“Se você não consegue ver o rosto do personagem, provavelmente é um dublê”, diz Renae Moneymaker em uma reportagem gravada pelo canal norte-americano Bloomberg. A ginasta que substitui a famosa atriz Jennifer Lawrence nas cenas de ação de muitos de seus filmes, como os da saga Jogos Vorazes (The Hunger Games, 2012) e os da saga X-Men (2000-), acaba levantando uma questão muito curiosa com este depoimento. Quantas vezes, durante um filme do gênero, ficamos sem ver o rosto do ator principal? Será possível que, em certos longas, o dublê aparece mais diante das câmeras do que o profissional a quem substitui? Esses questionamentos colocam em xeque o reconhecimento que essas figuras recebem no mundo do cinema, bem menor comparado ao que mereciam receber. Para esclarecer ao leitor os detalhes desta perigosa e incomum profissão, o Cinéfilos elaborou essa reportagem sobre dublês na indústria cinematográfica.
Não é preciso ter curso superior para trabalhar como dublê, apenas “muita determinação e vontade de trabalhar nessa atividade”. É o que diz Agnaldo Bueno, cofundador da escola No Limits Dublês, de portas abertas desde 2002 no país, e que já trabalhou em filmes, novelas e programas de TV (confira alguns feitos do dublê em http://www.nolimitsdubles.com.br/resumo.html). Isso porque, além do pouco reconhecimento recebido pela profissão, ela é cheia de riscos. “Lutas, quedas, pilotagens, cenas com fogo, colisões e capotagens de veículos são cenas comuns nessa profissão”, revela Agnaldo, expondo assim, a grande variedade de trabalhos requisitados aos dublês, bem como a alta periculosidade deles. Apesar disso, o dono da escola ressalta que um profissional experiente raramente encontra problemas. Para ele, o maior perigo da carreira é a autoconfiança exagerada, principalmente entre os mais novos, que muitas vezes superestimam suas capacidades.

Para se ter uma ideia da dificuldade em realizar certas cenas, bem como as sequelas causadas a alguns dublês após os feitos, o canal do YouTube, WatchMojo, reuniu as dez melhores performances destes profissionais em filmes no seguinte vídeo:
Na seleção, vemos cenas nas quais os artistas sofreram queimaduras e fraturas, e quase perderam a vida durante ou após os feitos. Mesmo assim, o profissional que desempenha tais ações sabe que essas consequências são parte de seu trabalho, e não temê-las é essencial para a realização das cenas.
E não é apenas durante seus atos perigosos que a vida de um dublê é desafiadora. Quem segue a carreira é pago por cena realizada e, por isso, muitas vezes deve esperar horas no set de filmagem até chegar a sua vez de gravar. Além disso, não há uma tabela que regule o preço de cada tipo de cena, e o pagamento depende da experiência de cada dublê, como explica Agnaldo. “Uns cobrarão cinco mil para capotar um carro e algumas produções vão contratar, mas correrão o risco de dar errado. Outros com mais experiência cobrarão 25 mil e a produção pagará por que só é possível fazer a cena uma vez e o prejuízo depois pode ser caro”. E com relação a renda média de um profissional do ramo, no Brasil, ele completa: “Uma diária mínima fica entre 600 e mil reais para lutas e cenas simples”.

No resto do mundo, o cenário é um pouco diferente por causa da maior quantidade de filmes com cenas de alto risco. Apesar disso, é muito difícil algum leigo saber o nome de um dublê – excluindo Renae Moneymaker que foi citada no início dessa matéria. Mais comum é sabermos o nome de atores que fazem suas próprias cenas de perigo e dispensam dublês – como é o caso de Jackie Chan, o mais conhecido destes – como se os feitos praticados pelos dublês só fossem importantes quando é um ator que os realiza.
Enquanto não obtém o devido reconhecimento por seu difícil e arriscado trabalho, a maioria dos dublês felizmente não precisa de um segundo emprego para sobreviver. O dono da No Limits Dublês afirma que trabalha exclusivamente como dublê há vinte anos e diz que muitos no Brasil conseguem emprego com publicidade novelas e até mesmo no cinema. Em conclusão sobre o cenário nacional, Agnaldo acrescenta: “Ainda não tem trabalho para todos, mas aquele que está preparado pode muito bem viver da profissão”.
por Bruno Menezes
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