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Reality shows culinários: a receita do sucesso que tornou a cozinha em espetáculo nacional

No ano de estreias de novos programas e temporadas, entenda porque os reality shows gastronômicos cativam o público brasileiro
Por Sofia Colasanto (sofiacolasanto2@usp.br)

Nesta terça, 11 de novembro de 2025, será transmitida a final da segunda temporada do Masterchef Confeitaria (2024 – presente) pela Band TV. Os episódios do programa, que também são publicados no Youtube, possuem uma média de 1,5 milhões de visualizações e a semifinal chegou a 500 mil acessos em apenas 24 horas. No dia 18, ocorre a estreia do programa Masterchef Celebridades.

O ano de 2025 foi marcante para o universo dos reality shows culinários no Brasil. Em julho, a Rede Globo estreou o programa Chef de Alto Nível e no mês seguinte o Infiltrado na Cozinha, do GNT. Além disso, até novembro já foram lançadas novas temporadas do Masterchef Brasil (2014 – presente), Bake Off Brasil (2015 – presente), Que Seja Doce (2015 – presente)  e Kwai Chef (2024 – presente), o primeiro reality culinário em formato vertical do país.

Em evento da Rede Globo, a jurada Renata Vanzetto declarou que “um episódio nosso deu mais audiência do que todas as temporadas do Masterchef juntas” [Imagem: Reprodução/Imdb]

Os programas culinários surgiram na segunda metade do século XX, junto com o desenvolvimento da própria televisão. Inicialmente, seu objetivo era o ensino de receitas aos espectadores de maneira pedagógica. Esse formato necessita de uma cozinha, uma apresentadora-cozinheira e os ingredientes a serem utilizados.

Porém, a partir de 1990, e com um boom na década de 2010, surgiram os reality shows culinários. Esse formato propõe a competição entre participantes na realização de pratos, os quais serão avaliados por chefs profissionais. Desde então, esse tipo de programa utiliza diversos recursos para cativar os telespectadores ano após ano. 

Um ato comum a todos

A alimentação é uma ação primordial da existência humana. Todos os seres humanos comem e, mesmo que cada vez menos, a maioria deles cozinha. Para além das necessidades fisiológicas, o comer está ligado à culturas, hábitos e saberes de cada povo. Portanto, por envolver uma atividade presente no cotidiano de tantas pessoas, os reality shows culinários atingem uma parcela ampla da população. Luísa Gastaldi e Maria Luísa Vieira, ambas estudantes e fãs desses programas, afirmam que o interesse em assistir surgiu pelas duas famílias já cozinharem rotineiramente.

Esses formatos, como Masterchef (1990 – presente), do Reino Unido, e Bake Off (2015 – presente), dos Estados Unidos, são criados em um país e exportados ao redor do mundo. Em entrevista à Jornalismo Júnior,  Fernando Andacht, professor da Faculdade de Informação e Comunicação da Universidade da República, em Montevideo, e pesquisador do assunto, argumenta que os reality shows culinários possuem um aspecto “glocal” — termo que une as palavras “global“ e “local”. Ou seja, para terem maior aderência em outros países, cada adaptação deve conter elementos próprios que promovam a identificação do público com o reality, ao mesmo tempo que mantenham certos padrões em todas as versões.

Há “uma mistura de algo bem local com as regras internacionais, como por exemplo, a que quase sempre há um chef estrangeiro, normalmente francês”, conclui Andacht. É comum os programas apresentarem dinâmicas que propõem o uso de ingredientes ou preparos nacionais, mas que também exijam técnicas da gastronomia tradicional francesa.

Na 12º temporada do Masterchef Brasil, um dos desafios foi cozinhar com ingredientes tradicionais de cada região do país [Imagem;Reprodução/Youtube/Masterchef Brasil]

A identificação com os próprios participantes também é explorada pelo programa. Os momentos chamados de “solilóquios” por Andacht, que são aqueles em que o competidor fala diretamente com o espectador fora das provas, conseguem demonstrar melhor as personalidades e trajetórias de cada um. Esses momentos são os principais responsáveis pela afeição ou antipatia do público com determinados participantes.

Além disso, as demonstrações físicas das emoções, como o suor depois de um desafio, o choro pela eliminação e o sorriso após ganhar uma prova também promovem a empatia dos espectadores. Inclusive, são essas sensações que aproximam o programa da realidade, afinal, de acordo com o pesquisador, “há uma procura do autêntico, embora todo mundo saiba que não há nada mais artificial do que um reality show.” É justamente por esse aspecto emocional e íntimo dos programas que eles se aproximam mais do formato reality do que talent show, pois promovem que os participantes não sejam só caracterizados por suas habilidades, mas também pelo seu caráter.

As reações genuínas dos participantes são amplamente exibidas no programa, para gerarem empatia com o público [Imagem: Reprodução/Youtube/Bake Off Brasil]

A competição

Cláudia Mesquita Pinto Soares, professora de Gastronomia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, é objetiva ao afirmar que “os reality shows culinários fazem sucesso não apenas por envolverem comida, mas por terem disputa.”. As estudantes reconhecem que o que as instiga em continuar assistindo o reality ano após ano é o aspecto competitivo e que “agora as competições dos amadores estão muito próximas de níveis profissionais, o que deixa o programa cada vez mais interessante”, de acordo com Luísa.

Nesse aspecto, os reality shows culinários afastam-se da realidade dos espectadores ao demonstrarem uma cozinha penetrada por competição, cobrança por alta performance e agressividade. O que cativa o público é acompanhar, a cada episódio, quem será destaque do dia e quem será eliminado, muito mais do que quais pratos serão cozinhados.

Portanto, Andacht aponta que, na realidade, a comida é um aspecto secundário nos reality shows gastronômicos. A narrativa dos programas é pautada pelo aspecto dramático, não pela demonstração de novas receitas ou pelas técnicas da gastronomia. O pesquisador ainda diz que “no Brasil, há uma aproximação da dramaticidade das novelas na formatação dos programas”, o que remonta a incorporação de aspectos locais nos realitys.

A competição também gera um importante efeito no telespectador: a torcida. O público passa a preferir certos competidores e desprezar outros, em prol de quem merece ser o grande vencedor. A própria edição das cenas muitas vezes constrói os vilões e heróis de cada temporada, e também mudam o tempo de tela de cada participante conforme o gosto do público. 

Comentários que o público faz durante o programa são colocados na exibição, o que engaja o espectador a participar cada vez mais [Imagem: Reprodução/Youtube/Masterchef Brasil]

As torcidas também promovem maior fomento e interatividade do programa nas redes sociais. Atualmente, todos os reality shows possuem uma hashtag própria no X (antigo Twitter) e durante os episódios pedem para que os telespectadores publiquem seus palpites e opiniões. Assim, os programas passam a sensação de uma transmissão ao vivo, o que engaja o público, mesmo que todas as cenas já sejam gravadas.

Você é o que você assiste

Os jurados são os responsáveis pela validação dos pratos. São eles que, a partir de sua experiência como chefs profissionais, legitimam quais preparos são corretos e saborosos. Logo, Cláudia reflete: “Como dizer o que é certo ou errado no plano da alimentação se o Brasil é muito amplo e múltiplo?” Por exemplo, certos pontos de cozimento, preparos e modos de corte que são comuns no dia a dia dos brasileiros são considerados incorretos pelos jurados e participantes.

A professora observa que, ao demonstrarem as regras da gastronomia, os programas influenciam os espectadores a adotarem práticas mais próximas do mundo profissional na cozinha de seus lares. Os reality shows culinários transmitem que os melhores pratos são inovadores e bonitos, de modo que a comida deve atingir a categoria gourmet. A estudante Maria afirma que também assiste aos programas para aprender novas técnicas e aplicá-las em suas receitas.

Já Andacht comenta que “minha impressão é que as pessoas mais se imaginam no lugar dos participantes”, afinal muitos passam mais tempo assistindo aos reality shows do que nas cozinhas, pois os programas não ensinam ao público como cozinhar. Luísa afirma que não cozinha muito, mas tem mais vontade de cozinhar pelas cenas que assiste nos programas e o que vê os participantes fazendo. 

Mesmo que muitos dos programas brasileiros estejam completando uma década de existência, os reality shows culinários permanecem relevantes e trazem cada vez mais novidades. O pesquisador aponta que o formato não se desgasta pela introdução de desafios cada vez mais inusitados e também pela a criação de derivados, como o Masterchef Celebridades. Cláudia afirma que “enquanto a alimentação for um produto de distinção social, esses programas continuarão.”

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