Por Maria Luísa Bassan
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Mudar da cidade grande para buscar uma vida nova em um lugar mais tranquilo. É com essa motivação que a família Creed deixa a sua vida estável, porém corrida, em Boston, e vai se estabelecer na cidadezinha de Ludlow. A casa enorme em uma propriedade rodeada de natureza parece ser o lugar perfeito para respirar fundo e recomeçar ー ou pelo menos era isso que eles achavam.
Cemitério Maldito (Pet Sematary, 2019) já é uma história conhecida por muitos. O longa é a segunda adaptação do livro “O Cemitério”, de Stephen King, para as telonas. O primeiro filme, lançado há 30 anos, chamou a atenção pelo seu estilo gore e mais chocante, o que dividiu a opinião de fãs e críticos. A segunda adaptação, então, prometia um tom mais psicológico e menos apelativo à obra que se tornou um dos maiores clássicos de King, porém, o exagero de jumpscares e os diversos pontos em aberto no roteiro tornaram o filme sem ritmo e decepcionante para quem esperava uma tensão elaborada que te faz ficar grudado na cadeira do início ao fim.
O começo do longa promete um grande suspense, e consegue construí-lo até certo ponto. A cena inicial misteriosa, com a casa e o carro da família marcados por sangue já atiça diversas teorias para quem não conhece a história. Então, inicia-se a narrativa com a chegada da família na cidade nova, compartilhando expectativas entre eles e torcendo para que a decisão de deixar a enorme Boston para trás tenha sido acertada. O pai, Louis (Jason Clarke), um médico da emergência, espera desacelerar sua vida, enquanto Rachel (Amy Seimetz) deseja que essa tranquilidade também reflita no seu relacionamento com o marido. Já as crianças não parecem estar muito afetadas com a mudança: Ellie (Jeté Laurence) está mais preocupada com a adaptação do gato Church, e Gage (Hugo Lavoie e Lucas Lavoie) é pequeno demais para entender as conversas dos pais e a disparidade entre a antiga e a nova casa.
Aos poucos, o lugar vai se mostrando menos acolhedor e mais sombrio: a propriedade enorme contém um cemitério de animais há muito tempo utilizado, e o vizinho Jud (John Lithgow) parece ter muitos segredos, inclusive acerca do cemitério. Ellie é a primeira a sentir a estranheza do local, ao andar pelas árvores com sua mãe e avistar uma série de crianças com máscaras de animais levando um bichinho em um carrinho de mão. O que poderia ser o mistério inicial da casa e levantar uma série de questionamentos, dando início ao thriller psicológico, não é bem aproveitado ー o fato é apenas citado posteriormente, mas não explicado, e cabe ao espectador tentar relacioná-lo com outros pontos do roteiro que também não são expostos com clareza.

Louis e Rachel, que até então pareciam bem abertos à nova experiência, começam a se sentir abalados depois de um acidente ocorrido com um adolescente perto do novo local de atendimento do médico. O garoto foi atropelado enquanto andava de skate e não resistiu aos traumas, mesmo com o esforço de Louis em mantê-lo com vida. Ao compartilhar o incidente com a mulher, fica claro que a morte é um assunto visto como tabu entre o casal: Louis acredita que a morte é o fim de tudo, e Rachel não sabe lidar com o sentimento de vazio desde que sua irmã faleceu. Quando Ellie conhece o cemitérios dos animais, seus pais evitam se aprofundar no assunto, e, ao longo do filme, é interessante ver como a forma que eles lidam com a morte, que é um acontecimento inevitável e imprevisível a todos, está diretamente ligada à incapacidade de lidar com a dor da perda e a necessidade que eles possuem de estar no controle da situação.
A partir desse momento, Rachel passa a ser atormentada por memórias do passado, e Louis tem delírios e sonhos com o garoto morto, avisando-o sobre o perigo que é não respeitar a ordem natural das coisas. Esses sentimentos passam a ser ainda mais intensificados depois que eles precisam lidar com a morte de um membro querido da família, e o cemitério torna-se local de mais importância para a trama. Porém, ele é ambientado de maneira exagerada e pouco contextualizado, parecendo mais um delírio de Louis e Jud do que um lugar existente e de origem mítica. O filme tenta explicar o que é o cemitério exatamente, com cenas mostrando Louis fazendo uma pesquisa no computador e vendo livros e recortes que Jud possui em sua casa, mas elas são breves e pouco auxiliam no esclarecimento do espectador, que provavelmente só entenderá um pouco mais se tiver familiaridade com a história. Apesar disso, é possível entender a relação entre o cemitério e os demônios interiores do casal da trama, permitindo uma reflexão mais humana sobre as decisões e medos de cada um deles.
Além do mais, os delírios de Rachel e Louis rendem bons sustos e acrescentam tensão ao filme, mas o exagero de jumpscares seguidos torna algumas cenas cansativas, prejudicando o ritmo de desenvolvimento da trama. A fotografia com tons frios e a trilha sonora se relacionam muito bem com a tensão psicológica que o filme quer construir, mas acabam por parecer exageradas ao não serem acompanhadas pelo roteiro, que se perde no final. O filme foca no suspense e é bem sucedido nesse aspecto, porém, mesmo tendo atuações fortes a seu favor, como a de Jeté Laurence, acaba sem responder perguntas sobre os personagens que poderiam auxiliar na construção de um thriller mais denso e completo, entregando poucos momentos que uniam, de maneira digna, a história, os personagens e os sustos do “rei do terror”.
Cemitério Maldito tem estreia prevista para 9 de maio no Brasil. Confira o trailer: