos nazistas, de forma a cativar o leitor. Para aqueles que nunca haviam escutado sobre este episódio de 1938, Munique vai além da literatura e apresenta uma grande aula de História da qual não queremos mais desgrudar os olhos até a última página.

Legat, que começa como protagonista, nos mostra o lado britânico daquele momento. Muito próximo à Chamberlain pelo cargo que ocupava, descreve todos os momentos de tensão vividos pelo primeiro-ministro, que tentava encontrar uma solução pacífica para a questão das terras tchecas em meio às atitudes imprevisíveis e ao imediatismo de Hitler.

A Inglaterra, assim como os outros países europeus, acabava de sair da Primeira Grande Guerra. Seu arsenal bélico era escasso e o povo ainda sofria com todas as baixas trazidas pelo conflito, responsável por mais de 40 milhões de mortes no total. Assim, entrar em guerra com a Alemanha naquele momento crítico poderia significar uma grande derrota aos britânicos.

Hartmann, então, assume o protagonismo, e nos leva ao outro lado da moeda. Apesar de ser britânico, havia escolhido morar e trabalhar na Alemanha, considerando-se um “social nacionalista”. Entretanto, sua ideologia era totalmente contrária ao nazismo que Hitler impunha àquela nação, e, assim, se envolve em um grupo anti-Hitler, formado principalmente por seus colegas de trabalho após as ameaças de guerra do líder.

O exército alemão também era contrário à guerra naquele momento. Consideravam sandice um novo confronto depois da derrota humilhante da Alemanha na guerra e da crise instaurada pelo Tratado de Versalhes. Assim, um golpe começava a ser armado para desmanchar o governo nazista.

Começa uma corrida pela paz. Hitler não quer esperar para invadir a Tchecoslováquia, alegando que ali muitos alemães estão sofrendo e sendo maltratados. A Inglaterra, que tinha a Tchecoslováquia como aliada, precisa tomar uma posição: ou entra em guerra com a Alemanha e encara as consequências da falta de preparo bélico, ou abandona sua aliança e dá aos nazistas as terras tchecas. Chamberlain, temendo o resultado que qualquer uma das escolhas poderia causar não só à Inglaterra, mas ao mundo, apela a Mussolini. O primeiro-ministro pede ao fascista italiano que consiga uma reunião com Hitler e que as tropas nazistas não avancem sobre a Tchecoslováquia até seu término. Hitler aceita a proposta e suspende a ação por 24 horas.

É então que o romance começa a pegar fogo. Hartmann consegue se infiltrar na equipe que viajaria com Hitler para o encontro e Legat é incluído no voo com Chamberlain para Munique, após receber uma mensagem do velho amigo com informações secretas que poderiam ajudar a Inglaterra.

 

O caso de Angela Geli Raubal

Ao longo do romance, muitos episódios nos fazem refletir e imaginar o quão desestabilizado um povo precisaria estar para aceitar como líder um homem como Hitler. Também nos traz alguns detalhes sobre sua vida que muitas vezes não chegam nas salas de aula, como a morte de sua meia-sobrinha Angela.

Havia rumores de que o líder nazista abusava sexualmente da jovem e sustentava uma paixão intensa por ela, rumores esses que apenas aumentaram após o suposto suicídio de Angela. Ela morava no quarto ao lado do de Hitler, em seu apartamento de número 16. Robert Harris comenta o episódio em uma das cenas, na qual Hartmann consegue abrir a porta do quarto de Angela na moradia de Hitler.

“A proximidade entre aquele quarto e o quarto de Hitler, a intimidade tão sufocante, o banheiro compartilhado, o modo como continuava sendo preservado como um santuário, como uma câmara mortuária egípcia…”

Retrato de Adolf Hitler com sua meia-sobrinha Angela Geli Rubal, encontra morta em 1931. (Foto: Getty Images)

Hoje, o apartamento serve como uma delegacia, principalmente para evitar encontros de grupos neo-nazistas naquele espaço.

 

O documento de paz assinado por Hitler e Chamberlain

Robert Harris também nos remete ao documento que Chamberlain levou ao apartamento de Hitler após a assinatura do Acordo de Munique. Nele, as palavras de paz proferidas ao vento por Hitler no rádio foram escritas, e sem ter como recuar, o nazista foi induzido a assinar o que havia dito.

O encontro foi marcado pelo próprio primeiro-ministro com Hitler, na tentativa de encontrá-lo longe das vistas de Ribbentrop, ministro de Relações Exteriores da Alemanha nazista, e de outras figuras importantes que poderiam influenciar a decisão do líder. Com o documento, Chamberlain pretendia demonstrar para toda a Europa que Hitler estaria se contradizendo se armasse uma Guerra.  

Documento assinado por Hitler e por Chamberlain, em 30 de setembro de 1938. (Foto: Alamy Stock Photo)

“Nós, o Fuhrer e Chanceler da Alemanha e o primeiro-ministro britânico, tivemos um novo encontro no dia de hoje e estamos de acordo em reconhecer que a questão das relações anglo-germânicas é de importância primordial para os nossos dois países e para a Europa.

Consideramos o acordo assinado na noite de ontem um símbolo do desejo de nossos povos de nunca mais entrarem em guerra um contra o outro.

Decidimos que o método da consulta deve ser o método adotado para lidar com quaisquer outras questões que possam afetar nossos dois países, e estamos determinados a persistir em nossos esforços para remover os possíveis pontos de divergência e assim contribuir para assegurar a paz na Europa.”

No Romance, Hartmann consegue entregar a Chamberlain na noite do Acordo de Munique um documento em que Hitler se mostrava disposto a conquistar novos territórios e anexá-los a Alemanha, alegando necessidade de “espaços vitais” para seu povo, e não a perpetuar a paz como dizia.

Em suma, Munique nos faz lembrar através do passado o que somos capazes de fazer e nos adverte sobre a importância de não voltarmos a cometer erros semelhantes no futuro.

Em cada “Heil Hitler”, em cada rua alemã, em cada reunião secreta o livro causa arrepios. Segundo Robert Harris, seu objetivo era dar vida ao passado. O escritor, membro da Royal Society of Literature, conseguiu o feito esplendorosamente. A narrativa é leve e tem um fluxo fácil de ser acompanhado, com capítulos divididos nos dias em que a “missão” acontece. Um esquema do parlamento inglês é apresentado no começo do livro para facilitar ainda mais a assimilação do leitor da descrição feita dos ambientes, em formato de planta.

Com personagens complexas, cenários descritos minuciosamente e um rico e apavorante contexto histórico, Munique é digno de ser guardado na cabeceira da cama.

Por Lígia Andrade
 ligia.andradem@gmail.com

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