A MTV Brasil acabou. Um canal que nasceu com a improvável missão de falar e tocar música na TV aberta. Que por quase 23 anos de transmissão, inventou na televisão, e se reinventou inúmeras vezes. Na difícil proposta de um canal para o público jovem, a MTV acabou se tornando um palco para a ousadia e inovação, carregando a responsabilidade de crescer junto à uma geração.
Mais do que uma alternativa à novelas ou uma opção para madrugadas insônes, ela se tornou importantíssima no universo cultural brasileiro. A MTV brasileira nasceu com uma proposta diferente da maioria das concessões da marca no resto do mundo, que costumam se estabelecer com um formato semelhante à MTV americana. De acordo com Eduardo Vicente, professor do departamento de Cinema, Rádio e Televisão da Universidade de São Paulo, essa proposta específica se relaciona com as particularidade do mercado musical brasileiro. A Associação Brasileira de Produtores de Disco (ABPD ) estima que em 2011, 73,5% das vendas de discos, DVDs e Blu-rays no Brasil foram de artistas nacionais. “O fim da MTV pode demarcar uma redução da importância da música brasileira, ainda mais em segmentos como rock, o pop e o hip-hop, que tem pouco espaço em outros meios”.
Nem só de música e de glória viveu o canal. Em 1998, o Grupo Abril, proprietário da emissora, fundou sua própria gravadora, Abril Music. Iniciou-se um distanciamento da identidade do canal para dar lugar às preferências da gravadora. “A Abril Music surgiu com aspirações de ser uma das maiores gravadoras do mercado. Mas acabou tendo uma trajetória trágica, e foi desativada alguns anos depois. A partir de sua segunda década, começou a se dedicar a outros mercados, focando em reality shows, humorísticos, e expandindo seu alcance para os mais diversos gêneros, para competir diretamente com a TV por assinatura. E se adaptando às transformações no mercado musical. Segundo Eduardo, o videoclipe, que foi essencial para o estabelecimento da MTV, passou a ter menos importância.
Uma das lacunas deixadas pela emissora será principalmente o de cumprir o papel de crítica especializada, legitimando artistas de gêneros como rock e rap, e dando espaço a bandas e artistas independentes, que não tem espaço em mídias como rádio, e acabam se perdendo na quantidade de música na internet. “A cultura de internet no Brasil não cria artistas de grande repercussão. Diferentemente de países com EUA e Reino Unido, a internet não consegue legitimar – sozinha – um artista no Brasil”, afirma Eduardo. Apesar de todos os novos investimentos nesta área por bandas alternativas. Além disso, havia uma grande ousadia estética na programação, com vinhetas experimentais e uma construção audiovisual diferenciada.
A Viacom, dententora da marca MTV, dará continuidade na TV a cabo. Não só o “Brasil” será omitido, mas haverá também uma perda da identidade do canal. A partir de outubro, a emissora se tornará apenas uma reprodução do modelo norte-americano, no qual a música fica em segundo plano.
A MTV Brasil foi, independentemente de erros e acertos, um marco na história da televisão, essencial para a formação musical brasileira e principalmente marcante para o jovem brasileiro. Programas humorísticos que desafiavam o senso comum, entrevistas inusitadas, clipes em primeira mão, shows históricos, e apresentadores marcantes. Uma alternativa aos canais tradicionais, à programação repetitiva das grandes emissoras, e com uma participação imensurável na cultura brasileira.
Veja também o vídeo promocional lançado pela MTV Brasil.
http://www.youtube.com/watch?v=DkW_1WN_ZZE
por Thiago Quadros
thiagoquadrosm@gmail.com