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Observatório | Pandora Papers: o que há por trás das empresas de fachada

Ministro da economia e presidente do banco central estão na lista de pessoas que têm offshore em paraísos fiscais

Na semana do dia 3 de setembro, ocorreu um vazamento de mais de 11,9 milhões de documentos confidenciais sobre investimentos em offshores de personalidades de mais de 40 países, conhecidos como Pandora Papers. Esses, são a maior colaboração jornalística da história, organizada pelo Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ), que, no Brasil, contou com a colaboração da Agência Pública, do Metrópoles, do Poder 360 e da revista Piauí. 

Tais documentos são provenientes de 14 empresas de advocacia, entre as mais citadas estão a Alcogal e Trident Trust, sobre offshores localizadas em países como as Ilhas Virgens Britânicas e o Panamá, considerados paraísos fiscais. Nos documentos, constam diversos nomes: desde a cantora Shakira até o rei da Jordânia e o presidente do Equador, por exemplo. No Brasil, os principais nomes são Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central, e Paulo Guedes, ministro da economia.

 

 

O que são paraísos fiscais e offshores?

Os paraísos fiscais (tax haven) são países onde o imposto de renda é nulo ou menor que 20%, beneficiando empresários que investem nesses locais. Além disso, não há transparência nos lucros das empresas lá criadas ou auditorias contábeis às autoridades (no Brasil, seria como ter um negócio e não precisar prestar contas à Receita Federal). Já as offshores são empresas criadas fora do país do beneficiário não necessariamente em paraísos fiscais mas, quando estão nesses lugares, são utilizadas para comprar bens, reter dinheiro ou comprar outras offshores, muitas delas não realizam atividades, apenas agem como “empresas de fachada”.

O advogado tributarista Tiago Vieira, em entrevista para esta reportagem, diz que a Receita Federal considera também como característica dos paraísos fiscais, a falta de informações trocadas entre países. “Então, por exemplo, sai uma empresa aqui do Brasil que quer esconder dinheiro em paraísos fiscais: ela remete o dinheiro para esses lugares, abre contas e os valores ficam escondidos”. 

No Brasil, segundo Vieira, a alíquota normal é de 15% e, para ficar de acordo com o imposto de renda mundial, foram acrescentados mais 10%. O que nos paraísos fiscais, lugares como o Panamá, Ilhas Virgens Britânicas, Suíça e Ilhas Cayman, é uma taxa muito menor ou, até mesmo, nula. Ele também ressalta que, com esse tipo de tributação, ou seja, com baixos valores de alíquotas e pouca transparência, há grande atração de investidores ou milionários que querem maximizar sua rentabilidade.

No entanto, manter offshores fora do Brasil não é considerado ilegal desde que o patrimônio seja declarado à Receita Federal. “Se a empresa investiu um valor no paraíso fiscal, e lá há um percentual de 2% ou 3%, esse valor vai ter que ser pago para o governo daquele país independentemente do valor que for pago aqui”, afirma Vieira. O advogado tributarista também fala que algumas empresas abrem offshores para distribuição de dividendos, para fazer investimentos e também pagam impostos. O que, para ele, se torna um problema é quando a intenção é “blindar o patrimônio”.

 

Paulo Guedes, Campos Neto e seus conflitos de interesse

 

Na imagem, Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central. [Imagem: Marcelo Camargo/Ag. Brasil]

Em setembro de 2014, Paulo Guedes, atual ministro da economia do governo Bolsonaro, fundou uma offshore nas Ilhas Virgens Britânicas, a Dreadnoughts International Group, e nos meses seguintes aplicou uma quantia de 9,55 milhões de dólares, que na época valiam 23 milhões de reais. A empresa continuou ativa até setembro deste ano com o ministro como controlador.

Em nota à Piauí, a assessoria de Guedes afirmou que “Toda a atuação privada do ministro Paulo Guedes, anterior à investidura no [atual] cargo, foi devidamente declarada à Receita Federal e aos demais órgãos competentes, o que inclui a sua participação societária na empresa mencionada” e que desde que assumiu o cargo de ministro da Economia, ele teria se desvinculado de atuações no mercado privado. 

No dia 8 de outubro, em um evento virtual do Banco Itaú, o ministro se defendeu dizendo que a offshore que ele tem foi declarada e que “não houve movimento cruzando as fronteiras, trazendo dinheiro do exterior ou mandando dinheiro ao exterior”. 

Por sua vez, Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central desde fevereiro de 2019, fundou sua offshore em 2004, a Cor Assets, com um capital de 3,3 milhões na época, e só a fechou em outubro do ano passado. A assessoria de Campos Neto disse que a empresa foi declarada à Comissão de Ética Pública, e o patrimônio ao Banco Central e à Receita Federal, com recolhimento da tributação.

Apesar de declaradas à Receita Federal, essas offshores vão contra o Código de Conduta da Alta Administração Federal de 2000, que, no artigo 5°, proíbe funcionários do alto escalão que tenham informações privilegiadas devido função ou cargo de fazerem gestão de bens cujo valor possa ser afetado por decisões ou políticas governamentais, entrando assim em conflito de interesse.

Vieira dá um exemplo relacionado às informações privilegiadas, cargo e conflito de interesses: como ministro da economia, se entender que algo acontecerá no país e que, por causa disso, o dólar subirá, desvalorizando o real – o que beneficia quem possui investimentos no exterior –, isso irá afetar diretamente sua tomada de decisão pessoal e profissional.  O que se aplica tanto a Guedes quanto a Campos Neto, que estão diretamente ligados com as questões financeiras do país.

À luz dos Pandora Papers, a proposta de reforma tributária apresentada ao Congresso Nacional em junho e vetada pelo Ministério da Economia, configura um conflito de interesse do ministro na época. O projeto original sugeria a taxação de investimentos no exterior, inclusive em paraísos fiscais, o que afetaria as offshore.

 

Imagem de capa: Marcos Corrêa/PR

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