Jornalismo Júnior

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Resumo Internacional 2019: Ásia, Europa e Oriente Médio

Saiba quais foram os principais acontecimentos ao redor do mundo neste ano de 2019

O ano de 2019 foi marcado por protestos. Cada um à sua maneira, do Chile ao Líbano, foi possível observar a materialização de uma insatisfação crescente da população para com governos – autoritários ou democráticos, liberais ou intervencionistas. 

Ao mesmo tempo, foi um ano de grandes eleições. A maior democracia do mundo, a Índia, foi às urnas, e o continente europeu como um todo foi marcado pela eleição do Parlamento Europeu, órgão legislativo da União Europeia, bloco com 28 (e em breve, ou não tão breve assim, 27) países.

Confira nesta matéria, de forma resumida, os principais acontecimentos políticos nos países de cada um dos continentes do globo. Por questões de distribuição de informação, a América foi dividida em seus três subcontinentes, e o Oriente Médio também será um tópico separado. A matéria também conta com análises de especialistas em relação ao ano de 2019 para cada continente, destacando em qual país (ou quais países) deveremos ficar de olho em 2020.

 

Ásia

Mapa político da Ásia. [Fonte: Fsolda/Wikipedia]

O ano no continente asiático foi marcado pelos protestos em Hong Kong contra o regime do Partido Comunista Chinês. A região, pertencente à China, usufrui do sistema de “um país, dois sistemas”, contando com muitas liberdades individuais não existentes no resto do país. Uma demanda da população, porém, é a escolha por voto do seu líder que, atualmente, é escolhido por um conselho aprovado por Pequim.

Os protestos democráticos no território não são novos, mas um projeto de lei que permitiria a extradição de presos políticos para a China (com riscos de torturas e desaparecimentos), levou a população às ruas em números nunca antes vistos. Após meses de manifestações e conflitos com as autoridades, a chefe do executivo de Hong Kong, Carrie Lam, revogou a proposta, mas as demandas democráticas dos manifestantes ainda levam milhares às ruas. Nas recentes eleições locais, candidatos pró-democracia conquistaram 17 dos 18 conselhos distritais, indicando que a questão, e a tensão, estão longe de acabar.

A líder do executivo de Hong Kong, Carrie Lam. [Imagem: Anthony Kwan/ Getty Images]

Ao mesmo tempo, a China completou os 50 anos do movimento popular que levou o Partido Comunista Chinês ao poder. Com um grande crescimento econômico, o país atualmente enfrenta uma dura guerra comercial com os EUA. Além disso, passa pela dificuldade de lidar com Hong Kong, graças à incompatibilidade do modelo autoritário do país com o democrático do território e às crescentes críticas em relação ao modo como vem tratando grupos minoritários muçulmanos, como os Uigures.

A principal eleição no continente ocorreu na Índia, que também possui o maior pleito democrático do mundo em relação ao número de eleitores. O resultado, já previsto por analistas, foi a reeleição do primeiro-ministro Narendra Modi, político populista de direita que intensificou um discurso nacionalista, hinduísta e anti-muçulmano para assegurar e expandir sua base eleitoral. Pouco após a eleição, Modi aumentou, por exemplo, a repressão na região da Caxemira, habitada majoritariamente por muçulmanos e em disputa com o Paquistão, e aprovou uma lei que dificulta a obtenção de cidadania por muçulmanos. 

Outro país que passou por eleições parlamentares foi a Tailândia, após sucessivos adiamentos depois de um golpe militar. Apesar da vitória do Pheu Thai, partido oposicionista da família Shinawatra (retirada do poder), a nova Constituição do país, feita sob mando dos militares, garantiu que o general Prayut Chan-o-cha permanecesse no poder. Isso ocorreu porque os militares podem indicar os membros do Senado que, junto com o Parlamento, escolhem o primeiro-ministro.

A Indonésia também foi marcada pelo recondução do seu líder. O presidente Joko Widodo, eleito em 2014 com um discurso moderado e de renovação, foi reeleito. O centro-esquerdista acabou adotando um discurso mais duro a fim de evitar uma derrota para o ex-general conservador Prabowo Subianto e foi visto como um mal menor, apesar da continuidade de conflitos étnicos e religiosos durante seu governo. Pouco após a vitória, o presidente anunciou um plano para mudar a capital do país. A ideia é sair de Jakarta, que está afundando em meio ao aumento do nível do mar, para uma nova cidade, que será construída na ilha de Borneo.

O presidente reeleito da Indonésia, Joko Widodo. [Imagem: AFP]

Um país que teve mudanças após as eleições foi as Maldivas. As eleições parlamentares resultaram em uma alteração da composição do Parlamento, com a queda do primeiro-ministro Qasim Ibrahim, do conservador Partido Republicano. Em seu lugar foi escolhido Mohamed Nasheed, do Partido Democrático das Maldivas. O partido já havia conquistado a presidência do país no ano passado, com um discurso anticorrupção e pró-Ocidente.

Outra mudança ocorreu no Sri Lanka. Após atentados contra a minoria cristã no país, o candidato Gotabaya Rajapaksa foi eleito com um discurso focado na segurança pública. Rajapaksa recebeu duras críticas internacionais quando foi Ministro da Defesa, já que relatos indicam que ele foi responsável por inúmeros crimes cometidos durante a repressão da etnia hinduísta dos Tamils, durante uma guerra civil. É esperado que seu irmão, Mahinda Rajapaksa, que foi presidente na época e responsabilizado pelos mesmos crimes, seja escolhido como primeiro-ministro da nação.

No Cazaquistão o autocrata Nursultan Nazarbayev renunciou após 29 anos no poder. Em seu lugar assumiu, de forma temporária, Kassym-Jomart Tokayev, à época presidente do Senado e aliado de Nazarbayev. Tokayev foi eleito presidente com 70% dos votos após a realização de eleições criticadas internacionalmente, em especial devido à suspensão de partidos de oposição e falta de indicadores de transparência. Em honra ao ex-ditador, Tokayev renomeou a capital do país de Astana para Nur-Sultan.

Kassym-Jomart Tokayev, novo presidente do Cazaquistão. [Imagem: Reprodução]

Eleições simbólicas ocorreram na Coreia do Norte, em que havia apenas um candidato para cada assento no Parlamento que estava em disputa. O ditador Kim Jong-un foi, sem surpresas, reconduzido para a presidência da casa legislativa. Ao mesmo tempo, o país retomou seus testes de mísseis capazes de transportar ogivas nucleares, e as conversas com os EUA estão paralisadas. 

Nas Filipinas o partido do conservador Rodrigo Duterte, conhecido pela sua política com altas taxas de assassinatos em relação a usuários e traficantes de drogas, conquistou mais assentos no Senado, mas perdeu votos na Câmara dos Deputados em meio a eleições legislativas. Seguindo a Constituição do país Duterte não poderá concorrer à reeleição em 2022, e por isso já surgem apostas para a sucessão do político, com alta taxa de aprovação. Entre os favoritos estão sua filha, Sara Duterte, e o ex-campeão mundial de boxe Manny Pacquiao.

Já no Camboja o ditador Hun Sen, no poder há 34 anos junto com seu Partido Popular do Camboja, enfrentou desafios mais intensos por parte da oposição ao regime. Sam Rainsy, grande líder oposicionista auto exilado, declarou seu objetivo de retornar ao país para retirar o ditador do poder. Enfrentando dificuldades para permissão de retorno, Rainsy está na Malásia, próximo do território natal. As declarações de Rainsy ocorrem em meio a uma intensificação da pressão internacional, em especial da União Europeia, pela redemocratização do Camboja. Tentando evitar prejuízos econômicos Hun Sen liberou, recentemente, outro líder importante da oposição, Kem Sokha, e 70 outros presos políticos.

Hun Sen, que governa o Camboja há 34 anos. [Imagem: Reuters]

O Uzbequistão teve eleições no final de dezembro para o Parlamento. Apesar de diversas reformas de abertura econômica e política iniciadas por Shavkat Mirziyoyev, que assumiu a presidência do país após a morte do seu aliado, o ditador Islam Karimov, o pleito não teve a participação de partidos de oposição, devido a leis eleitorais ainda muito rígidas que dificultam o registro de novos partidos.

O continente também foi marcado por tensões entre a Coreia do Sul e o Japão. Tudo começou com uma determinação da Suprema Corte Sul Coreana permitindo que mulheres forçadas a atuar como escravas sexuais por japoneses durante a Segunda Guerra Mundial pudessem exigir compensações financeiras. Isso iniciou uma guerra de narrativas, e a recusa do governo japonês em reconhecer suas ações no outro país. O que ocorreu em seguida foi uma troca de sanções por parte das nações, e boicotes de produtos pelas populações. Até agora nenhuma reunião resolveu a disputa entre duas das maiores economias do mundo.

Para João Paulo Charleaux, repórter especial do Nexo Jornal que cobre política internacional, os protestos em Hong Kong marcaram o ano no continente. Além disso, Charleaux comenta que “de outro lado, tem-se a impressão de que a tensão nuclear com a Coreia do Norte vive um momento de calmaria, o que desacelera os planos japoneses de tornar a própria Constituição mais permissiva em relação ao próprio poder militar e nuclear do país”. Para ele, o país a se ficar de olho em 2020 é a China, com seus planos de reeditar a famosa Rota da Seda, usada para o comércio.

Europa

Mapa político da Europa. [Fonte: Fsolda/Wikipedia]

O continente europeu foi marcado pelas eleições do Parlamento Europeu, órgão da União Europeia responsável por aprovar legislações (propostas pela Comissão Europeia) e outras normas e acordos do bloco. No geral, os partidos de cada país da organização dividem-se em “famílias”, que englobam posições políticas comuns. As duas principais são o Partido Popular Europeu (PPE), de centro-direita, e a Aliança Progressista dos Socialistas e Democratas (APSD), de centro-esquerda.

Neste ano as eleições geraram um parlamento mais fragmentado, com a ascensão dos grupos Renovar a Europa (de centro-direita e liberal) e o Identidade e Democracia (de extrema-direita, com partidos críticos do bloco). Além disso, houve um aumento dos votos também para o grupo Grupo dos Verdes, de partidos ambientalistas.

Essa fragmentação tornou mais complexa a escolha da presidência da Comissão Europeia, órgão executivo do bloco. Na reunião do Conselho Europeu, que reúne os líderes de cada nação da UE, os líderes do PPE e do APSD foram rejeitados, e em seus lugares surgiu o nome de Ursula Von der Leyen, à época Ministra da Defesa da premiê alemã Angela Merkel. A proposta, encabeçada especialmente pelo francês Emmanuel Macron, não ficou livre de críticas, mas Von der Leyen, do PPE, acabou conquistando o apoio necessário no Parlamento com promessas de apoio a pautas ambientalistas e respeito à soberania nacional de cada país.

Ursula Von der Leyen, nova presidente da Comissão Europeia. [Imagem: Carmen Jaspersen / DPA]

Após a escolha da presidência da comissão, são aprovados no Parlamento cada um dos 27 (com a exclusão do Reino Unido) comissários, cada um responsável por uma pasta em temas econômicos, sociais e políticos. Para a liderança da diplomacia, por exemplo, foi escolhido o socialista espanhol Josep Borrell. O processo teve uma dura derrota para Macron, com a rejeição de sua primeira nomeada, Sylvie Goulard, em meio a acusações de corrupção. Os primeiros candidatos da Romênia e da Hungria também acabariam sendo rejeitados. No fim, a Comissão foi aprovada, substituindo a de Jean Claude Juncker e tendo, pela primeira vez, uma mulher como presidente.

Para a presidência do Banco Europeu foi escolhida Christine Lagarde, que deixou o posto de comando do Fundo Monetário Internacional. Em seu lugar entrou Kristalina Georgieva, que já tinha uma posição de liderança no Banco Mundial. O Conselho Europeu será presidido por Charles Michel, ex-primeiro-ministro da Bélgica.

As eleições para o Parlamento Europeu também acabam servindo como termômetro para a situação política dos países do bloco, e diversas tendências observadas em seus resultados se concretizaram a nível nacional.

Na Grécia, o primeiro-ministro Alexis Tsipras, do partido de extrema-esquerda Syriza, convocou eleições após a derrota nas eleições europeias. Tsipras seria derrotado novamente e, em seu lugar, assumiu Kyriakos Mitsotakis, de centro-direita, que promete acabar com as políticas de austeridade no país, ainda se recuperando da crise econômica de 2013.

Kyriakos Mitsotakis, novo primeiro-ministro da Grécia. [Imagem: Reprodução]

Já na Romênia, a primeira-ministra Viorica Dancila, do Partido Social Democrata (centro-esquerda), viu seu governo ruir em meio a acusações de corrupção direcionadas ao partido e seu líder, Liviu Dragnea, preso neste ano. Dancila perdeu um voto de confiança no Parlamento e as eleições para a presidência do país, derrotada por Klaus Iohannis, de centro-direita. O partido de Iohannis também emplacou Ludovic Orban como primeiro-ministro, no lugar de Dancila, que renunciou à presidência do partido.

A Bélgica teve eleições federais junto com as europeias, mas o resultado mergulhou o país em uma grande instabilidade. O grande vitorioso foi o partido de extrema-direita e separatista Interesse Flamengo, que, junto com o Partido dos Trabalhadores da Bélgica, absorveram muitos votos dos partidos tradicionais. O resultado, decorrente da queda do governo de Charles Michael após a perda de apoio de nacionalistas flamengos, gerou uma grande fragmentação do parlamento. Sete meses após a eleição nenhum governo foi formado e Sophie Wilmès vem atuando como primeira-ministra interina.

Na Finlândia Juha Sipilä, que contava com uma coalizão com a extrema-direita, renunciou ao cargo de primeiro-ministro e convocou novas eleições após não conseguir aprovar uma reforma do sistema de saúde do país. O grande vitorioso foi o Partido Social Democrata, de centro-esquerda, que montou uma coalizão, incluindo o partido de Sipilä, que tornou Antti Rinne o novo primeiro-ministro do país e retirou a extrema-direita do poder. Rinne acabaria renunciando em meio a uma forte greve dos correios, mas seu partido permanece no poder com Sanna Marin, ministra dos transportes, assumindo o cargo. Marin será a mais jovem primeira-ministra do mundo, com 34 anos.

Sana Marin, nova primeira-ministra da Finlândia. [Imagem: Reprodução]

Outro partido de extrema-direita que saiu do poder foi o Liga, na Itália. Tudo começou quando Matteo Salvini, líder da agremiação, decidiu encerrar a coalizão com o partido populista Movimento 5 Estrelas. A ideia era convocar novas eleições e, com a alta popularidade da Liga e de outro partido de extrema-direita, formar um governo encabeçado por Salvini. O que o político não contava, porém, era que o Movimento 5 Estrelas e o Partido Democrático, de centro-esquerda, acabariam unindo forças para manter Giuseppe Conte como premiê e afastar Salvini do poder. A inesperada coalizão segue no comando do país, apesar da forte popularidade da extrema-direita.

Na Suíça, as eleições parlamentares confirmaram uma tendência nos países da Europa Ocidental: o crescimento de partidos ambientalistas. Todos os partidos tradicionais do país, incluindo o Partido Popular Suíço (de extrema-direita) perderam votos e assentos, e apenas os dois partidos ambientalistas do país tiveram aumento significativo de votos. Assim, o Partido Verde deve ingressar no Conselho Federal, órgão executivo do país, substituindo os Democratas Cristãos.

Enquanto isso, na Estônia, a extrema-direita chegou ao poder após novas eleições, apoiando o primeiro-ministro Jüri Ratas. Ratas e o seu Partido do Centro, de centro-esquerda, perderam assentos em relação à eleição anterior e foram obrigados a encontrar parceiros para governar. Apesar do Partido Reformista, de centro-direita e com discurso de renovação da política, ter conquistado mais votos, Ratas conseguiu se manter no poder com uma aliança envolvendo o Partido Popular Conservador, de extrema-direita, e o Isamaa, de direita, marcando uma guinada conservadora no país.

A Moldávia passou quase todo o ano de 2019 imersa em uma grande crise política. Tudo começou com uma eleição parlamentar que gerou uma grande indefinição, com nenhum dos principais partidos  – Partido Socialista (PS), o bloco eleitoral ACUM e o Partido Democrático (PD) – dispostos a formar coalizões de governo. Após ameaças de realização de novas eleições, o ACUM e o Partido Socialista decidiram formar um governo, liderado por Maia Sandu.

O grande problema era que o ACUM se elegeu a partir de grandes críticas aos casos de corrupção do PS e do PD. Temendo punições legais, o PD, influente na Suprema Corte do País, agiu. Com determinações da Corte o presidente Igor Dodon, do PS, foi retirado do poder e Pavel Philip, do PD, assumiu. Após críticas da União Europeia e mobilizações populares, a Corte voltou atrás nas decisões e Sandu assumiu o governo, em meio à fuga do líder investigado do PD, Vladimir Plahotniuc . No fim, porém, ela seria derrubada com um voto de confiança, pelo próprio Partido Socialista, que também temia inquéritos, prometidos por Sandu. Após a queda de Sandu, o Partido Socialista emplacou Ion Chicu como primeiro-ministro, apesar das críticas internacionais à toda ação.

Na Ucrânia, um candidato improvável acabou assumindo o mais importante cargo do país. Volodymyr Zelenski, comediante conhecido por interpretar um professor revoltado com a situação política e econômica do país que entra para a política, foi eleito em meio a uma forte onda de insatisfação da população em relação à corrupção e à elite ucraniana. Zelenski derrotou o atual presidente Petro Poroshenko no segundo turno, com 73% dos votos. Rumores indicam que Zelenski possui laços com o magnata Ihor Kolomoyskyi, rival de Poroshenko e com denúncias de corrupção. Logo após a vitória, o novo presidente disse estar disposto a dialogar com a Rússia para resolver o impasse no leste separatista da Ucrânia.

O comediante Vladimir Zelenski, novo presidente da Ucrânia. [Imagem: Divulgação]

Em Malta, o primeiro-ministro do centro-esquerdista Partido Trabalhista, Joseph Muscat, anunciou que irá renunciar ao cargo no começo de 2020. A decisão veio em meio a protestos da oposição e da população após as revelações de que ministros e pessoas próximas ao premiê estariam envolvidas no assassinato da jornalista Daphne Galizia, que investigava suspeitas de corrupção no alto escalão do governo e do empresariado do país. O Partido Trabalhista deve escolher o sucessor de Muscat, que se comprometeu a garantir a isenção das investigações até sua saída.

A Espanha realizou sua quarta eleição nacional em novembro, resultado da incapacidade do primeiro-ministro socialista Pedro Sánchez de formar um governo após eleições em abril. O pleito foi marcado pela ascensão do Vox, partido de extrema-direita com discurso machista e apoiado em uma negação ao separatismo da Catalunha. Com o partido tornando-se a terceira maior força do Parlamento, Sánchez conseguiu formar um acordo de coalizão com o esquerdista Unidas Podemos, mas o social democrata ainda precisará do apoio de partidos nacionalistas catalães e bascos para ter seu governo aprovado.

Um país que não terá muitas mudanças após as eleições, algo raro atualmente no continente, é Andorra, um dos menores países do mundo. A nação continuará sendo comandada pelos Democratas, de centro-direita, com o primeiro-ministro Antoni Martí sendo substituído por Xavier Espot Zamora.

Mudanças ocorreram, em compensação, na Dinamarca. O Partido Social Democrata (PSD) retornou ao poder com promessas de aumento dos gastos em áreas sociais e um endurecimento do discurso em relação a imigrantes, semelhante ao do Partido Popular da Dinamarca (PPD), de extrema-direita. Com o apoio de partidos de centro-esquerda e esquerda e uma derrocada eleitoral do PPD, o PSD assumiu o governo sob a liderança de Mette Frederiksen, a pessoa mais jovem a ocupar o cargo na história do país.

Mette Frederiksen, nova primeira-ministra da Dinamarca. [Imagem: Claus Bech/EPA/EFE]

Em Portugal o Partido Socialista, de centro-esquerda, conseguiu se manter no poder com um ganho de 22 assentos. António Costa manteve-se como primeiro-ministro português. Mas a Geringonça Portuguesa, apelido que caracterizava o governo de coalizão de Costa com partidos de esquerda, foi substituída por um governo minoritário apoiado esporadicamente pelos mesmos partidos, em meio à perda de votos do Partido Comunista Português e do Bloco de Esquerda para o Partido Socialista.

A Áustria passou por eleições antecipadas após o colapso do governo de Sebastian Kurz. A queda foi motivada por um escândalo envolvendo o líder do partido que formava a coalizão do governo: Christian Strache, líder do Partido Popular da Áustria, de extrema-direita, foi gravado negociando contratos de obras em troca de uma cobertura positiva por veículos de notícia. Com a queda do governo, Brigitte Bierlein, à época presidente da Suprema Corte do país, assumiu como primeira-ministra temporária, a primeira mulher a assumir o cargo. O resultado eleitoral garantiu que Kurz retornasse ao poder, com queda da extrema-direita e crescimento dos ambientalistas, mas o ex-premiê segue analisando possibilidades de composição de governo, com Bierlein ainda no poder.

As eleições na Polônia confirmaram a hegemonia do Lei e Justiça, de extrema-direita, com a adoção de um forte discurso homofóbico na campanha eleitoral. Mesmo com a perda de maioria no Senado, o partido reteve sua maioria absoluta na câmara baixa do Parlamento. A tentativa da união da oposição com a Plataforma Cívica (mais à direita) e a Esquerda não conseguir reduzir o sucesso do partido no poder. Mateusz Morawiecki segue como primeiro-ministro do país.

Em eleições tidas como de fachada por órgãos internacionais independentes, o presidente  Alexander Lukashenko deve manter sua maioria no Parlamento, formada em espécie por independentes, que possuem 89 dos 110 assentos da casa. Lukashenko está no poder desde 1994, quando Belarus se retirou da União Soviética.

Outra eleição com suspeitas de fraudes foram as eleições locais na Rússia. O partido de Vladimir Putin segue forte no país, mas uma forte crise econômica e as críticas a reformas na área gerou vitórias para a oposição. Apesar disso, na maioria dos casos, os vitoriosos foram partidos suspeitos de serem influenciados por agentes de Putin, limitando o grau da derrota do presidente.

No Kosovo, nação que ainda luta para ter o grau de reconhecimento internacional necessário para se tornar oficialmente um país, os partidos de oposição foram os vitoriosos. Hamush Haradinaj, que era o primeiro-ministro do país, renunciou após ser convocado pelo Tribunal Internacional para depor sobre denúncias de crimes contra a humanidade que foram cometidos durante a guerra de independência do Kosovo. Com isso, o pleito resultou na possibilidade de coalizão entre o Auto Determinação, de centro-esquerda, e o Liga Democrática do Kosovo, de centro-direita. É esperado que Albin Kurti, do AD, assuma o cargo de premiê.

A decisão da União Europeia, encabeçada pelo presidente francês Emmanuel Macron, de não dar uma data para o processo de entrada no bloco da Albânia e da Macedônia do Norte irá gerar uma nova eleição no segundo país. Ambos tiveram grandes mudanças políticas para se enquadrar nos requerimentos do bloco, porém a Macedônia teve até que mudar de nome, para Macedônia do Norte, resolvendo um conflito com a Grécia mas incitando o crescimento de movimentos nacionalistas no país. Sem o retorno esperado da UE, Zoran Zaev renunciou ao cargo de primeiro-ministro e convocou novas eleições para 2020. 

Zoran Zaev, premiê social-democrata da Macedônia do Norte. [Imagem: Tomislav Georgiev]

Como a maioria dos países europeus é parlamentarista, o cargo de presidente acaba sendo mais cerimonial, sendo responsável pela representação diplomática e indicação do primeiro-ministro do país. Este ano, os independentes Gitanas Nausėda e Egils Levits foram escolhidos para os cargos na Lituânia e na Letônia, respectivamente. O governista Partido Trabalhista foi vitorioso com George Vella eleito como presidente de Malta. Mas os governistas foram derrotados na Macedônia do Norte por Stevo Pendarovski, um mau sinal para as eleições de 2020.

Uma surpresa ocorreu na Eslováquia.  Zuzana Čaputová foi eleita presidente do país, sendo a primeira mulher a ocupar o cargo. Čaputová, que nunca havia ocupado um cargo eletivo, foi eleita com um discurso de renovação política e mais liberal, favorável, por exemplo, aos direitos da população LGBTQI+ no país, em oposição ao bloco governista, mais conservador. A nova presidente derrotou a coalizão governista e seu partido está em segundo lugar nas pesquisas de opinião para o Parlamento.

Enquanto isso, as força políticas alemãs já se preparam para a saída da primeira-ministra Angela Merkel, que anunciou que não irá tentar a reeleição nas eleições de 2021, quando completará 16 anos no poder. As eleições regionais deste ano confirmaram a tendência de crescimento da extrema-direita no leste do país, tradicionalmente mais pobre que o oeste. Ao mesmo tempo as pesquisas de intenção de voto registram um crescimento expressivo dos ambientalistas e uma queda dos sociais democratas, que podem, a qualquer momento, romper a coalizão atual com o partido de Merkel, líder dos democratas cristãos.

No Reino Unido, Boris Johnson, do Partido Conservador, assumiu o cargo de primeiro-ministro após a renúncia de Theresa May, em meio à incapacidade dela de aprovar, no parlamento do país, um acordo para a saída do Reino Unido da União Europeia, conhecido como Brexit. Muitas vezes comparado ao presidente Donald Trump, Johnson prometeu realizar o Brexit com ou sem acordo aprovado, apesar dos efeitos negativos para a economia caso a segunda opção se concretizasse.

Boris Johnson, atual primeiro-ministro do Reino Unido. [Imagem: CNN]

Em meio a várias derrotas no Parlamento, Johnson expulsou parlamentares do seu partido e até tentou suspender o órgão, mas, mesmo com um potencial acordo firmado com a UE, se viu obrigado a convocar novas eleições. Com um discurso que insistiu na concretização do Brexit e promessas de mais investimentos na saúde e cortes de impostos para os mais pobres, e graças à impopularidade do líder trabalhista, Jeremy Corbyn, Johnson conseguiu o melhor resultado eleitoral do partido em 30 anos, enquanto o Partido Trabalhista teve o pior resultado em quase 90 anos. Mantendo-se no cargo, Johnson já conseguiu a aprovação do Parlamento para o seu acordo, e deve focar em produzir um acordo de comércio com a UE, ao mesmo tempo em que terá que lidar com movimentos nacionalistas na Irlanda do Norte e na Escócia que, fortalecidos após as novas eleições de dezembro, tornam-se uma ameaça real à união do Reino Unido com seus movimentos de separação e política pró-UE.

A Croácia passará por eleições para presidente no dia 22 de dezembro, e tudo indica que a presidente atual, Kolinda Grabar-Kitarović, deve se reeleger. A política de centro-direita, mas que vem sendo acusada de tentar atrair o apoio de grupos de extrema-direita, foi primeira mulher a assumir o cargo. Ela terá como principal adversário o ex-primeiro-ministro Zoran Milanović, representante da centro-esquerda. Os dois irão se enfrentar em um segundo turno, após Milanović ter conquistado o primeiro lugar no primeiro turno.

João Paulo Charleaux considera que 2019 foi “marcado pelo impasse do Brexit e pelo crescimento da extrema direita populista”. O ano teve debates sobre o que seria a identidade europeia em meio a um mundo cada vez mais diverso, e a questão da imigração seguiu forte, em meio a uma deterioração da relação com os EUA. O jornalista considera que países com governos de extrema-direita, como Hungria e Polônia, devem ser o foco das atenções em 2020, junto com os governos que tentam se opor a esse projeto, como a Alemanha e a França, sem falar da questão do Brexit envolvendo o Reino Unido.

 

Oriente Médio

Mapa político do Oriente Médio. [Imagem: EducaBras]

Do ponto de vista eleitoral, Israel foi o país da região que mais passou por turbulências neste ano. A nação teve eleições parlamentares em abril, com o crescimento da aliança liberal Azul e Branca, liderada pelo ex-general Benny Gantz e contrários ao primeiro-ministro Benjamin Netanyahu. O premiê, que enfrenta diversas acusações de corrupção, não conseguiu formar uma coalizão com partidos liberais e religiosos ortodoxos devido às divergências entre os grupos, o que gerou a necessidade de novas eleições.

O novo pleito, porém, trouxe poucas mudanças. A Lista Conjunta, que reúne partidos de israelenses árabes, tornou-se a terceira maior força política do Parlamento, e o partido secular de Avigdor Lieberman também ganhou assentos. Com a incapacidade de formar coalizão, e em meio a brigas internas no partido de Netanyahu, o Likud, pela retirada do primeiro-ministro da liderança da legenda, novas eleições foram marcadas para 2020.

O Afeganistão também realizou eleições neste ano. A participação popular foi extremamente baixa, em especial devido às ameaças do grupo Talibã, retirado do poder após uma invasão norte americana no começo dos anos 2000. O grupo fundamentalista islâmico tenta voltar ao poder, mas ainda enfrenta resistência por parte do governo de Ashraf Ghani e da comunidade internacional. Mesmo com atrasos na divulgação dos resultados e protestos da oposição, Ghani conquistou um novo mandato.

Ashraf Ghani, presidente reeleito do Afeganistão. [Imagem: Emily Jan/NPR]

A região ainda teve eleições de caráter simbólico em países monarquistas, como o Omã e os Emirados Árabes Unidos.

Apesar de, no geral, eleições locais não serem tão significativas quanto nacionais, as da Turquia sinalizam problemas para o presidente Recep Tayyip Erdogan. O seu partido conservador Aliança do Povo teve duas derrotas duras, na capital Ankara e em Istambul, que já foi controlada pelo próprio Erdogan. O partido social-democrata e oposicionista Partido Republicano do Povo levou a melhor em ambos os locais, mesmo com novas eleições em Istambul, devido à proximidade de votos entre os primeiros colocados no pleito original. Após a eleição, políticos importantes deixaram o partido de Erdogan e devem criar suas próprias agremiações, indicando um desgaste do presidente em meio a uma crise econômica.

A Guerra no Iêmen, que ocorre desde 2015 e gerou milhares de mortos, ainda está longe de acabar, mas sinais promissores surgiram em 2019. O conflito é travado pelos Houthis, grupo de uma vertente xiita apoiado pelo Irã, um governo sunita com apoio internacional e em especial da Arábia Saudita e grupos sunitas separatistas no sul do país com apoio dos Emirados Árabes Unidos. No fim do ano, os dois últimos grupos assinaram um acordo de paz e partilha de poder, diminuindo a intensidade do conflito. Conversas entre o grupo xiita e os grupos sunitas no Kuwait, porém, fracassaram.

Apesar de ainda estar ocorrendo, em especial no norte do país, o governo sírio liderado por Bashar Al Assad já vem trabalhando na reconstrução da nação. Em meio a uma ocupação de parte do norte do território pela Turquia, para espantar guerrilheiros curdos (e com a visão da comunidade internacional de que foram abandonados pelos EUA), a oposição e o governo formaram uma Comissão Constitucional. A ideia é que o novo documento atenda aos dois lados e finalize o conflito. Até agora não houve progresso nas negociações.

O ditador Bashar al-Assad conseguiu se manter como presidente da Síria. [Imagem: AFP]

Outra crise em andamento na região envolve o Qatar e seus vizinhos. O país, que sediará a Copa do Mundo em 2022, sofre de um boicote e bloqueio por ar, água e terra da Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes Unidos e Bahrain desde 2017 após acusações de que o país apoiaria grupos terroristas. No fim do ano, porém, atos diplomáticos entre as nações indicaram um retorno do diálogo, sinalizando para uma possível resolução da crise.

Ao mesmo tempo, uma nova crise se formou no Líbano. O país, que engloba grupos sunitas, xiitas e cristãos, possui um sistema de governo em que um representante de cada grupo ocupa o cargo de primeiro-ministro, presidente do parlamento e presidente do país, respectivamente. Durante o governo atual, de Saad Hariri, o país passou a enfrentar uma forte crise econômica, o que motivou protestos, pedindo uma renovação do sistema político e indo contra o controle das elites no país. Os protestos contaram com confrontos inclusive com grupos do Hezbollah, grupo religioso xiita militar. Hariri acabou renunciando e Hassan Diab deve assumir seu lugar, mas a mudança ainda não acalmou os manifestantes.

Hassan Diab, que deve se tornar o próximo primeiro-ministro do Líbano. [Imagem: Hussein Malla/AP Photo]
Outro país que ainda passa por intensos protestos é o Iraque. A revolta da população está ligada a uma alta taxa de desemprego, acusações de corrupção e ineficiência do governo do primeiro-ministro Adel Abdul Mahdi, além de críticas quanto a influência do Irã no país. Mahdi, que havia formado um governo de coalizão entre diversos grupos após eleições em 2018, renunciou após perder apoio de líderes xiitas, em meio ao assassinato de 40 manifestantes por forças públicas. Ainda não se sabe quem assumirá o governo.

Adel Abdul Mahdi, que renunciou ao cargo de primeiro-ministro do Iraque em meio a protestos. [Imagem: Getty Images]

Por fim, o Irã também vem passando por intensos protestos, decorrentes, em especial, do fim dos subsídios governamentais à gasolina no país, o que levou a um aumento substancial do preço do produto e à escassez do mesmo. A insatisfação popular é crescente conforme a situação econômica do país piora, com novas sanções dos EUA. Apesar da retirada dos EUA do Acordo Nuclear com o país, o textos segue em vigor, graças a negociações com países europeus, o que evitará novas sanções de outros países.

Para o professor de relações internacionais Tanguy Baghdadi, 2019 foi o “ano em que diversas crises foram reabertas”. Ele destaca o acirramento da tensão entre Irã e Arábia Saudita, em especial na Guerra do Iêmen, e os conflitos internos no Iraque e no Líbano, importantes para a estabilidade da região. Para Baghdadi, o país do Oriente Médio para se ficar de olho em 2020 é o Iraque. “Instabilidades neste país podem influenciar todo o resto da região”, destaca. 

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