Porque não reescrever a Bíblia? O público é confrontado com essa pergunta ainda no início de Raquel 1:1 (2023), lançamento nacional dirigido e roteirizado por Mariana Bastos. Por trás de uma pergunta (e de um filme) que pode chocar os mais conservadores, está um importante comentário sobre fanatismo religioso e o papel da mulher na sociedade.
Raquel (Valentina Herszage) é uma adolescente religiosa que, após a trágica morte de sua mãe, volta a viver com seu pai, Hermes (Emílio de Mello), em sua cidade natal interiorana, a fictícia Monte Megido. Em seus primeiros dias, a jovem passa por uma misteriosa experiência, o que a colocará em um embate direto contra a forte igreja local.
O longa é um terror psicológico com pitadas de folk e body horror. É possível lembrar de filmes como A Bruxa (The Witch, 2015) ou Carrie – A Estranha (Carrie, 1976) ao assisti-lo, mas Raquel 1:1, por seu contexto, é um terror intimamente brasileiro. Com o fortalecimento de pautas religiosas conservadoras entre o governo brasileiro nos últimos anos, a trama do longa se torna totalmente atual. A igreja de Monte Megido funciona como um poder paralelo na cidade, influenciando a vida até daqueles que não a seguem. Quando Raquel passa a desafiar seus preceitos, toda a cidade se volta contra ela, como se aquele fosse um feudo medieval e a protagonista, uma bruxa.
A figura da bruxa se tornou emblemática para o feminismo do século XXI e esse é, sem dúvida, um filme feminista. Mariana Bastos discute a opressão da mulher dentro dos preceitos religiosos de uma Bíblia escrita por homens que viveram há séculos e dentro de uma sociedade machista, principalmente através dos flashbacks sonoros envolvendo a mãe de Raquel, que foi assassinada pelo namorado.
Raquel 1:1 é atual, tem um bom ritmo e uma mensagem necessária. O longa é uma bela adição ao catálogo de filmes de terror nacionais e peca apenas por não ir longe nos aspectos que o fazem mais esquisito e misterioso, como o body horror.
O filme já está em cartaz nos cinemas. Confira o trailer:
*Imagem de capa: Divulgação/O2 Play Filmes