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O cotidiano atípico dos quadros

Por Natália Milena nataliamilena.0810@gmail.com   “Periferia, lugar de sonhos!” O discurso acima está presente em uma das obras que compõem a exposição A Zona Norte Conta Suas Histórias, que ficará aberta à visitação gratuita de 1° a 14 de abril, no Shopping Center Norte. A mostra é resultado do projeto Todo Lugar Tem uma História …

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Por Natália Milena

nataliamilena.0810@gmail.com

 

“Periferia, lugar de sonhos!”

O discurso acima está presente em uma das obras que compõem a exposição A Zona Norte Conta Suas Histórias, que ficará aberta à visitação gratuita de 1° a 14 de abril, no Shopping Center Norte. A mostra é resultado do projeto Todo Lugar Tem uma História para Contar, realizado pelo Museu da Pessoa – museu virtual e colaborativo -, juntamente com organizações sociais, educadores e alunos da rede pública de Ensino Fundamental da DRE Freguesia do Ó. O trabalho final pode ser identificado não só como fruto do objetivo de “preservação, ampliação e difusão da memória local”, mas como símbolo notório de representatividade.

[Imagem: Natália Milena]

Montagem da exposição

A exposição foi disposta de maneira dinâmica, de forma a atender ao diálogo existente entre as peças. De maneira geral, há dois andares de exibição das obras, com mais detalhes no primeiro. As crianças são atraídas pelas cores vivas e diversidade dos desenhos, sendo difícil encontrar uma que resista a sentar em meio às cores. Em uma onda de questionamento feito por elas sobre a origem dos desenhos, os pais contam duas ou três histórias das muitas que há no local. Não só as que de fato estão escritas, mas também as de inúmeras pessoas que poderiam assinar embaixo a autoria dos dizeres por viverem situações semelhantes em suas vidas.

[Imagem: Natália Milena]
Localizada em um dos corredores do shopping, a mostra não possui demarcação específica de espaço ou sinalização que possa orientar os interessados. Os próprios funcionários não sabem direito informar o local exato. Às pessoas que estão de passagem, dificilmente identificariam que se trata de uma exposição de arte sobre narrativas pessoais, e que se deparam com histórias que talvez não chegariam àquele ambiente de outra forma que não fosse através da arte.

Dentre a constante passagem de pessoas, ouvem-se comentários como “aqui também sou eu” e “tire uma foto”. Ao que de início parecia ser fruto da capacidade das obras gerarem proximidade e identificação com o público pelo conteúdo popular dos relatos, a exposição é surpreendida com a aparição da verdadeira Maria Rosa, retratada em um dos quadros.

Maria Rosa, professora de Ciências Naturais há 20 anos [Imagem: Natália Milena]

Além do visível

Dentro de um enclave fortificado, a presença de uma exposição deste tipo  carrega a responsabilidade de ecoar a voz significativa de uma classe em lugares que, em geral, é silenciada e esquecida: a cidade também é da periferia. Ainda que o shopping e outros estabelecimentos, como centros de lazer, tenham como público alvo pessoas com poder aquisitivo relativamente alto, a cidade também é das Marias, dos Lucidos, das Lenens e das Lanas. A cidade é de cada um que viveu sua infância na roça, que ralou para conquistar cada passo de sua trajetória e que viveu momentos históricos e memoráveis para si. A arte é de cada pessoa retratada e pertence a cada um dos citados. Sem ter como requisito o poder aquisitivo, possibilita que sejam superadas as barreiras da distância geográfica e da renda, para que o público mais diverso chegue a todos os cantos da cidade. Para que ganhem voz.

E suas vozes estão lá.

[Imagem: Natália Milena]
De acordo com a pesquisa Viver em São Paulo: Cultura na Cidade, publicada na última terça-feira, dia 09, pela organização Rede Nossa São Paulo, em parceria com o Ibope Inteligência , 28% dos entrevistados – cerca de 2,7 milhões de pessoas – não frequentaram nenhuma atividade cultural listada pelo estudo no último ano. Tal porcentagem refere-se a um ” grupo composto por pessoas mais velhas, mais pobres, menos escolarizadas e autodeclaradas pretas e pardas”.

Em matéria publicada no jornal El País, o coordenador da organização, Américo Sampaio, vai além, e relata que a dificuldade de acesso a atividades culturais está relacionada a um maior índice de violência: “Onde há aparato cultural estruturado, ocorrem debates mais amplos sobre problemas sociais como desigualdade, racismo ou abuso policial”. Sampaio reitera a importância  das políticas de investimento direto nos coletivos da periferia, que “têm um potencial gigantesco: educacional, social e de promover conexão das pessoas com o bairro, gerando renda, inclusive. Esse é o papel do poder público, criar essa movimentação local”. 

Tendo como exemplo a Lei Rouanet, principal mecanismo de estímulo cultural no Brasil, apesar das inúmeras críticas recebidas recentemente, ela “é instrumento legal fundamental para a promoção da cultura brasileira (…) em áreas e segmentos e regiões que não teriam acesso aos recursos do mercado sem [sua] existência”, corrobora o relator Domingos Sávio (PSDB – MG), no documento de conclusão da CPI sobre a lei, publicado em 27 de abril de 2017.

Evidencia-se a importância de descentralizar os eventos culturais, expandindo, cada vez mais, seu potencial social para um público maior e mais diverso. Políticas públicas de incentivo à cultura tornam-se extremamente necessárias diante de um cenário que elucida preços acessíveis, proximidade de casa, acessibilidade e locomoção como os principais elementos de estímulo, para que cada vez mais pessoas participem das atividades promovidas. Só assim a arte deixará de ser instrumento exclusivo de uma classe, para então atender ao que faz de melhor: interpretar o habitual como um convite ao encoberto.

 

 

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