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Ao infinito e além: você sabe o que é apeirofobia?

Tudo à nossa volta parece ter começo, meio e fim. Tentar projetar algo que seja infinito pode ser difícil para a mente humana e o grande medo disso tem nome: apeirofobia

Por Nathalie Rodrigues (nathalie.rodrigues@usp.br)

Muitas pessoas que tiveram algum contato com religião já devem ter se deparado com o conceito de vida eterna. Ou, se você já estudou algo sobre o universo, com certeza já ouviu alguém dizer que ele não tem fim. O que para alguns é incrível, para outros pode ser bem assustador. A ideia de algo que seja infinito ou eterno, de certa forma, é confusa, afinal, ainda não presenciamos algo comprovadamente sem fim. A boa notícia é que o medo do desconhecido é uma reação comum. A má notícia é que se esse medo se torna desproporcional e persistente, possivelmente se trata da apeirofobia: o medo irracional do infinito e da eternidade.

A apeirofobia pode até ter um nome bem estranho, mas fica mais fácil entender o que é quando descobrimos a origem da palavra: ápeiron, do grego, traduzido como “ilimitado” ou “infinito”. Logo, apeirofobia significa a sensação de medo irracional do conceito de infinidade.

Assim como em outras fobias, os sintomas para quem sofre desse transtorno podem ser chamados de “respostas fóbicas”, classificadas em três níveis: fisiológico, motor e cognitivo. No nível fisiológico, as respostas que o corpo apresenta são físicas, e podem ocorrer em forma de taquicardia, transpiração em excesso, boca seca, falta de ar, palidez e desconforto estomacal. Já no nível motor, as respostas são comportamentais e podem incluir evitação imediata, voz trêmula, rigidez e movimentos involuntários. O nível cognitivo se refere ao emocional, à percepção, memória e raciocínio, logo são respostas comuns o questionamento da própria capacidade de lidar com a situação e interpretações negativas sobre ela.

Escadaria em caracol, que dá a impressão de ser infinita.
Escadaria infinita. [Imagem: Adrien Olichon/Pexels]

A psicopedagoga Priscila Assis explica que é comum a apresentação de sintomas de ansiedade em pacientes com alguma fobia. Mas, como todo caso, é necessário que seja investigada a origem do problema, pois, muitas vezes, pode estar relacionado a uma experiência traumática na qual a causa da fobia seja uma forma de gatilho para esse trauma.

Para Sigmund Freud, o pai da psicanálise, toda histeria está relacionada a um trauma. Para ele, os traumas, apesar de representarem uma experiência impactante e embaraçosa, também são constitutivos. Ele explicava que são divididos em duas partes, ou seja, um acontecimento que se dá em dois tempos: o primeiro geralmente não comporta sentido, portanto, o paciente o esquece. Após um intervalo de tempo (o que chama de latência) ocorre o segundo encontro, o qual reativa as sensações do primeiro. Esse processo de reencontro torna a experiência significativa para o paciente.

O caso de Débora Liao, autora de um post no blog Garotas Geek que fala um pouco sobre sua experiência com a apeirofobia, ajuda a ilustrar o transtorno. Ela relata que, por volta de seus dez anos, a ideia de algo interminável era apavorante. Sua primeira crise de pânico ocorreu quando começou a pensar sobre como funciona o céu e o conceito de vida eterna. Ela lidava com isso tampando os ouvidos e cantando alto para dispersar os pensamentos. No entanto, outros sintomas eram inevitáveis: “Mal estar, ansiedade, palpitações, suor gelado, náusea, crise asmática”, conta na publicação. 

Teoricamente, isso ocorre porque o nosso cérebro tem capacidade cognitiva limitada para compreender algo que nunca experienciamos, e há quem diga que a apeirofobia relacionada ao conceito de vida eterna pós morte pode estar relacionada com o medo da própria morte, como uma forma de sua expressão. 

Quando nos referimos a infinitos físicos, por exemplo, elementos astronômicos, a professora Daniela Vieira, do Departamento de Matemática do Instituto de Matemática e Estatística da Universidade de São Paulo (IME-USP), menciona que, em teoria, o conceito de infinito é simples: “Para cada número podemos sempre tomar o próximo número, podemos somar +1 e +1 e +1… e que esse processo de tomar o próximo número pode ser feito sem nenhuma restrição ou limite”.

“Uma diferença sutil que às vezes as pessoas fazem é confundir o infinito com algo muito grande, porém mensurável”

Daniela Vieira

Mas então como comparamos os infinitos? Se considerarmos dois conjuntos, um de números naturais (1, 2, 3, 4, …) e outro de números naturais pares (2, 4, 6, 8, …), qual deles seria o maior? Nesse caso a resposta não seria tão simples, pois se para cada número natural associarmos um número par do outro conjunto, ainda teríamos infinitas duplas de pares, não sobrando nenhum número para determinar qual grupo seria o maior ou o menor. 

O matemático David Hilbert propôs um paradoxo para explicar o quão pouco intuitivo é pensar nos infinitos. O Paradoxo do Hotel Hilbert supõe que exista um hotel com infinito número de quartos e todos estão ocupados. Apesar de não haver quartos disponíveis, quando um hóspede novo chega, o Sr. Hilbert solicita para que o hóspede do quarto 1 se mude para o quarto 2, o do quarto 2 para o quarto 3, o do 3 para o 4 e assim sucessivamente, para que o novo hóspede possa ocupar o quarto 1. Na noite seguinte, esse hóspede não somente retorna para se acomodar no hotel novamente, como também traz seus infinitos amigos. Para isso, o Sr. Hilbert pede que cada hóspede se mude para o quarto que seja o número do seu quarto anterior multiplicado por 2, ou seja, se o seu quarto é N, deverá se mudar para o quarto 2N. Assim, os infinitos amigos do novo hóspede também poderão se acomodar.

Imagem de vários quartos um ao lado do outro: os quartos do Hotel Hilbert, que ajudam a entender a ideia de apeirofobia.
Quartos do Hotel Hilbert. [Imagem: John Lee /Pexels]

É compreensível que esses conceitos pareçam angustiantes de início, afinal, convenhamos que um prédio infinito seria algo bem assustador de se ver — o elevador poderia realmente demorar uma eternidade para chegar. Mas acima de tudo, é importante reforçar que o medo do desconhecido é natural, porém, se esse medo começa a controlar sua vida é necessário buscar ajuda para lidar com ele.

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