Durante o último final de semana, 27 e 28, os atletas que superaram o corte de meio de temporada se dirigiram à Califórnia para disputar mais uma etapa do Championship Tour 2023. No calendário da competição de surfe desde 2018, o Surf Ranch Pro é realizado na piscina de ondas artificiais de Kelly Slater, localizada em Lemoore, Califórnia.
A vitória de Griffin Colapinto contra Ítalo Ferreira marcou a primeira vez em que o pódio masculino não foi composto totalmente por brasileiros. As edições de 2018 e 2019 tiveram Gabriel Medina como vencedor e Filipe Toledo como vice. Já em 2021, o surfista de Ubatuba superou o de São Sebastião na piscina californiana. Vale ressaltar que a temporada do CT de 2020 foi cancelada devido à pandemia da Covid-19 e, em 2022, a etapa de Surf Ranch foi substituída pela de Trestles.
Pelo feminino, Carissa Moore conquistou seu segundo título no “rancho”, após ter ficado com o segundo lugar na última edição. A vice-campeã foi Caroline Marks.
O próximo evento no calendário do Tour é a etapa de Punta Roca, em El Salvador, entre os dias 9 e 18 de Junho.
Top 10 do ranking do CT [Imagem: Reprodução/Twitter @wsl]
Como funciona o surfe no Rancho?
A piscina do hendecacampeão mundial de surfe cria ondas perfeitas a partir da tecnologia do hidrofólio, uma espécie de pá gigante. A peça é movida por um veículo parecido com um trem ao longo de uma pista de 700 metros. O formato do hidrofólio, sua angulação, velocidade e profundidade movimentam a água de maneira que sejam criadas ondas uniformes e duradouras (entre 45 e 60 segundos). O tempo para que o mecanismo produza uma nova onda é algo em torno de quatro minutos.
Como as condições para a onda são perfeitas, a piscina foi criada com o intuito de ser um palco para a evolução do surfe. Sem depender dos fenômenos naturais, todas as ondas podem ser comparadas entre si. Assim, a qualidade técnica e a ousadia dos surfistas são os fatores primordiais a serem analisados em Surf Ranch.
Estreando um novo formato em 2023, cada surfista tem direito a surfar duas ondas para a direita e duas para a esquerda, sendo que a melhor nota de cada direção passa a compor o somatório da bateria. Na edição de 2023, a fase inicial passou a ser disputada em baterias definidas — seis masculinas e três femininas, com quatro surfistas em cada —, diferente do formato anterior de todos contra todos. A repescagem para os segundos e terceiros colocados das baterias aconteceu ao final do primeiro dia, quando apenas dois homens e uma mulher puderam voltar à disputa. O Finals Day, já no segundo dia, englobou as quartas, semis e final masculinas e as semis e final feminina.
Final feminina: Carissa Moore x Caroline Marks
Caroline Marks, em sua primeira onda para a direita, começou realizando boas rasgadas, mas acabou engolida pelo tubo. Em seguida, a americana foi para sua primeira onda para a esquerda. Com um surfe mais seguro, a atleta realizou boas rasgadas e decidiu por um tubo não tão profundo, conseguindo completar toda a onda. Caroline recebeu, respectivamente, as notas 2.33 e 7.50
Carissa Moore, que durante toda a competição apresentou performances constantes em alto nível, fez uma ótima primeira onda direita. Com rápidas e fortes rasgadas e dois tubos de relativa profundidade, a havaiana garantiu uma primeira boa nota para compor o somatório: 8.60. Na primeira esquerda, Carissa fez outra boa onda e conseguiu 7.93 pontos.
Precisando de 9.03 pontos, Caroline Marks realizou, na segunda tentativa, uma boa onda para a direita, conseguindo boas manobras e um tubo profundo. Com a nota 7.93, a surfista passou a precisar de 8.60 em sua segunda onda para a esquerda. Apesar de ter iniciado com boas manobras, Caroline não conseguiu encaixar um tubo e acabou caindo na tentativa de realizar um aéreo. A nota 6.00, insuficiente para empatar a bateria, sagrou Carissa Moore campeã sem que precisasse surfar suas segundas ondas.
Mesmo assim, a vencedora da etapa decidiu surfar uma onda a mais para cada direção, atingindo as notas 5.33 e 7.60, que não entraram no somatório.
Final masculina: Griffin Colapinto x Ítalo Ferreira
Griffin Colapinto abriu a bateria da final masculina realizando fortes rasgadas e um bom tubo, mas errou a manobra de finalização da onda. Com nota 7.83, o estadunidense foi para a sua primeira onda na esquerda. Colapinto executou boas manobras e um bom tubo novamente — e conseguiu realizar uma ótima manobra de finalização, conquistando 8.70 pontos.
Em sua primeira direita, Ítalo Ferreira começou com rasgadas fortes e segurou um tubo com boa profundidade por vários segundos. Ele ainda conseguiu realizar mais manobras e encaixar um outro tubo antes de finalizar muito bem a onda. A nota 8.13, porém, frustrou o atleta e a torcida brasileira. Na esquerda, seu ponto forte, Ítalo fez uma onda ainda melhor. O surfista norte-rio-grandense executou variadas manobras, incluindo uma aérea, outro tubo com profundidade e finalizou muito bem. Os 8.70 pontos concedidos pelos juízes incomodaram muitos espectadores, que logo foram às redes questionar o critério de avaliação utilizado. Abaixo, uma comparação entre as ondas dos dois surfistas.
Griffin Colapinto voltou à piscina para sua segunda direita precisando de 8.13 pontos para empatar a bateria. Em uma boa performance, Colapinto agrediu muito mais a onda do que na tentativa anterior e executou melhor as manobras, finalizando muito bem. Com a nota 9.07, o estadunidense virou a bateria. Para a segunda esquerda, Colapinto fez boas manobras e tentou realizar um aéreo, mas não conseguiu. A nota 7.00 recebida não entrou em seu somatório.
Ítalo Ferreira precisava, em uma das duas últimas ondas, atingir 9.07 pontos para tornar-se campeão. Na direita, Ítalo fez dois tubos com profundidade e realizou várias manobras com força, incluindo um reverse no meio da onda. A nota 8.43 recebida causou descontentamento no atleta e passou a compor o somatório. Podendo trocar apenas a nota 8.70, Ítalo precisava conseguir 9.34 pontos para virar o jogo. Na esquerda, o surfista caiu após realizar poucas manobras. Assim, Griffin Colapinto sagrou-se campeão da etapa de Surf Ranch Pro pela primeira vez.
Trajetórias brasileiras e polêmicas
Além de Ítalo, outros 6 brasileiros participaram da competição.
Tatiana Weston-Webb, única representante feminina do Brasil no CT, teve um bom começo. Na fase inicial, superou Stephanie Gilmore, atual campeã do mundo, e Tyler Wright, líder do ranking 2023 até o início da etapa do Rancho. Tatiana acabou eliminada na semifinal, contra Carissa Moore, e permaneceu na sexta posição do ranking geral da competição.
Pelo masculino, João Chianca, então líder do ranking mundial, e Yago Dora se despediram do evento nas quartas de final, quando foram superados, respectivamente, por Ítalo Ferreira e Griffin Colapinto.
A bateria mais polêmica do dia também aconteceu nas quartas. O duelo entre Gabriel Medina e Ethan Ewing provocou enorme descontentamento no brasileiro. Medina veio a público após o fim da competição para questionar a inconsistência no julgamento das performances dos surfistas. O inconformismo está relacionado às notas supostamente infladas para atletas de surfe mais conservador (manobras com pouco grau de dificuldade), quando comparadas às recebidas por brasileiros que vêm apresentando um surfe muito mais progressivo.
Filipe Toledo, eliminado na semifinal, juntou-se ao protesto de Medina. O atleta já havia demonstrado decepção com a postura da World Surf League, principalmente após sua eliminação em Bells Beach. Ítalo Ferreira e João Chianca também se posicionaram a favor dos compatriotas, exigindo uma revisão da conduta da WSL.
Em resposta aos brasileiros, Erik Logan, CEO da Liga Mundial de Surfe, publicou uma nota em que nega qualquer tipo de comportamento injusto por parte dos juízes do campeonato. Ele também criticou a atitude dos surfistas, dizendo que “não é apropriado, e é uma violação da política da liga, que os surfistas optem por não se envolver com o processo adequado e, em vez disso, expor suas queixas nas redes sociais”.
*Imagem de capa: Reprodução/Instagram @wsl