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50º Festival Sesc Melhores Filmes | ‘Que horas ela volta?’ ainda quebra paradigmas brasileiros

A construção cômica e dramática na obra de Anna Muylaert retrata uma segregação que ainda é atual, mesmo com uma década do lançamento
Por: Aline Fiori (alinefiori05@usp.br)

No Dia das Empregadas Domésticas (27), o filme Que horas ela volta? (2015) colabora para a denúncia dos abusos que estas profissionais podem sofrer. Estrelado por Regina Casé, o longa proporciona um horizonte para a luta pelos direitos na profissão e retrata, com  respeito, as contradições entre  as babás  e seus direitos trabalhistas, em pauta desde a aprovação da PEC das domésticas em 2012.

O filme constrói, pela direção e roteiro de Anna Muylaert (Mãe só há uma, Alvorada), uma composição com uma comédia sutil de tradição nacional junto a uma crônica de denúncia social. O longa traz uma marca de brasilidade para a narrativa e que contrasta Nordeste e Sudeste, os ricos e os pobres – a realidade vivida em um Brasil segregacionista.

A trama ganha vida com sua protagonista Val (Regina Casé), uma mulher nordestina que se muda para São Paulo para trabalhar como empregada doméstica para uma família de classe alta, na intenção de proporcionar uma vida melhor a sua família que ficou em Pernambuco. Os anos se passam, Val não volta para visitar sua família e, inconscientemente, se contenta com a vida que leva na casa de seus patrões. Considerada “quase da família” e tendo criado o filho único dos patrões, Val ainda come em uma mesa diferente, dorme em um quarto nos fundos da casa e veste uniformes para ser identificada como doméstica, como se não fizesse parte do todo. Sua vida, reduzida ao trabalho, não é vista como autônoma e merecedora de subjetividades.

Fabinho deitado no colo da babá, Val em Que Horas Ela Volta?
Val cumpre o papel maternal na vida de Fabinho, filho de seus patrões. [Imagem: Divulgação/Gullane]

Tudo isso muda quando, após anos sem contato, a filha de Val, Jéssica (Camila Márdila), telefona sua mãe a avisando que vai para São Paulo prestar vestibular e que ficaria com a mãe nesse período de tempo. Desde a chegada de Jéssica à casa dos patrões, a atuação de Camila nos permite sentir a personalidade forte da menina que não abaixa sua cabeça e questiona as estruturas estabelecidas em diversas situações como o fato da mãe morar na casa de seus patrões e a situação do seu quarto – elemento esse que mais se assemelha à uma dinâmica de casa grande e senzala. Jéssica ressalta a artificialidade daquela estrutura hierárquica e desestabiliza todos da casa.

Val e Jéssica na varanda da nova casa
Val e Jéssica juntas depois de anos de distância. [Imagem: Divulgação/Gullane]

O longa traz uma ambientação quase que cotidiana para o enredo da narrativa, com uma filmagem quase estática que traz consigo a ideia de imutabilidade da rotina vivida por Val, com uma atuação de Regina Casé com uma construção simples e cotidiana de sua personagem como se estivesse na mesma vida, cumprindo as mesmas tarefas há anos. Suas falas têm um caráter cômico que puxou risadas da sessão de cinema no 50º Festival Sesc Melhores Filmes e que trouxe uma simplicidade e humildade para a personagem. As atuações dos patrões, que ganham vida por Karine Teles e Lourenço Mutarelli, mesmo que sejam coadjuvantes da história principal, conseguem demonstrar bem a situação de ignorância vivida pelos mesmos, presos à convenção social de como as coisas são e devem permanecer, além da vilania transpassada pelo roteiro junto à atuação de Karine.

“Que horas ela volta?” é um filme com encenação e atuação que se complementam, desde diálogos e cenas mortas para aproximações e distanciamentos em grande parte nos cômodos da casa. O roteiro produzido se propõe a introduzir o público a uma realidade de desigualdade social e levá-los a refletir sobre, seja assimilando-se ou assimilando uma história, o que é feito de forma excelente por Anna exatamente pela ideia de cotidiano que faz com que essa assemelhação seja garantida. Os pequenos símbolos trabalhados na narrativa como o sorvete, o ato de sentar a mesa, o  jogo de xícaras dado de Val para sua patroa são inseridos como pequenos detalhes que com o correr da história sustentam a base da problematização. 

Val entrega kit de xícaras para sua patroa.
Na trama, Val se dedica em presentear sua patroa, mas permanece menosprezada. [Imagem: Divulgação/Gullane]

A cineasta Anna Muylaert afirmou, em entrevista para o UOL, que seu filme foi feito para quebrar estereótipos e fazer com que as pessoas debatam o tema. É possível ver que o desejo da diretora é cumprido. O filme rompe paradigmas e o público pode se identificar com a narrativa, questionando sistemas que são tão enraizados na cultura brasileira. É o retrato da vida real, que prevê possibilidades diante da reflexão.

Confira o trailer abaixo:

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