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10 anos de Neo Química Arena: “Bem-vindo ao hospício!”

Dia 10 de maio é comemorado o dia de inauguração do estádio que recebeu o jogo de abertura da Copa do Mundo de 2014 no Brasil
Por Guilherme Bianchi (guifavaro240306@usp.br) e Rafael Dourador (rafa.dourador@usp.br)

Há exatamente uma década, o Sport Club Corinthians Paulista realizava a inauguração do seu estádio com uma partida entre ídolos de diferentes gerações do time. O primeiro gol da Neo Química Arena — na época, Arena Corinthians — foi marcado de pênalti por Rivellino, craque alvinegro entre os anos 1960 e 1970. O evento envolveu mais de cem jogadores e ex-jogadores do Timão.

Com capacidade para quase 50 mil torcedores, a grandiosidade do estádio é marcada não só por uma história de planejamento e superação de desafios que impactam, até os dias atuais, o orçamento do clube, mas também por transformações na relação dos atletas com a torcida e na representatividade da categoria feminina.

Do anúncio à estreia do estádio

A construção de um estádio próprio do Corinthians era um projeto discutido pelo clube desde a década de 1960. Foi apenas em 2010 — ano centenário da instituição — que essa ideia saiu do papel e foi anunciada por Andrés Sanchez, então presidente do time pela chapa Renovação e Transparência. A região escolhida foi o bairro de Itaquera, na zona leste da capital paulista.

A torcida criou uma grande expectativa sobre o anúncio. O conceito artístico do arquiteto Aníbal Coutinho rendeu a ele e ao clube o prêmio de melhor projeto arquitetônico do país no VIII Grande Prêmio de Arquitetura Corporativa.

O Estádio corinthiano possui setores Norte, Sul, Leste e Oeste. [Imagem:Reprodução/Instagram: @neoquimicaarena]

As obras foram iniciadas em maio de 2011 após um acordo firmado com a antiga construtora Odebrecht (atualmente parte da holding Novonor). À época, um depoimento do empresário e ex-presidente da empreiteira, Marcelo Odebrecht, em delação premiada na Operação Lava Jato, apontava que Luiz Inácio Lula da Silva, presidente da República em 2010, pressionou a empresa a não desistir da construção. Esse fato contribuiu para o surgimento de suspeitas de que o dinheiro público estava sendo utilizado para a construção do estádio. Segundo apuração do GE, não houve uso de verbas públicas diretamente para esse fim — assim como outros clubes que receberam a Copa de 2014, o Corinthians conseguiu um empréstimo de R$ 400 milhões pela Caixa Econômica Federal e pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

O prejuízo financeiro que a obra proporcionaria à construtora era o principal argumento da Odebrecht para uma possível desistência. O orçamento original previa gastos de R$ 820 milhões, porém, em 2014, Andrés Sanchez já considerava um aumento de, pelo menos, R$ 100 milhões nas despesas totais. Em janeiro de 2017, o portal Meu Timão confirmou com fontes internas do clube que o custo era de R$ 1,385 bilhão. Em agosto do mesmo ano, uma auditoria reportou à diretoria corinthiana que a Odebrecht deixou de realizar R$ 151,4 milhões em obras no estádio.

Grande parte desse encarecimento ocorreu por conta da Copa do Mundo de 2014, em que o estádio corinthiano foi escolhido como sede. Isso provocou a necessidade da construção de estruturas complementares e temporárias para adequar a arena aos requisitos da FIFA (Federação Internacional de Futebol).

Obras no estádio levaram cerca de 3 anos para serem concluídas. [Imagem: Carlos Humberto da Costa/Acervo Pessoal]

Em resposta às denúncias sobre o uso de dinheiro público, o Governo do Estado e a Prefeitura de São Paulo divulgaram uma nota na qual descartavam o uso desses recursos para a construção do novo estádio. Na prática, o que ocorreu foi uma ampla isenção de impostos para a obra, pois, em 2011, o prefeito de São Paulo na época, Gilberto Kassab, sancionou uma lei que concedeu ao Corinthians R$ 450 milhões em incentivo fiscal.

Além das dificuldades financeiras, as mortes de três funcionários durante as obras prolongaram o prazo de entrega da arena, inicialmente previsto para dezembro de 2013. Um mês antes, uma parte da estrutura metálica do estádio desabou, matando dois operários e destruindo parte do estádio em construção. Quatro meses depois, o operário da empresa WDS Construções, Fábio Hamilton da Cruz, não resistiu após uma queda de oito metros enquanto instalava as estruturas temporárias nas arquibancadas.

Apesar da data comemorativa no dia 10 de maio — dia no qual o clube alvinegro abriu as portas ao seu torcedor pela primeira vez, em uma partida comemorativa —, em 15 de abril de 2014, a Arena foi entregue simbolicamente ao Corinthians com 98% das obras concluídas. Finalmente, dia 18 de maio daquele ano, o clube fez sua estreia no campo, sendo superado pela equipe do Figueirense no Campeonato Brasileiro.

A relação com o 12° jogador

A “Fiel Torcida”, como é conhecida a massa corinthiana pelo seu amor incondicional ao clube, já viveu muitas celebrações na Neo Química Arena. As histórias vivenciadas na casa alvinegra solidificaram a identidade do “bando de loucos” nas arquibancadas como uma das maiores torcidas do país. O Corinthians tem seu estádio como “carta na manga” para os mais difíceis confrontos, em que a voz alvinegra move o time paulista e coroa resultados. Desde sua inauguração, são 336 partidas, 195 vitórias, 93 empates e 48 derrotas, em Itaquera.

Rodrigo da Silva, torcedor do Corinthians há mais de 30 anos e membro da organizada Gaviões da Fiel, contou ao Arquibancada sua experiência na torcida do povo: “É uma coisa inexplicável! Você entra no ônibus e acaba a classe social. Ali o rico fica pobre, o pobre fica rico, nós estamos unidos, juntos na mesma batida. É ir para o estádio e torcer os 90 minutos pelo Corinthians. É o 12º jogador. É aquele ditado: ‘só quem é sabe o que é, só quem está ali entende a nossa força’”.

O Timão recebeu mais de 41 mil pagantes por jogo nos seis primeiros confrontos da temporada de 2024. [Imagem: Vito Santo/Acervo Pessoal]

Por outro lado, segundo Carlos Humberto da Costa, outro torcedor alvinegro frequente nas arquibancadas corinthianas e atuante nas obras de construção da Arena, a modernização do estádio refletiu na elevação dos preços dos ingressos e é causadora de elitização de parte da torcida: “Por torcida, eu preferia o Pacaembu. Por exemplo, no setor oeste parece que você está em uma ópera, os caras assistem os jogos sentados. A Arena elitizou o tipo de torcedor que vai. No Pacaembu era povão, você assistia o jogo de pé”. 

A partida de inauguração contra o Figueirense causou a primeira revolta nos torcedores alvinegros, quando o preço de alguns ingressos chegou a ser 350% maior do que o valor cobrado no Pacaembu. Desse modo, as torcidas organizadas marcam presença importante nas dependências do estádio em todos os jogos, utilizando protestos e manifestações como meio de serem ouvidas pelas autoridades e jogadores do clube.

Outra coisa que mudou, segundo Rodrigo, foi o comportamento do torcedor no momento dos confrontos: “Na Arena, muita gente deixa de acompanhar o jogo, para tirar foto, fazer vídeo. No Pacaembu era outra atmosfera, o pessoal mais focado no jogo. As pessoas novas, que não frequentam tanto, vão para o jogo pelas primeiras vezes, ficam impressionadas e tiram muitas fotos, muitos vídeos, no Pacaembu não existia tanto isso”. 

Mudanças no bairro de Itaquera

Copa do Mundo fez especulação imobiliária subir os preços dos imóveis [Imagem:Carlos Humberto da Costa/Acervo Pessoal]

Além da grande massa de torcedores, a Neo Química Arena provocou transformações nos arredores do estádio, especialmente por receber os jogos da Copa do Mundo de 2014. Na ocasião, a especulação imobiliária fez os preços dos imóveis subirem em média 40% dos valores.

A mobilidade e o transporte público também foram impactados na época. Segundo informação do jornal Terra, os cofres do Governo Estadual desembolsaram R$ 311 milhões em obras no entorno do estádio do time alvinegro, que incluía uma avenida de ligação entre a Nova Radial e a Avenida Itaquera, uma passagem na Radial Leste — trecho localizado em frente à estação de metrô Itaquera —, três corredores de ônibus e uma estação rodoviária. “O entorno [do estádio] ficou melhor quando fizeram o viaduto e melhoraram as avenidas”, comenta Carlos.

No entanto, alguns projetos saíram do papel muito tempo depois do previsto. O terminal rodoviário, por exemplo, teve suas obras interrompidas em 2018 e retomadas em 2021, quando a prefeitura conseguiu desbloquear fundos federais para continuar a construção.

A casa das minas

Referência nacional no futebol feminino de clubes, o Corinthians protagoniza na Neo Química Arena recordes na categoria. Em 2023, na final do Campeonato Brasileiro, o clube registrou o maior público presente em uma partida feminina de futebol de clubes no continente, somando 42.556 pessoas na Arena ao enfrentar a Ferroviária.

Vale ressaltar que, os cinco maiores públicos da modalidade no Brasil possuem presença da equipe paulista, sendo quatro deles em seu mando de campo:

  • 42.566 – Corinthians 2 x 1 Ferroviária, (Brasileirão 2023)
  • 41.070 – Corinthians 4 x 1 Internacional, (Brasileirão 2022)
  • 36.330 – Internacional 1 x 1 Corinthians, (Brasileirão 2022)
  • 30.077 – Corinthians 3 x 1 São Paulo, (Paulistão 2021)
  • 28.862 – Corinthians 3 x 0 São Paulo, (Paulistão 2019)

Final da Supercopa Feminina 2024 reuniu mais de 30 mil pessoas na Neo Química Arena [Imagem: Reprodução/Instagram: @corinthiansfutebolfeminino]

Venda dos ‘Naming Rights’ e a relevância econômica ao Corinthians

 A Neo Química Arena, além de representar a casa do “bando de loucos”, é também um grande alívio econômico ao clube. Nos primeiros minutos do dia 1º de setembro de 2020, aniversário de 110 anos do clube, o Corinthians anunciou a venda dos naming rights — direito sobre a propriedade de nomes — do estádio junto ao grupo farmacêutico Hypera Pharma. O acordo previa R$ 300 milhões aos cofres  corinthianos, com validade de 20 anos, podendo receber valores adicionais devido aos ajustes de mercado.

Hoje, o Time do Povo estampa o 4º maior valor anual de ‘naming rights’ em estádios brasileiros, arrecadando cerca de R$ 20 milhões por ano. Os impactos econômicos são visíveis, mas também destacam-se as pretensões sociais da companhia farmacêutica junto ao alcance do clube, que enxergam a união como uma forma de aproximar as pessoas e cuidar de quem vive ao redor da Arena. Um  exemplo é a campanha Sangue Corinthiano, apoiada pelo estádio, que visa impulsionar a doação de sangue e ocorre três vezes por ano na Neo Química Arena. A primeira edição de 2024 — a 42° da campanha —  ocorreu nos dias 19 e 20 de abril e arrecadou cerca de 600 bolsas sanguíneas.

O Corinthians arrecadou quase R$10 milhões em renda líquida com os jogos realizados na Neo Química Arena em 2023, válidos pelo Campeonato Paulista. [Imagem: Reprodução/Instagram: @neoquimicaarena]

Capa: Jornalismo Júnior – imagens: Cesar Fukuda Pizzocaro e Fernando Bueno

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