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Por que literatura, música e teatro nos emocionam?

Você já se perguntou por que chorava com uma música? Por que sentia a mesma alegria da personagem do livro? A literatura, a música, o teatro e as emoções se conectam de diversas formas e permitem explorar as mais diferentes experiências

Por Gabriele da Luz Mello (gabrielel.mello@usp.br)

A arte é uma das manifestações humanas mais antigas, utilizada e reconhecida desde os primórdios da humanidade, como é o caso de pinturas rupestres. Ao longo do tempo, criamos diferentes formas de fazer e apreciar artes. No entanto, a arte está sempre comunicando e, dependendo da cultura, época ou de cada indivíduo, ela nos apresenta algo.

O nosso corpo possui uma percepção não apenas psicológica, mas fisiológica sobre ela. Mauro Muszkat, em seu ensaio Música e Neurodesenvolvimento: em busca de uma poética musical inclusiva, explica que ao recebermos sinais físicos de uma música, como é o caso do estudo, ocorrem alterações no nosso estado emocional, que afetam atitudes e sentimentos, como a expectativa e a tensão. Batimento cardíaco, frequência respiratória e ritmos elétricos cerebrais também são afetados. Mas cada forma de arte pode nos influenciar (e ao nosso cérebro) de uma forma diferente. 

O que são as emoções e de onde elas vêm?

Apesar de a definição de emoção parecer ser fácil ou óbvia, a psicologia tem muitas teorias para tentar explicá-la. O psicólogo e filósofo Alexandre Cavallieri conceitua emoção como “tudo aquilo que a gente consegue sentir de forma que mude nosso estado normal. Existe uma normalidade, então temos uma sensação e a partir dessa sensação, tem-se as emoções”. Essa definição é um senso comum na psicologia, como mostra o artigo Psicologia das emoções: uma proposta integrativa para compreender a expressão emocional, de Fabiano Koich Miguel, publicado em 2015. 

No cérebro, existem algumas partes relacionadas às emoções. “O hipotálamo é uma delas, mas existem várias outras, a parte [pré-]frontal do cérebro. O sistema límbico provoca emoções por meio da arte”, explica Alexandre. Além dessas regiões, ainda estão envolvidas com as emoções a amígdala, septo e cerebelo, entre outras.

Imagem esquemática do sistema límbico e seus órgãos no cérebro, que provocam emoções na arte.
Imagem do cérebro com destaque para as estruturas que formam o sistema límbico, uma região do cérebro que é responsável pelas emoções que sentimos e pelas respostas que nosso corpo tem a elas. Pesquisas indicam que ele também pode se relacionar com o processo de ensino e aprendizagem. [Imagem: Reprodução/ Wikimedia Blausen Blaus com texto modificado para português]

A Neurobiologia das Emoções estuda a função de cada componente do cérebro e sua relação com as diferentes emoções. É uma área muito explorada na psicologia e fisiologia. Cada região tem algumas funções, como a amígdala que se relaciona a estímulos de recompensa e o septo a raiva.

A música e os processos neurológicos que levam à emoção

A música é uma das manifestações culturais mais significativas emocionalmente, por ativar tanto sentimentos quanto lembranças, já que ela acompanha os mais diversos momentos importantes das nossas vidas, desde um evento de tristeza até grandes festas e ocasiões especiais. Para a pesquisadora Sílvia Nassif, existe um nível individual na apreensão emotiva da música, que envolve experiências pessoais, e um nível coletivo, que abrange uma identidade de grupo, que ouça afetivamente um tipo de música. 

Para que a música nos emocione, o primeiro passo é que ela chegue aos tímpanos, que inicia uma cadeia de “entendimento” da música pelo cérebro. Após receber a canção, regiões periféricas do cérebro começam a extrair características dela, decompondo-a em elementos como timbre, intensidade  e altura. Essas informações seguem para outras partes do cérebro, para se obter uma percepção completa dela.

Esse processo é bastante complicado para o cérebro e a atividade musical envolve quase todas as regiões do órgão. Mas, quando nos emocionamos, ocorre a ativação de uma região do cerebelo, que é responsável pela liberação de dopamina e noradrenalina, que junto a serotonina e adrenalina controlam o humor, depressão e o sono. A dopamina é um neurotransmissor, ou seja, um mensageiro químico do nosso sistema nervoso, que sinaliza, entre outras coisas, a recompensa e a motivação. Já a norepinefrina atua em momentos de estresse. Além disso, a amígdala também é ativada, levando ao estímulo de recompensa, assim como a dopamina.

Literatura: onde nos sentimos como o personagem

Existe um senso comum de que, quando lemos um livro, vivemos, temporariamente, uma nova vida. O neurocientista estadunidense Gregory Berns desenvolveu um artigo buscando descobrir como uma história chega ao nosso cérebro e o que faz com ele. Utilizando ressonâncias e o romance Pompeia, de Robert Harris, ele chegou à conclusão de que houve maior conectividade no sulco central do cérebro, também conhecido como região sensório-motora.

E o que isso quer dizer? O estudo demonstrou que ao lermos, ativamos no cérebro uma região relacionada a sensações físicas do corpo e sistemas de movimento. É como pensar em correr: nosso cérebro poderia ativar neurônios — as células do cérebro — associadas a correr. Ou seja, as mudanças neurais encontradas no estudo sugerem que a leitura de um romance pode transportar o leitor para o corpo do protagonista do livro!

Além disso, o estudo mostrou ativação de outras regiões cerebrais, como o hipocampo e cerebelo, que, apesar de possuírem diversas funções, também se relacionam às emoções. 

Jéssica Sanz, autora dos livros Maya Fujita, DOMINUS, Purple e, seu mais recente lançamento, Quem tem razão?, contou que, em seu processo de escrita, ela aprendeu a descrever as ações de seus personagens a partir da construção de um sentimento para fortalecer a expressão daquele sentimento, para além de apenas descrevê-los. Indo no caminho contrário, ela ainda completa que os sentimentos dos personagens também vêm do autor: “o difícil é descrever emoções que a gente não viveu. Por isso que quanto mais experiências, quanto mais a gente vive, mais oportunidades nós temos, mais opções do que colocar.”

Teatro: juntando outras interações e o efeito do coletivo

O teatro e outras formas de arte que incluem apresentações ao vivo — como a dança e a ópera — envolvem mais fatores que podem nos causar diferentes emoções. O primeiro deles é o fato de o ser humano ser um ser social. Nós ansiamos por interação social, e ela nos guia por meio desse contato com a arte. Ou seja, o nosso cérebro gosta de compartilhar os sentimentos com quem nos cerca. “Quando as pessoas estão sentadas ali para me ver, eu vejo as pessoas em relação ao que eu tenho que transmitir. Então, acho que a atuação dos atores é completamente diferente com a plateia. A plateia sente. E, quando a plateia sente, você também muda”, conta a atriz de musical Bianca Lopes, em relação ao sentimento entre atores e plateia durante uma apresentação. 

A partir de então, podemos encarar assistir uma apresentação como o que acontece na literatura: nos conectamos com a história e nos colocamos no lugar dos personagens, também ativando o sistema sensório-motor. Por isso, quando vemos alguém saltando numa apresentação, também sentimos um frio na barriga. O nosso cérebro mapeia aquele movimento e os neurônios preparam-se, como se fôssemos realizá-lo.

Um ponto relevante é que, muitas vezes, essas apresentações também utilizam a música que, consequentemente, ativa circuitos neurais de memória e emoção. “Eu entendo que sim. Você escuta a banda e os atores que estão cantando e é um outro tipo de sensação. Acho que é como quando você vai ao carnaval e você escuta a bateria. Quando você vê pela TV [o desfile das escolas de samba] é bonito mas você não sente. Quando você sente a bateria do chão vibrar, você escuta de perto e vê as pessoas. Eu acho que tem um outro sentimento, o teatro tem muito disso também”, relata Bianca, ao ser perguntada sobre a diferença que a música faz no teatro.

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