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Onde está o espaço delas?

Por Dimítria Coutinho Hoje foi lançado o Fifa 16 e a novidade do game é que ele contará com equipes femininas. O que deveria ser um avanço no combate ao machismo no esporte, acabou se tornando mais um alvo de críticas dos internautas. Muitos comentários ofensivos surgiram nas redes sociais, mais uma vez tentando inferiorizar a …

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Por Dimítria Coutinho

(Imagens: Reprodução)

Hoje foi lançado o Fifa 16 e a novidade do game é que ele contará com equipes femininas. O que deveria ser um avanço no combate ao machismo no esporte, acabou se tornando mais um alvo de críticas dos internautas. Muitos comentários ofensivos surgiram nas redes sociais, mais uma vez tentando inferiorizar a figura feminina no universo desportivo.

Exemplos de posts machistas que surgiram no Twitter após a divulgação do lançamento do Fifa 16. (Imagens: Reprodução/Twitter)

Essa, infelizmente, não é a primeira vez que atitudes machistas são comuns no mundo esportivo. Isso, na verdade, vem de um passado de repressão ao esporte praticado por mulheres. Durante a ditadura brasileira, alguns esportes femininos foram proibidos de serem praticados. A lei, que durou de 1965 até 1979, impedia a prática de lutas, futebol (de campo, salão e praia), polo aquático, polo, rúgbi, halterofilismo e baseball pelas mulheres.

Giovana Capucim e Silva, formada em História pela Universidade de São Paulo (USP), dedicou sua pesquisa de mestrado acerca dessa proibição, sobretudo relacionando como a imprensa paulista tratava o futebol feminino no período. Ela conta que as legislações da época traziam a informação de que esses esportes eram “incompatíveis com as condições da natureza feminina”, e Giovana acredita que isso provém de duas razões: “a ideia de que o lugar da mulher é o lar, cuidando da família, da casa e do marido, além de um discurso científico que circulava na época que defendia que as mulheres não teriam pleno controle sobre seu corpo, sendo vítimas das suas emoções. Assim, entendia-se que os homens, que ocupavam as carreiras profissionais de elite, teriam a obrigação de pensar e legislar sobre o corpo feminino”.

A imprensa da época tratava, de maneira geral, o esporte feminino como entretenimento, um evento quase que circense. A pesquisadora ainda conta que eram comuns publicações que continham charges, chacotas, textos ou montagens que ridicularizavam o futebol praticado pelas mulheres. Outra prática presente na imprensa da época e que perdura até hoje é o enaltecimento da beleza feminina, mais do que sua performance atlética.

A maneira como a mulher esportista é vista na imprensa, porém, é apenas uma das bases que sustentam o machismo no esporte por tanto tempo. É possível observar, facilmente, diversos fatores que firmam esse preconceito. O salário, os prêmios, a visibilidade e a estrutura são alguns desses elementos. A polêmica recente do salário de Ronda Rousey ser equivalente a um terço do salário de um lutador masculino de qualidade similar vem para exemplificar uma dessas questões, além de muitos outros casos.

Ronda Rousey, em uma luta contra Bethe Correia. (Imagem: Getty)

Para Giovana, a questão da estrutura provém de má vontade institucional. “A CBF, por exemplo, parece se esforçar para que o futebol feminino não vingue no Brasil. A FIFA obrigou a entidade a investir parte do dinheiro arrecadado com a Copa no feminino. No entanto, tudo o que foi feito até agora foi a criação de uma seleção permanente. A intenção é criar uma seleção forte, que carrega o nome da CBF no exterior, mas esvazia os clubes brasileiros de suas principais atletas, enfraquecendo ainda mais os torneios nacionais e não dando qualquer contrapartida ou incentivo para o investimento nas categorias de base, que é um dos grandes problemas para o desenvolvimento da modalidade”, conta.

Para a pesquisadora, o machismo no esporte provém do machismo na sociedade e a mudança só vai acontecer quando atitudes vierem de todos os lados. “ O combate ao machismo, misoginia e homofobia no esporte começa pelo tratamento igualitário dado a todos os homens e mulheres, em todos os aspectos. Para uma completa mudança é preciso que diversas instituições tomem parte deste processo: os meios de comunicação, as instituições esportivas, o governo, os patrocinadores, clubes, profissionais, enfim, até os torcedores”, reflete Giovana. Ela acredita, ainda, que o esporte não é e nunca foi uma prioridade na luta do movimento feminista, apesar da sua grande importância na sociedade.

Bia Figueiredo enfrentou um ambiente bastante machista para alcançar o sucesso no automobilismo. (Imagem: Rafael Hupsel/Agência Istoé)

Enquanto uma atitude geral não for tomada, a sociedade continuará a presenciar e achar natural casos dentro e fora dos campos, das quadras e dos ginásios; bandeirinhas de futebol continuarão a ser consideradas musas, mulheres no automobilismo continuarão a ser minoria, lutadoras continuarão a ser consideradas homossexuais e jornalistas esportivas continuarão a ser lembradas pelo “corpão” e não pelo trabalho.

Do lado de lá
De casos de machismo, infelizmente, o mundo esportivo está cheio. Mas não são só mulheres que praticam esportes ou estão relacionadas diretamente com o universo desportivo que sofrem esse tipo de preconceito. As torcedoras também são atingidas, e muito.

Geralmente, mulheres que acompanham esportes masculinos são acusadas de estarem fazendo isso apenas para observar os homens que estão em campo ou quadra, além de ouvirem diversas perguntas para comprovarem que realmente entendem o que está acontecendo na partida.

Mariana Possebon, espectadora assídua de diversos esportes, conta a reação que as pessoas tem quando ela comenta que gosta de acompanhar as competições. “Se eu falar pra uma mulher, geralmente elas acham estranho, olham meio torto e ficam indignadas. Se for para um homem, eu geralmente ouço que eu não entendo nada de esportes, que com certeza eu finjo que gosto pra ver a aparência bonita dos caras, geralmente comentários bem machistas”, conta a torcedora. Além disso, comentários machistas são o que não faltam. “Já me perguntaram, em uma partida de futebol, se eu sabia o porquê de ninguém passar a bola pro ‘cara de uniforme diferente’ (no caso, o juiz), como se eu fosse uma completa estúpida”, lembra Mariana.

Outro aspecto que geralmente passa como natural mas que é machista é o fato das pessoas geralmente associarem a torcedora mulher a algum torcedor homem da família. É muito comum para uma mulher ser perguntada se ela torce para determinado time porque seu pai, irmão, marido ou qualquer homem relacionado a ela também o faz. É como se uma mulher fosse incapaz de fazer escolhas próprias quando o assunto é esporte.

Assim como nos esportes que foram proibidos durante a ditadura, o preconceito contra as torcedoras também parece ser seleto em relação às modalidades. As amantes de esportes considerados “incompatíveis com as condições da natureza feminina” pela legislação da época são as que mais ouvem comentários machistas foram de campo ou quadra.

“Acho que, socialmente falando, ocorre uma diferença entre esportes que são ‘normais’ para mulheres praticarem e outros que não. Isso se reflete com certeza na hora da torcida. Se a minha paixão fosse assistir patinação no gelo, que é mais praticado por mulheres, não haveria questionamentos ou comentários maldosos. Porém, não é só no futebol que o machismo acontece. Esportes como vôlei, tênis, handball e basquete (que também acompanho) são alvos de comentários bem pejorativos e degradantes para a torcedora mulher. Acho que é uma coisa principalmente dos esportes corpo a corpo”, reflete Mariana.

De maneira geral, a mulher – tanto a atleta como a torcedora – é mais aceita quando o esporte é mais delicado, como a patinação, a ginástica ou a dança. É o velho pensamento de que o sexo feminino é o sexo frágil e que mulheres não estão aptas a realizarem atividades que exijam força, estratégia e contato. Mas nossas campeãs estão aí para mostrarem o contrário. Só resta à sociedade aceitá-las, aplaudir e lutar por mais espaço feminino no esporte.

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