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As eleições das fake news

Professores, jornalistas e pesquisadores se reúnem para discutir o papel da internet e os rumos das campanhas eleitorais de 2018   Por Mariah Lollato Um sofá e uma poltrona aguardam solitários no palco do Teatro Cásper Líbero. Ao lado, cartazes com os dizeres: “Vaza falsiane, curso online contra notícias falsas”. O auditório vai se enchendo. …

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Professores, jornalistas e pesquisadores se reúnem para discutir o papel da internet e os rumos das campanhas eleitorais de 2018

 

Por Mariah Lollato

Um sofá e uma poltrona aguardam solitários no palco do Teatro Cásper Líbero. Ao lado, cartazes com os dizeres: “Vaza falsiane, curso online contra notícias falsas”. O auditório vai se enchendo. Futuros comunicadores passam a ocupar a maioria dos assentos do local.

É difícil dizer o que são fake news. Segundo Pablo Ortellado, professor de Gestão de Políticas Públicas da Universidade de São Paulo (USP), presente no evento, a expressão nasceu no calor das eleições estadunidenses de 2016: não teve origem acadêmica, por isso não tem significado claro. Neste 2 de agosto, pesquisadores, professores e jornalistas compareceram a duas mesas organizadas pela Faculdade Cásper Líbero para discutir o assunto. Falaram também de eleições, novas formas de mídia e possíveis conexões entre estes temas.

“Talvez ‘verdadeiro e falso’ não sejam os melhores conceitos para definir as fake news”. É com essa frase que Rodrigo Ratier, professor de jornalismo da Cásper, começa sua apresentação. Apesar das incertezas, busca uma definição mais exata para o termo. “São notícias que viralizam nas redes sociais, imitam o estilo jornalístico para enganar as pessoas, contêm informações comprovadamente mentirosas, e não têm autoria clara.”

A internet, portanto, conforme essa definição, é o terreno fértil para a proliferação das fake news. Beatriz Martinez e Gustavo Ramos, alunos de jornalismo que assistiam ao debate, afirmam ter contato com elas em grupos de WhatsApp e pelo Facebook.

Já “desinformação” tem um significado mais amplo, segundo Rodrigo. É o que acontece quando um conteúdo não chega de forma correta ao receptor e isso faz com que ele acredite em algo que não é verdade. É, por exemplo, estar erroneamente informado ao ler ou assistir a um jornal, ou ao ter contato com qualquer outra fonte que acredita-se portar a verdade — como uma peça publicitária ou uma mensagem de WhatsApp. As fake news são uma das formas de desinformação, mas não a única.

Em sua fala, Rodrigo menciona que uma das maneiras de gerar desinformação ocorre quando um veículo não traz relatos de forma imparcial e com distanciamento. Laura Capriglione, jornalista do portal Jornalistas Livres, discorda. Para ela, “a ideia da objetividade no jornalismo é uma mentira”. Não transpor tendenciamento ao narrar um fato, mesmo que de forma inconsciente, é impossível. Assim, Laura levanta uma questão importante no que abarca o combate à desinformação: a necessidade de que quem emite uma informação como verdade deixe claro seu posicionamento, para que o receptor possa levá-lo em consideração ao formular opiniões.

A jornalista relembra as Jornadas de Junho de 2013, quando diversas pessoas tomaram as ruas. Inicialmente, contestavam o aumento nas tarifas do transporte público. Depois, as demandas das manifestações se expandiram. A população passou a protestar também contra a corrupção e o cenário de descaso político no país. Foi a maior mobilização popular ocorrida no Brasil desde o impeachment de Fernando Collor de Mello, em 1992.

Durante esse período, a violência policial direcionada aos manifestantes era recorrente. Laura conta que “foi aí que começou a onda de contra-narrativas da mídia independente”. Surgiu como forma de se opor ao que noticiavam os grandes veículos da época, muitas vezes coniventes com a repressão. Por conta da ideia de que estes veículos podiam narrar fatos com objetividade, o que propagavam era tido como verdade absoluta. A mídia independente, por meio da internet, trazia outro ponto de vista sobre a história.

Pollyana Ferrari, professora de jornalismo da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), faz uma ressalva. “É um problema quando os grandes veículos se apoiam no debate sobre as fake news para se dizerem os únicos isentos de notícias falsas.” As fake news são compartilhadas online, mas em nada tem a ver com a mídia independente.

Pablo Ortellado presenciou o nascimento da internet. Fala de sua dicotomia. “Acreditávamos que o aumento do número de meios de comunicação melhoraria o acesso à informação, porque acabaria com o monopólio da verdade.” De fato, isso ocorreu. O mesmo terreno que possibilita a propagação das fake news, segundo a definição de Rodrigo, abre espaço para diferentes narrativas sobre um mesmo fato.

Polarização política e as relações na internet

Segundo Leonardo Sakamoto, professor de Jornalismo da PUC-SP, presente no debate, pessoas sentem que as redes sociais são um ambiente seguro para expressarem opiniões de maneira superficial. Não têm que lidar pessoalmente com as consequências disso. Esse é o combustível que as fake news precisam para serem compartilhadas. Quando uma informação está de acordo com o posicionamento de quem a recebe, ela é passada adiante, sem que haja checagem dos fatos. É uma maneira simples de provar um ponto de vista.

Sobre a internet, Leonardo, afirma: “Já passamos da infância, fase da crença em um espectro puramente bom. Estamos na adolescência. Não pensamos duas vezes antes de agir. Acredito que ainda chegaremos na fase adulta. Saberemos usá-la com responsabilidade, mas ainda não estamos lá.”

A polarização política é latente, afirma Pablo. Encontra nesse cenário terreno fértil para existir. O candidato mais polêmico à presidência, Jair Bolsonaro, terá apenas sete segundos televisionados no horário eleitoral obrigatório. Conta com sua popularidade nas redes sociais para angariar votos. Ali, pessoas se digladiam sem que tenham que encarar rostos. Pablo não enxerga melhora a tempo das eleições. “Será um período em que a polarização se acentuará”.

Para Laura, algo mais deve ser observado. A internet possibilitou que coletivos LGBT, negros e feministas pulverizados pelo país se unissem. “Hoje gays, lésbicas e trans estão exibindo seu amor.” A polarização é consequência do atrito entre esses grupos e quem é contrário ao fenômeno. “Ela é um grito pelo direito de existir. Quando alguém diz não a isso, está pedindo que se cale o lado que sempre esteve calado.”

Mas “existe ainda vida fora da batalha nas redes sociais”, diz Leonardo. Segundo ele, autor do livro “O que aprendi sendo xingado na internet”, e Pollyana, autora de “Como sair das bolhas”, a alternativa é o diálogo. “Temos que olhar para o outro como alguém com quem podemos conversar”. Thiago Bio, aluno de jornalismo da Faculdade Cásper Líbero, que assistia às discussões, também enxerga melhora a longo prazo. “Eu acredito que é possível, mas é um caminho a ser trilhado. Não será fácil.”

Ao final, a mensagem que deixam é a de um mundo em transformação. Tenta-se entender de dentro a História. Online, olho no olho, falando, ouvindo – existir hoje é, irremediavelmente, ser parte dessa transformação.

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