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Avistar: um chamado à preservação da vida

O 17º encontro brasileiro de observação de aves promoveu uma experiência única de conexão com a natureza
Gabriela Nangino (gabi.nangino@usp.br)
Vista dos estandes na feira Avistar
Feira do Avistar na manhã de domingo (19).
[Imagem: Acervo pessoal/Gabriela Nangino]

O Avistar é o maior encontro de observadores de aves da América Latina, que ocorre anualmente na capital paulista de forma gratuita. Em um misto de cultura e ciência cidadã, seu principal objetivo é celebrar as aves e despertar a sensibilidade dos visitantes para a diversidade da natureza — mas sempre ressaltando os riscos aos quais ela está exposta. 

O evento ocorreu dos dias 17 a 19 de maio, no Campus Butantã da Universidade de São Paulo (USP). Destacaram-se exposições e palestras pautadas pelos temas de conservação, ecoturismo, saúde e educação ambiental. Esse foi o primeiro evento de birdwatching (observação de aves) comprometido com o conceito de carbono neutro, em parceria com a Climatech Compensei.

O documentário Eu passarinho, produzido pela equipe do Terra da Gente, da Rede Globo, foi exibido no evento no sábado (18) para contar a história da observação de aves no Brasil. Em 2024, celebram-se 50 anos da prática no país, data que remete à criação do Clube de Observadores de Aves (COA) em Porto Alegre. O Encontro surgiu em 2006 e vem ocupando espaços cada vez maiores, chegando a receber 8 mil participantes. Hoje, uma iniciativa da EMBRATUR pretende promover o Brasil como destino global para essa atividade.

Diversas organizações não governamentais (ONGs), empresas de turismo sustentável e produtores de artesanato se reuniram para expor seus trabalhos e iniciativas em estandes que circundam a feira. Uma programação exclusiva para as crianças (AvistarKids) incluiu atividades como pinturas ao vivo e bingo com a temática de aves. 

Cinco auditórios abrigaram palestras de pesquisadores e representantes renomados no setor — essenciais para disseminar o conhecimento da avifauna brasileira e promover debates sobre o futuro do meio ambiente. Houve um foco especial para a participação feminina em pesquisas, ressaltando a importância da ciência inclusiva. Ocorreu também um congresso internacional que abrangeu simpósios e atividades de divulgação científica, com inscrições à parte.

Exposição de cartazes de apresentações no congresso Avistar
Exposição dos seminários do Congresso Avistar.
[Imagem: Acervo pessoal/Gabriela Nangino]

IBAMA

Rodrigo Agostinho, presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), realizou uma palestra na manhã de domingo (19) e trouxe dados sobre o tráfico de animais. Rodrigo discursou sobre as políticas promovidas pelo Instituto, como a proteção de recursos pesqueiros para combater a pesca ilegal, a fiscalização de recursos genéticos para enfrentar a biopirataria e o controle do tráfico de animais nas áreas de fronteira. Segundo o palestrante, essas iniciativas fazem com que muitas pessoas se regularizem.

Palestra de Rodrigo Agostinho, ao fundo, apresentando um slide, e plateia com cadeiras de plástico
Rodrigo Agostinho informou o público sobre as problemáticas do tráfico de animais atualmente.
[Imagem: Acervo pessoal/Gabriela Nangino]

Rodrigo explicou o funcionamento dos Centros de Triagem de Animais Silvestres (CETAS), que recebem animais por entrega voluntária, resgate ou oriundos de apreensão pela fiscalização. A meta é recuperar e soltar esses animais, ou encaminhá-los para empreendimentos de fauna. O programa conta com 130 áreas de soltura ao longo do território brasileiro, e dos 270 mil animais resgatados desde 2020, cerca de 80% sobreviveram.  

Outra iniciativa é o Programa de Conversão de Multas, através do qual sanções por infrações ambientais são transformadas em investimentos nos projetos de refaunação. Desde 2023, 326 conversões foram deferidas, totalizando mais de 20 milhões de reais para verbas ecológicas. O IBAMA também acompanhou 323 mil hectares de recuperação ambiental entre 2019 e 2023. Segundo o palestrante, os incêndios florestais são um tema imprescindível no cenário atual, devido ao agravamento do aquecimento global. “Não é só plantar sementes, nós temos que incluir os animais no nosso projeto”, ressalta Rodrigo.

Também existem cinco planos de ação vigentes para reverter o problema das espécies exóticas, ou seja, espécies inseridas artificialmente no ambiente, que prejudicam o funcionamento do ecossistema. De acordo com o presidente, todas essas mudanças defendidas pelo IBAMA só são possíveis através da educação. “Nós precisamos olhar para a sociedade para transformá-la. Além de todo o trabalho de controle e monitoramento, os órgãos têm que fazer uma educação ambiental transformadora. [..] As pessoas gostam de aves e acham que, por que gostam, têm que levar as aves para dentro de casa. Elas precisam aprender a sair de casa e ir ver as aves na natureza.”

Polo de Ecoturismo de São Paulo

Em um dos estandes da feira, ocorreu a divulgação do Polo de Ecoturismo de São Paulo, que ocupa cerca de 28% do território do município. O polo é subdividido em três distritos: Parelheiros, Marsilac e a Ilha do Bororé. Nesse circuito, existem áreas de preservação e parques naturais com as maiores concentrações de Mata Atlântica da área. Expositores de produtos orgânicos e artistas de ateliês da região contribuem para um planeta mais verde.

Mulher artesã expondo seus produtos em uma mesa no congresso Avistar
Artesãos expõem seus produtos na feira.
[Imagem: Acervo pessoal/Gabriela Nangino]

Luiz Cardoso administra a Casa da Girafa Ateliê e trouxe algumas de suas peças, como bolsas e colares feitos de material reutilizado. As bolsas são estampadas com figuras históricas que revolucionaram movimentos sociais e artísticos, como Frida Kahlo e Tarsila do Amaral. O artesão relata, em entrevista, que é muito importante minimizar os impactos ambientais da indústria de confecção.

A Casa, local principal de seu trabalho, localiza-se em Parelheiros. “Hoje em dia, através de uma iniciativa da Prefeitura, as pessoas podem conhecer a minha casa. Aqui é só um micro do que eu faço na casa inteira.” Ele conta que a casa tem uma história própria, e é feita com materiais reaproveitados que compõem ambientes exóticos e únicos. Luiz dá aulas aos grupos de visitantes sobre o reaproveitamento de materiais e traz reflexões sobre o descarte desnecessário de objetos e a necessidade de desconstruir padrões consumistas. 

OAMa

Outro estande de destaque é o do OAMa (Observatório de Aves da Mantiqueira). Fundado em 2018, o observatório tem foco no estudo das aves brasileiras e seus habitats, especialmente na Serra da Mantiqueira. Seu principal objetivo é preencher as lacunas no conhecimento ornitológico brasileiro. A organização promove um programa de comunicação denominado Ações Pró-Aves, que visa conscientizar a população de que, além das grandes ações antrópicas que devastam o ambiente, existem questões mais simples que afetam a sobrevivência dos pássaros. 

Afonso, expositor da ONG, explica um pouco mais sobre a campanha. “Trabalhamos com as pessoas seis temas relacionados aos impactos que nós colocamos para as aves na modernidade”. Segundo o entrevistado, existem soluções que os próprios cidadãos podem aplicar, caso tenham conhecimento. “A gente fala pouco sobre colisões de aves em vidro, sobre como os cães e gatos afetam os animais silvestres e a biodiversidade, ou sobre como o excesso de luz e poluição sonora alteram o comportamento dos animais. […] Esses problemas não estão na ótica das organizações do grande poder, mas sim na cultura do dia a dia das pessoas.” 

Monitorando o presente, preservando o futuro é o título do documentário lançado pela OAMa em 2023, que expõe o trabalho da organização com monitoramento de aves para entender os padrões das populações e desenvolver projetos. Afonso acredita que o Avistar é essencial para ampliar a visibilidade. “A gente está sempre procurando construir novas pontes e atingir novas pessoas.”

SAVEBrasil

A Sociedade para a Conservação das Aves do Brasil  (SAVEBrasil) é uma entidade parceira do Avistar que representa o território nacional em uma aliança denominada BirdLife International. A ONG é responsável pela proteção de 55 das 154 espécies de aves ameaçadas de extinção no país, além de proteger aves migratórias e preservar florestas tropicais. “Temos polos desde o Rio Grande do Sul até o Rio Grande do Norte, com os mais diversos projetos”, conta Alice Reisfield, gerente de programas na SAVE.

“No RS, nós trabalhamos com produtores de gado, certificando que as fazendas mantêm campos nativos, muito importantes para as aves. No RN, PA e MA, trabalhamos com aves limícolas, que são as aves de praia, realizando o monitoramento dessas espécies.” A organização também faz parcerias com diversas prefeituras para criar unidades de conservação locais, que visam garantir a manutenção de espécies aviárias ou reintroduzir espécies nativas que se perderam.

“A rolinha-do-planalto tem uma reserva em Boitumirim (MG). Essa espécie ficou desaparecida por 75 anos, e desde que foi reencontrada nós trabalhamos para protegê-la”. No ano passado, a SAVE começou a capturar ovos da rolinha para estabelecer uma população de segurança no Parque das Aves. “Essa população segura garante que, se ocorrer algum desastre natural, existam aves se reproduzindo sob cuidados humanos”.

A ONG conta com relatórios anuais, pautados pelos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU, que registram o progresso dos projetos nos nove estados em que ela está presente. “Por incrível que pareça, muitos dos observadores não conhecem tanto sobre o trabalho das ONGs de conservação. Na maioria dos locais, não é um tema que muitos guias vão tratar”, comenta Alice. “[O Avistar] é uma chance de mostrar para os observadores que é legal se envolver com os projetos. Se eles gostam de passarinho, são esses projetos que mantêm os bichos na natureza”. Para contribuir com essas iniciativas, é possível se tornar um Amigo da SAVE pelo site.

Visitantes conversando com um expositor no Avistar
Visitantes conversando com um expositor no Avistar.
[Imagem: Acervo pessoal/Gabriela Nangino]

Vale a pena visitar?

Elvis Japão e sua esposa Nanda, visitantes da exposição, são donos do sítio Macuquinho, onde guiam trilhas para os amantes de aves. Elvis relata que observa pássaros há 15 anos, e hoje em dia trabalha também como fotógrafo. “É uma paixão que já está na família desde a minha infância”, diz ele. 

“Eu gosto muito de andar na natureza e vi que a observação de aves é uma forma de trazer mais pessoas para ter esperança de preservação”, continua. “É um caminho que vai desde as crianças até os mais velhos, é um despertar para muitos”. A comunidade de observadores de aves é muito unida por uma perspectiva de mundo única e por um propósito maior. A exposição reflete essa paixão coletiva.

O mais interessante do Avistar, para Elvis, é a possibilidade de conhecer pessoas novas e ver como o evento cresce a cada ano. “As palestras são muito interessantes também, mas o que mais me chama atenção é essa troca […]. Como o mundo está tão corrido, as pessoas não têm tempo para parar um pouco e ouvir a natureza. Eu gostaria de convidar todos a tirar o pé do acelerador e tomar esse banho de natureza, porque você volta renovado. E isso é o que faz a gente tocar a vida de um jeito mais tranquilo”.

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