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‘Alien’: a narrativa do Oitavo Passageiro e seu espelho com a Humanidade

Ao recontar a história dos filmes, o livro aborda discussões sobre a maldade e traz descrições científicas que contribuem para a sensação de realidade da ficção

Por Alice de Souza Silva (alicesouza@usp.br)

O que você faria ao entrar em contato com uma forma de vida totalmente desconhecida? É com essa pergunta que o autor Alan Dean Foster (re)conta a história de Alien, tão presente no imaginário popular por conta da quadrilogia de filmes que carregam o mesmo nome, e que levou o gênero do terror e ficção científica ao gosto popular. Publicado no Brasil pela Editora Aleph, o livro é uma novelização do primeiro filme, de modo que temos uma inversão da lógica livro-filme comum e se torna impossível definir qual o melhor.

Alan, que também foi o responsável pela novelização de outras franquias como Star Wars e Transformers, aprofunda no livro a descrição e o psicológico dos personagens, inclui cenas que não fazem parte do filme e, como era de se esperar, traz a magia das telas para a versão escrita, para que os fãs possam mergulhar novamente neste universo tão estranho e ao mesmo tempo tão comum a todos. Afinal, mesmo quem nunca viu os filmes conhece algumas de suas cenas mais clássicas, como a do Alien encarando Ripley, a personagem de Sigourney Weaver.

A famosa atriz dos anos 1980, que inclusive alcançou o estrelato com o primeiro filme da franquia, aparece ainda em uma entrevista contida ao fim do livro, concedida na época de seu lançamento nos cinemas. Na conversa, Sigourney relembra como foi ser escalada para o papel principal e conta como foi trabalhar nos sets de filmagens por quatro meses. Ridley Scott, que dirigiu o primeiro filme e atualmente é um diretor consagrado, também conta, em entrevista disponível em sequência, como foi a construção desse mundo fantasioso, científico e futurista no qual o filme é ambientado.

Criar uma história – e um roteiro – do zero não é fácil. Mas adaptar uma narrativa tão bem conhecida para as páginas, contando com a perda de identidade que os personagens sofrem ao deixarem de possuir rostos famosos e com a tarefa árdua de transcrever um universo tão visual sem utilizar imagens, provavelmente é uma missão bem mais difícil. Aqui, Alan se destaca ao conseguir preencher as lacunas psicológicas que o filme possui, fazendo entender as motivações dos personagens humanos – e até não humanos.

Tudo começa com a apresentação da Nostromo, uma nave do tipo rebocadora projetada para cruzar o espaço buscando e levando cargas importantes para a Companhia. Assim como a nave de 2001 era comandada pelo computador HAL, a Nostromo é dirigida pela inteligência artificial Mãe, que se preocupa em manter a nave em rota e com o bem-estar de seus oito tripulantes, sete humanos e um gato. A equipe humana é composta pelo capitão Dallas, o sub-capitão Kane, a oficial Ripley, a navegadora Lambert, os engenheiros Parker e Brett e o oficial de ciências Ash. Por último, mas não menos importante, o bichano Jones é o responsável por lembrar a todos de sua humanidade, mesmo a anos-luz de distância da Terra.

Toda a linguagem utilizada pelo autor para descrever a Nostromo é bastante mecânica e científica, como se estivéssemos lendo um manual de instruções. Não é raro o autor se demorar em descrições específicas de equipamentos e controles da nave, utilizando verbos que mais parecem computadorizados do que humanos, demonstrando a artificialidade do ambiente em que os tripulantes se encontram após meses longe de casa. A ação começa quando Mãe capta um sinal estranho a todos, algo que se parece com um pedido de socorro vindo de um pequeno planeta desconhecido. De acordo com a política da Companhia, mesmo se tratando de uma nave cargueiro e pequena como a Nostromo, ao ouvir um sinal de socorro é necessário atender ao chamado e tentar salvar quem – ou o que – o emitiu.

Ao aterrissarem no planeta que parece desértico, Kane, Lambert e Dallas encontram a nave que originou o pedido de ajuda e começam a procurar seus tripulantes, sem sucesso. Não há ninguém, vivo ou morto, esperando para ser salvo. Apenas o subsolo da nave dá alguma pista: Kane encontra uma espécie de ovo nunca antes visto. Aqui, a curiosidade científica torna-se maior do que tudo. O que a descoberta de uma nova espécie poderia trazer, não só para a Companhia, mas para seus tripulantes? Fama, bônus recheados e avanços tecnológicos são apenas algumas das opções. Assim, Kane se aproxima do ovo, que por sua vez se metamorfoseia em uma criatura que entra por seus orifícios e fica alojada em seu corpo.

Ao voltarem para a nave, ignorando todos os protocolos de quarentena e isolamento indicados pelos manuais da Companhia quando em contato com outras formas de vida, os três exploradores, juntamente com o resto da equipe, colocam Kane sob a supervisão do médico-computador de bordo. E qual a surpresa ao descobrirem que esta forma de vida, este Alien, apesar de estar dentro de Kane, não está fazendo-o mal algum. Todos os sinais vitais de Kane estão bons e a criatura não parece estar o prejudicando. Com poucos homens e recursos a bordo, o que fazer nesta situação? Afinal, enquanto o Alien não estiver machucando Kane, por que deveriam fazer algo?

Tudo muda quando a criatura começa a sair do corpo imóvel do capitão. Em uma das cenas mais clássicas do cinema moderno, a descrição do Alien abrindo um buraco no abdome de Kane não necessita de maiores detalhes. É nesse momento que todos percebem a real força da estranha criatura, e de como deveriam ter se preocupado com ela desde o início. Cada um dos seis sobreviventes possui agora a missão de escolher como agir frente a um inimigo jamais visto e que está a bordo da mesma Nostromo. Qualquer ação tomada, ou não tomada, pode definir o futuro de todos.

Recriaçaõ do Alien para o cinema.
Recriação de Alien para o cinema. [Imagem: Reprodução/ Unsplash]

Ao longo da leitura, vemos como a personalidade de cada tripulante determina suas ações. Desde a pose de comandante de Dallas, passando pelo jeito científico de Ash e pela postura debochada de Lambert, cada um deles enxerga uma forma diferente de lidar com o oitavo passageiro. Saber qual deles se sairá melhor no final é o fio que une toda a narrativa e leva o leitor a explorar as páginas do roteiro adaptado. Será que eles deveriam ter deixado a criatura entrar a bordo? Ripley, que foi contra a ideia desde o início e se mostra a pessoa mais prática de todas, diz que não. Mas a curiosidade científica de Ash, que salienta a importância de se conhecer essa nova espécie, diz o contrário.

Quem estava certo, descobrimos apenas no final, seja com o virar da última página ou com as luzes do cinema se apagando. Da mesma forma como acontece em uma pandemia, em que cada ação individual impacta não apenas aquela pessoa, mas também os outros ao redor, a convivência com um ser mais rápido, forte e mortal do que os seres humanos define o futuro daqueles que lutam contra ele. A pergunta que fica é: o Alien é mau? Alguma criatura, até mesmo humana, é, essencialmente, má? Ou apenas está seguindo o seu instinto de sobrevivência ou o que foi programado para fazer? A escolha de como agir nas duas situações cabe a cada um, mas os resultados impactam a todos.

E dentro da equipe, temos certeza de que todos são plenamente confiáveis? O que aconteceria se, como o HAL, de 2001, Mãe tivesse segredos obscuros que uma parte da tripulação não sabe? A Nostromo ganha vida própria, com corredores escuros e comportas sendo abertas e fechadas ao prazer de quem aperta os botões. Além do Alien, alguma outra criatura dentro da nave deveria ser digna de preocupação? Essa e outras perguntas são respondidas de forma a não deixar dúvidas no livro, que traz a pitada de horror cósmico ao combate com o desconhecido, tão comum à nossa sociedade nos tempos atuais. A vida imita a arte, e só saberemos o quanto a prudência ou o ataque são importantes ao final desta narrativa épica. Seja no filme ou, principalmente, no livro, é a experiência de adentrar neste universo da ficção científica tão real que faz tudo valer a pena.

*Imagem de capa: Reprodução/ Editora Aleph

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