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Um ano após trágico acidente, Billy Monger é exemplo de esperança e superação

Por André Netto e Pedro Smith Era só mais um de muitos finais de semana chuvosos na Inglaterra. Os jovens pilotos da F4 Inglesa se preparavam para a prova no lendário circuito de Donington Park, mesmo circuito onde Ayrton Senna ultrapassou quatro carros na primeira volta do GP de 1993,  considerada por muitos a melhor …

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Por André Netto e Pedro Smith

Era só mais um de muitos finais de semana chuvosos na Inglaterra. Os jovens pilotos da F4 Inglesa se preparavam para a prova no lendário circuito de Donington Park, mesmo circuito onde Ayrton Senna ultrapassou quatro carros na primeira volta do GP de 1993,  considerada por muitos a melhor volta da história. O circuito, palco de tantas glórias e grandes batalhas, desta vez seria cenário de um dos mais impactantes acidentes para o automobilismo. O britânico Billy Monger – mais conhecido como Billy Whizz – estava disputando posições quando se deparou com o carro do finlandês Patrik Pasma andando lentamente em sua frente. Sem tempo para reagir, Billy, que no momento estava 193 km/h, acertou em cheio a parte traseira da Carlin de Pasma.

A equipe de resgate precisou de mais de 90 minutos para conseguir retirar o piloto da JHR Developments de seu carro. Em seguida, levaram-no para o Centro Médico de Nottingham, onde foi confirmado que teriam que amputar ambas as pernas do jovem inglês, causando enorme comoção no mundo do esporte automobilístico. Após as primeiras operações, Billy ficou em coma induzido por cerca de 3 dias até ser submetido a novos procedimentos.

Logo após o acidente, a família de Billy Monger criou um crowdfunding (financiamento coletivo através de plataformas online de captação de recursos) com o intuito de ajudar nos tratamentos e terapias para sua recuperação: o objetivo era dar a ele, como dizia a descrição da plataforma, “uma vida plena e ativa [full and active life]”. A história ficou tão famosa que grandes nomes da Fórmula 1, como Lewis Hamilton, Jenson Button, Nico Rosberg, Fernando Alonso, dentre outros pilotos e personalidades do paddock da F1, demonstraram apoio e pediram mais doações nas redes sociais. Button sozinho doou 15.000 libras, o equivalente a quase 74 mil reais, para a campanha. O financiamento acabou rendendo três vezes mais do que era almejado, juntando 840.000 libras, mais de 4 milhões de reais, para a recuperação de Monger.

Juntamente com a campanha, Billy pôde conhecer todos os astros da Fórmula 1 no GP de Silverstone, o qual acompanhou de perto no paddock da Mercedes, principalmente ao lado de Lewis Hamilton.

Billy Monger ao lado de Lewis Hamilton durante o GP da Inglaterra de 2017 (Imagem: Getty Images)

Por que “Billy Whizz”?

Billy nasceu no movimentado vilarejo de Charlwood, a 50 km do centro de Londres e a 2 km do segundo maior aeroporto do país, o Aeroporto Internacional de Gatwick. A dinâmica do lugar já dizia muito sobre seu ilustre habitante: o jovem atleta sempre demonstrou talento nas pistas. Desde seus primeiros campeonatos juniores, Monger já era conhecido como “Billy The Whizz”.

A expressão Whizz não encontra tradução exata para língua portuguesa, já que consiste em uma variação própria da linguagem oral dos subúrbios das grandes cidades inglesas, mas seu sentido remete à alta velocidade, intensidade e potência. Seu significado foi amplamente difundido a classes sociais mais abastadas através do personagem de ficção Billy Whizz, do desenho animado britânico The Beano. Ele tinha o poder de correr incrivelmente rápido e se auto intitulava como “o menino mais rápido do mundo”. Assim, surgiu o apelido utilizado na campanha de “vaquinha virtual” para o piloto.

A surpreendente recuperação

Mesmo no hospital, o jovem inglês já sonhava em voltar a correr, principalmente após conversar com seus mecânicos e relembrar casos como o de Alex Zanardi, que sofreu um grave acidente em setembro de 2001. O italiano, assim como Monger, teve que amputar as duas pernas e correu sério risco de morte. Porém, deu a volta por cima e dois anos depois de seu acidente já estava de volta às pistas. Além disso, Zanardi ainda passou a se dedicar ao esporte paralímpico, competindo no paraciclismo, prova na qual conquistou 4 ouros e 2 pratas olímpicas.

Seis meses depois, o sonho do retorno às pistas parecia estar cada vez mais próximo. Monger fez testes em um carro adaptado da Team BRIT que disputava a Fun Cup, categoria europeia com carros que relembram o Fusca, no circuito de Brands Hatch e os resultados foram promissores. Dez meses depois do acidente, Billy retornou às pistas pela equipe Carlin, mas agora na F3 inglesa, uma categoria acima.

Monger testou diferentes adaptações para seu carro, até que chegou a configuração que mais lhe agradou: o acelerador no lado esquerdo do volante, as trocas de marcha no lado direito e o freio adaptado para sua prótese. Em entrevista à BBC, o piloto disse: “Por 12 anos eu pilotei de uma forma. E agora tudo que aprendi, mudou. É como se alguém falasse: ‘Esqueça tudo que aprendeu e faça de uma forma completamente diferente’”.

Depois de quase um ano de muita luta e superação, no dia 31 de março,  Billy alinhou sua Carlin no grid de largada para sua primeira corrida na F3 Inglesa, no circuito de Oulton Park. Após conseguir um impressionante quinto no lugar na classificação no dia anterior, Billy se aproveitou de um acidente na primeira volta para ganhar duas posições e conseguir um emocionante pódio em seu retorno. O inglês chegou em nono na segunda prova, tendo estabelecido a volta mais rápida do dia e encerrou o fim de semana com um oitavo lugar na última corrida. Atualmente ocupa o sexto lugar na classificação geral, 39 pontos atrás do líder Nicolai Kjaergaard.

Billy Whizz em sua Carlin adaptada na F3 inglesa (Imagem: Jakob Ebrey Photography)

Para Ana Paula Simões, professora instrutora e mestre em Ortopedia e Traumatologia pela Santa Casa de São Paulo, a recuperação de Billy foi “com certeza surpreendente, absurda, fora de qualquer padrão”.

“Há muitos fatores a favor dele: tem uma premissa que, nos atletas, pelo fato do condicionamento físico já ser mais desenvolvido, o processo de reabilitação é, com certeza, mais rápido do que uma pessoa que não pratica esporte. A pessoa que pratica esporte já tem uma memória muscular e condicionamento que facilitam muito a recuperação. Provavelmente, foi por conta disso que ele voltou tão rápido. Além disso, é lógico que a cirurgia já foi pensada em protetização, já voltada para a reabilitação: o coto [parte do membro que fica após uma amputação] já fica bem ‘fininha’. Eles já fazem de uma forma a protetizar o mais rápido possível. E, pelo fato dele ter condições [principalmente, após o grande montante levantado nos projetos de financiamento coletivo], a prótese que ele está usando é ‘top de linha’ do mercado: com carbono bem leve, articulada e tudo mais. Além de tudo, ele tem 17 anos, o que torna o processo muito rápido de readaptação”, ressalva a colunista do programa “Eu Atleta”, das organizações Globo.

A médica, membro internacional da Federação de Medicina Esportiva, ainda atenta para a complexidade em uma das amputações: “Ele [Billy Monger] amputou as duas pernas em dois níveis diferentes: uma amputação foi transfemural [acima do joelho] e a outra transtibial [no meio da perna, na região da tíbia, popularmente conhecida como ‘canela’]. A primeira acaba sendo, de certa forma, um pouco mais difícil: quanto mais alta pior. Amputações nas desarticulações [a transtibial, por exemplo] são de mais fácil recuperação. Quanto mais deixar a perna, principalmente a articulação, melhor para poder protetizar menos. Essa do joelho, que foi lá em cima no fêmur, deve ser a perna que ele vai ter mais dificuldade e mais tempo de recuperação. Mas, até para amputações no meio da perna, a recuperação é surpreendente: um processo normal talvez demora de 6 meses a 1 ano para a recuperação da cirurgia e adaptação da prótese. Ele realmente foi acima da média”.

O mundo se emociona

A comunidade esportiva internacional comoveu-se com a recuperação e a força do jovem piloto. Seu retorno às pistas – intitulado de “Billy Whizz is Back” (“Billy Whizz está de volta”) – foi indicado à categoria de Melhor Momento Esportivo de 2017 pela Laureus World Sports Academy (o Oscar do esporte). Essa é a mesma categoria que foi vencida pela superação e volta aos campos dos atletas Alan Ruschel, Jackson Follmann e Neto, envolvidos na tragédia do avião que levava os atletas da Chapecoense à final da Copa Sul-Americana de 2016.

Billy Monger na premiação do Laureus em Mônaco (Imagem: Boris Streubel/Getty Images Europe)

Além do Laureus, Billy recebeu uma homenagem do Presidente da FIA (Federação Internacional de Automobilismo) durante a cerimônia de premiação dos melhores da temporada de 2017, e foi ovacionado por todo o luxuoso Palácio de Versallhes.

Apesar do apoio de celebridades e nomes marcantes do esporte, bem como indicações e convites aos maiores e mais luxuosos eventos do mundo esportivo, Billy afirma, em nota de agradecimento a todo o suporte e carinho recebido, através de sua conta no Twitter, que “a única verdadeira heroína neste evento trágico tem sido minha irmã Bonny, que fez despertar em mim a vontade de continuar lutando, um valor que eu continuarei levando comigo de agora até ao resto da minha vida”.

Billy Monger é exemplo de superação, humildade e maturidade. Apesar da pouca idade, o jovem atleta é exemplo de esperança e irradia alegria a todos as suas voltas. Na cidade de Charlwood, famosa pelo céu congestionado pelo tráfego aéreo, é ele, Billy “The Whizz”, quem mais brilha, alçando voos cada vez mais altos.

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