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Space opera: da ficção à realidade

Com certeza, você já assistiu a alguma produção que falava sobre exploração espacial ou habitação em outros planetas. Ou, pelo menos, já ouviu nomes como Interestelar, 2001: Uma odisséia no espaço, a série The 100 e a saga Star Wars. Esse subgênero da ficção científica conhecido como space opera continua fazendo muito sucesso e batendo …

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Com certeza, você já assistiu a alguma produção que falava sobre exploração espacial ou habitação em outros planetas. Ou, pelo menos, já ouviu nomes como Interestelar, 2001: Uma odisséia no espaço, a série The 100 e a saga Star Wars. Esse subgênero da ficção científica conhecido como space opera continua fazendo muito sucesso e batendo recordes de bilheteria (O despertar da força, por exemplo, com o lucro de dois bilhões de dólares), mas ainda fica a dúvida: por que gostamos tanto da temática? 

No documentário A história da ficção científica, de James Cameron, diversos produtores de cinema se reuniram para discutir a respeito. Para James Gunn, diretor da série de filmes Guardiões da Galáxia, que ganhou o prêmio de melhor filme de ficção científica em 2017, produzir filmes desse estilo é criar um mundo no espaço sideral com base em regras reais, cheio de imaginação e intensidade, adequando a realidade em meio à ficção. O ator e produtor canadense, Keanu Reeves, que também participou do documentário, considera o subgênero uma forma de passar uma mensagem social, vendo em suas produções um mundo diferente, mas que ainda lida com a realidade.  

De acordo com Deyse Brandão, bacharel em comunicação e doutoranda em antropologia social, essa verossimilhança vem do questionamento do homem sobre si mesmo. Segundo ela, o homem nunca parou de refletir e interrogar sobre si mesmo e vê na ficção uma forma de entender a sociedade pelas suas diferentes representações. As narrativas, assim, fazem parte de um universo artístico que tem como ponto crucial a criação de imaginários sobre nós mesmos, sobre nossas condições, como uma metáfora do próprio presente. 

A bacharel ainda fala em como a ficção científica trabalha com o imaginário dentro de um determinado contexto social. “Se a ficção científica é um modo de “sonhar” com coisas novas? Talvez. Mas para além de sonhar, é trazer reflexões sobre situações atuais.”

 

Mas afinal, até onde vai a ficção?

Nas produções de space opera, muitas criações apresentam um universo similar ao nosso, se abstendo de determinadas leis da ciência, o que torna tudo aparentemente mais fácil. Na realidade, não é bem assim. 

Para começar, quando falamos de vida em outros planetas, não basta somente querer habitar outros mundos, como também são necessárias uma série de condições básicas para que isso seja possível. A primeira delas é encontrar planetas localizados numa zona habitável, como diz Eduardo Janot Pacheco, professor sênior do Departamento de Astronomia do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (IAG-USP). Essa área corresponde a uma distância razoável do Sol, o que resulta em temperaturas propícias para a vida e com chance de encontrar água em seu estado líquido (de 0 a 100 ºC), essencial para os processos biológicos. A presença de atmosfera também é fundamental, visto que essas camadas de gases protegem o planeta de radiações que são prejudiciais para nós, como os raios gama, e regulam a temperatura. 

Ana Carolina Carvalho, doutora em biotecnologia pela USP e pesquisadora na área de microbiologia com aplicação em exploração espacial e astrobiologia, também destaca que, ao notar a existência de uma atmosfera, já é possível estudar seus gases constituintes e definir se há possibilidade de vida no local. Com base na vida que conhecemos, o oxigênio é o gás essencial para os processos vitais do nosso planeta, utilizado na respiração da maioria dos seres vivos. Entretanto, em Marte, sabemos que há uma grande presença do dióxido de carbono (CO2) no ambiente, por isso somente microrganismo anaeróbios (aqueles que não necessitam de oxigênio para o crescimento) conseguiriam viver lá. 

Os extremófilos, por outro lado, são organismos estudados pela pesquisadora que conseguem se adaptar e viver em condições extremas, tais como grandes variações de temperatura, altos índices de radiação ou em lagoas hipersalinas, que é o caso de Marte. “A vida é extremamente adaptável a diferentes condições. Sabemos de fungos que vivem em Chernobyl e que utilizam a radiação como fonte de energia para sobreviver”, relata a Dra. Ana Carolina.

No entanto, mesmo com a descoberta de organismos capazes de sobreviver a condições extremas, nós, seres humanos, ainda somos muito afetados por particularidades do planeta vermelho. Uma delas é a atmosfera rarefeita de Marte que ocasiona temperaturas muito baixas, com valores inferiores à 0º C no equador durante o verão e também acarreta na não contenção da radiação, causando uma incidência de raios nocivos na superfície terrestre. Outra questão é seu solo rico em ferro e em alguns tipos de sais, com grande presença do perclorato, prejudicial à vida como um todo. Uma alternativa possível seria terra formatar o planeta, ou seja, moldá-lo a fim de que se torne habitável. Para isso, seriam colocadas bactérias que, produzindo gases e liberando gás carbônico, vapor d’água, metano e outros elementos, conseguiriam recriar o efeito estufa e regular a temperatura de Marte. Entretanto, somente após milhares de anos conquistariam um resultado favorável à vida, além de ser um procedimento complicado e com muitos gastos. 

Imagem de Marte feita pelo Rover Curiosity. Imagem: Reprodução NASA.
Imagem de Marte feita pelo Rover Curiosity. Imagem: Reprodução NASA.

Para não precisar realizar todo esse processo, outros planetas similares à Terra já foram encontrados. A sonda Kepler, lançada em 2009 pela NASA, tinha como objetivo explorar o maior número de estrelas possíveis em busca por planetas, principalmente aqueles com características semelhantes às da Terra. Observando o espaço, foram encontrados por volta de cinco mil planetas numa pequena região. O professor de astronomia da USP explica que, tomando por base esses dados, é possível fazer uma aproximação da quantidade de planetas similares em toda a galáxia. “Pelos cálculos, estima-se cerca de 15 bilhões de planetas como a Terra, com certeza acharemos vida em pelo menos mais um“, conclui.

Entretanto, mesmo encontrando lugares parecidos com a Terra, ainda é um desafio superar as distâncias entre um planeta e outro. Uma alternativa muito abordada na ficção científica para resolver esse problema é a viagem na velocidade da luz, ou seja, numa velocidade de aproximadamente 300 mil quilômetros por segundo. Hoje, a proposta é impraticável devido às leis da física. Janot explica que quanto mais um corpo com massa  acelera, mais ele gasta energia, e por isso precisaria de uma carga infinita para chegar na velocidade da luz. Outro empecilho é que quanto mais aumenta a velocidade, mais violenta fica a quantidade de energia necessária, e não conseguimos desenvolver atualmente um combustível ou meio de propulsão capaz de atingir sequer 30% da velocidade da luz. De fato, as maiores velocidades atingidas por foguetes no momento são de 20 a 30 mil quilômetros por hora, nem mesmo 1% da velocidade da luz. 

Uma possível solução comentada por Janot seria embarcar casais de maneira voluntária em naves com destino a um planeta habitável, numa trajetória que demoraria anos. Dessa forma, os casais iriam se reproduzindo, tendo filhos, netos, bisnetos, com uma geração substituindo a outra até chegar ao destino final. Para isso, seria preciso fazer a própria manutenção da vida no espaço, com a reciclagem de oxigênio, água e o cultivo de alimentos em órbita, como retratado na série The 100, além de reaproveitar elementos orgânicos. Entretanto, Janot alerta para os problemas que esse sistema poderia vir a apresentar: “É possível, mas poderia gerar conflitos pessoais, motins, revoltas. Psicologicamente é muito complicado. Já pensou nascer num foguete, crescer e saber que morrerá lá também?”. 

Longe desses conflitos, uma das  soluções recorrentes na ficção para superar o tempo das viagens é a utilização das cápsulas de sono criogênico ou de hibernação, como nos filmes Interestelar e Passageiros, respectivamente. A criogenia é um procedimento realizado atualmente para preservar o corpo de pessoas que morreram para que, daqui a alguns anos, caso descubram a cura para a causa da morte do paciente, consigam reavivá-lo. O grande desafio do sono criogênico em pessoas é fazer a devida preservação dos órgãos sem que congelem. Como o corpo humano é composto 70% de água, quando estas moléculas congelam, formam pequenos cristais pontiagudos, os quais seriam responsáveis por perfurar os tecidos do corpo. Já a hibernação é um método estudado pela NASA e pela Agência Espacial Européia (ESA), baseando-se na diminuição da atividade corporal. O procedimento em animais acontece pelo resfriamento do corpo e baixa na frequência respiratória, o que faz com que fiquem em um estado de dormência por semanas ou meses, utilizando suas reservas de energia. Em humanos, o obstáculo é fazer uma rápida alteração na temperatura corpórea sem comprometer a saúde do paciente.  “A gente já tem exemplos bem sucedidos na natureza de organismos complexos fazendo isso, diferente da criogenia” comenta a Dra. Ana Carolina.

Cápsulas de hibernação humana no filme ‘Passageiros’. Imagem: Reprodução ‘Passageiros’.

Se nenhuma dessas opções não funcionar no momento, não há motivo para preocupação. Segundo Janot, a vida na Terra não ficará comprometida tão cedo e isso só ocorreria de maneira orgânica daqui a quatro bilhões de anos, com a dilatação do Sol. Enquanto isso não acontece, temos um bom tempo para avançar a tecnologia e os estudos até, enfim, dar vida às histórias da ficção.

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