Seguindo o exemplo de Viva: A Vida É Uma Festa (Coco, 2017) e Moana: Um Mar de Aventuras (Moana, 2016), A Caminho da Lua (Over the Moon, 2020), dirigido por Glen Keane, empresta lendas de mitologias menos familiares ao Ocidente para criar uma aventura musical para toda a família.
O longa animado não perde tempo em nos introduzir à lenda de Chang’e, a deusa da Lua na mitologia chinesa. Segundo a lenda, o arqueiro Houyi recebeu duas pílulas da imortalidade como recompensa por ter matado nove dos dez sóis que queimavam a terra. Houyi então deu ambos elixires a sua esposa, Chang’e, para que os guardasse.
Um dia, o aprendiz de Houyi invadiu a casa do casal enquanto o arqueiro estava fora para roubar as pílulas. Em vez de entregá-las, Chang’e bebeu ambas as poções. Com a imortalidade, ela foi forçada a abandonar a terra e seu amado. Desde então, ela vive solitária na Lua, tendo apenas o Coelho de Jade como companhia.
Esta é a história com a qual Fei Fei (Cathy Ang), protagonista do filme, é obcecada, sempre pedindo para que sua mãe (Ruthie Ann Miles) a conte novamente. A lenda de Chang’e tem grande importância na família da garota, e não apenas porque os bolinhos da lua vendem mais durante o Festival da Lua. Provando que, apesar de ser da Netflix, a história de Fei Fei tem pinta de Disney-Pixar, sua mãe logo adoece e morre, mas não antes de lhe deixar um filhote de coelho como companhia.
Quatro anos se passam e Fei Fei é uma jovem engenhosa que divide suas paixões entre Chang’e, física e bolinhos da lua. Um novo festival se aproxima, mas, ao invés de trazer boas memórias de sua mãe, a garota tem seu mundo abalado quando seu pai (John Cho) a apresenta sua nova “amiga”, Zhong Ai-Yi (Sandra Oh), e seu filho de 8 anos, Chin (Robert G. Chiu).
É a gota d’água. Fei Fei não pode deixar com que seu pai se case com essa mulher… Nas histórias, o amor sempre é eterno e se deve honrá-lo esperando eternamente pelo dia em que as caras metades estarão unidas novamente. Como o pai pôde esquecer de sua mãe assim? Se apenas ela conseguir provar que a lenda de Chang’e é real, ele seguirá o exemplo da deusa e a vida dos dois voltará a ser do jeito que era quando sua mãe estava viva.
Seguindo essa lógica, Fei Fei começa planejar e construir um foguete que levará ela e Bungee, sua coelha, até a Lua. Uma vez lá, bastará tirar uma selfie com a deusa e todos os seus problemas estarão resolvidos!
Além da animação incrível e das músicas originais dignas de replay, A Caminho da Lua traz uma mensagem tocante sobre luto e a importância de seguir em frente, aceitar que algo já não é como era antes e estar pronto para lidar com novas experiências. O filme da Netflix consegue passar essa mensagem sem diminuir a dor da perda. A relutância de Fei Fei em aceitar novas pessoas em sua família após a morte de sua mãe pode ser sentida em todas as pessoas que perderam um ente querido.
Junte todos esses fatores com o incrível passo que a obra dá em relação à representação asiática na mídia à frente e por trás das câmeras, e podemos estar diante de um futuro indicado ao Oscar de melhor animação.
A indicação por melhor canção original também não seria uma surpresa: de On The Moon Above até Ultraluminary, todas as músicas tem lugar e peso na história, sem deixar o espectador com a sensação de que a história tenha pausado para a música. Isso quase acontece com Hey Boy, mas Chin não deixa a bola cair, rebate e marca ponto.
Tudo isso não significa que A Caminho da Lua é perfeito. Certo personagem introduzido na segundo metade do filme não pode evitar sua semelhança com os porgs de Star Wars e com a salamandra mágica de Frozen 2: uma criatura que oscila entre o fofo e o esquisito e cujo propósito na trama se justifica em uma cena que facilmente poderia ser transferida para outro personagem com peso maior no arco da protagonista.
Ambos os personagens mencionados parecem terem sido criados apenas para a venda de brinquedos, sendo então inseridos na história de qualquer jeito para justificar sua existência. Sem grandes surpresas, a boneca deste personagem de A Caminho da Lua está sendo vendida no site da Mattel por quase dez dólares com a descrição: “este boneco de pelúcia está sempre procurando carinho e amizade – assim como seu personagem no filme!”.
No geral, é um filme divertido e emocionante que consegue cativar mesmo os desinteressados e desinformados sobre a cultura chinesa através de sua mensagem universal – e músicas chiclete.
O longa já está disponível para todos os assinantes da Netflix. Confira o trailer:
*Imagem de capa: Divulgação/Netflix