Há um clichê que ronda os filmes bíblicos, uma pretensiosidade insistente: tenta-se transformar os acontecimentos e personagens do Velho Testamento em histórias e heróis épicos, tentação difícil de resistir quando se tem em mãos todo o poder das superproduções hollywoodianas. Em contrapartida, o Novo Testamento é reservado apenas para quando se grava um filme sobre a vida de Jesus, sendo rasamente explorado. Deixam-se passar importantes lições e pensamentos que definem a cristandade, apenas repetindo a história do Cristo e retratando seus apóstolos como menos importantes para a consolidação da fé cristã. Neste cenário será lançado Paulo – Apóstolo de Cristo (Paul, Apostle of Christ, 2018), que em um ambiente onde as histórias da Bíblia se tornaram produtos audiovisuais, faz muito mais que apenas contar uma história antiga.
Escrito e dirigido por Andrew Hyatt e estreando James Faulkner e James Caviezel, Paulo – Apóstolo de Cristo narra o fim da vida de São Paulo e a escritura de seu evangelho numa prisão romana, com o auxílio de São Lucas. A trama conta com uma marcante precisão histórica, retratando fielmente o cenário romano por volta dos anos 60 do século I.

O roteiro escolhe muito bem o recorte da narrativa: contar o fim da vida de Paulo dá ao diretor a oportunidade de retratá-lo em seu momento mais sábio, e de expor no filme suas mais importantes lições. É notável também a maneira como se optou por apresentar essas lições, abstendo-se de frases prontas e citações diretas, é dado aos personagens a chance de desenvolver seus pensamentos, sendo colocados em situações de fraqueza e vulnerabilidade.
Apesar de sombras de uma dramatização exagerada aparecerem em certos pontos, contendo cenas que não são tão fortes quanto pretendem ser, e a mensagem do filme se embaralhar em certos pontos, a simplicidade da narrativa demonstra ser sua maior proeza. As relações entre os personagens e suas histórias são o que dá a força ao filme. Os diálogos entre Paulo e Maurício Galla (Olivier Martinez) são pontos importantes na história, onde toda a sabedoria de Paulo é posta à mostra. Assim se repete em seus diálogos com Lucas, ao qual serve de mestre e orientador.
O filme possui características visuais criativas em sua composição, sendo o desfoque acentuado a maior delas. Com o auxílio desta técnica, o diretor nos guia exatamente para onde devemos olhar, e o mais interessante: este recurso, no qual a luz parece se entrelaçar, nos cria a impressão do “sfumato” renascentista, dando ao espectador a sensação de apreciar uma tela da época.
O longa, apesar de hollywoodiano, segue fiel com sua mensagem baseada no evangelho. Seu final forte e emocionante leva facilmente aqueles que crêem às lágrimas, e mesmo aqueles que não crêem podem levar da experiência mensagens positivas sobre humildade, alteridade e pacificidade.
Em primeira instância, Paulo – Apóstolo de Cristo pode parecer mais uma história bíblica americanizada, mas a progressão da trama demonstra grande habilidade de retratar seus personagens e teve grande êxito em seu objetivo: representar os ensinamentos do evangelho em seu momento de origem. Simples e emocionante, é com certeza uma atitude refrescante no mercado saturado de filmes épicos, e proporciona uma incrível experiência catártica e espiritual.
Paulo – Apóstolo de Cristo estreia dia 3 de maio nos cinemas brasileiros. Confira o trailer abaixo:
por Marcus de Rosa
mesderosa@usp.br