Jornalismo Júnior

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A desumanidade representada no Holocausto nazista

O garoto que seguiu o pai para Auschwitz, escrito por Jeremy Dronfield e publicado pela Companhia das Letras em 2019, traz uma história real sobre pai e filho judeus que sobreviveram a alguns campos de concentração durante o Holocausto. A companhia familiar e o amor que tinham um pelo outro foram as principais ferramentas para …

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O garoto que seguiu o pai para Auschwitz, escrito por Jeremy Dronfield e publicado pela Companhia das Letras em 2019, traz uma história real sobre pai e filho judeus que sobreviveram a alguns campos de concentração durante o Holocausto. A companhia familiar e o amor que tinham um pelo outro foram as principais ferramentas para sua sobrevivência.

O livro conta a história de uma família judia habitante de Viena, composta por Tini, a mãe, Gustav, o pai, e Edith, Herta, Fritz e Kurt Kleinmann, filhos do casal. Os Kleinmann possuem poucos bens materiais – vivem em um lugar humilde, com apenas dois cômodos, sendo um deles o quarto onde todos dormem, dividindo as camas. Mas consideram o ambiente um lar, e são felizes. A vida das personagens, no início, é como a de qualquer indivíduo, com problemas e alegrias cotidianos. 

A condição da família como judia não é algo muito forte. Não são judeus ortodoxos, ou seja, não seguem todos os dogmas da religião, e Gustav considera-se mais um cidadão austríaco do que judeu. Durante a década de 1930, a Áustria era fascista e não tinha nenhuma política oficial de segregação. Porém, tudo é mudado com a Anschluss, a anexação austríaca pela Alemanha, em 1938. A partir daquele ano, o Estado austríaco é incorporado ao nazista e adota suas doutrinas. O ódio ao povo judeu passa a ser mais comum e explícito. Ao se tornar política de Estado, essa aversão intensifica-se com a criação de guetos e campos de concentração para enviar inimigos do Estado Nazista – judeus, comunistas, homossexuais, ciganos, entre outros.

A história se distingue por ser narrada em terceira pessoa, mostrando a perspectiva de cada membro da família. Isso é importante para expor a pluralidade de vozes em qualquer narrativa, o que torna o discurso mais democrático. Em alguns momentos há até discurso indireto livre: “Tini fez meia-volta e atravessou de novo o mercado apinhado, dessa vez na direção de casa. Independentemente do que acontecesse no mundo, por mais perto que estivesse do perigo, a vida seguia em frente: o que a pessoa poderia fazer a não ser vivê-la?” (p. 25).

Outro diferencial está no fato de ir além de uma “história real”, pois é uma narrativa muito bem detalhada, próxima de um livro-reportagem. Foi escrita a partir do diário que Gustav manteve enquanto esteve preso, além de relatos e entrevistas dos protagonistas e demais membros da família, jornais, autobiografias, cartas e documentos oficiais. Tudo expresso de maneira literária, de modo a tornar a história mais real e próxima de quem lê. 

A preocupação do escritor de narrar da forma mais verdadeira possível é mostrada na descrição do clima de alguns dias: “O vento cortante de 30 graus negativos o golpeou com força. (…) A lua minguante, que apenas dois dias antes estava cheia, brilhava com força no céu, lançando um clarão espectral por toda a paisagem nevada, contra a qual qualquer forma em movimento seria nitidamente visível.” (p. 18). 

Passagens assim aparecem em alguns momentos do livro, e são baseadas em um site de pesquisa de clima a partir da data, do horário e do local. A origem das informações é divulgada no final do livro, onde há a fonte de todas elas. Nesses momentos, a história recebe um tom mais poético e literário, além de a verificação de fatos atribuir maior credibilidade à veracidade do enredo. 

Gustav e Fritz são enviados ao campo de Buchenwald. Lá, sua relação se intensifica, de modo que pai e filho se tornam não somente a esperança um do outro, como também a lembrança de uma vida feliz.

Quando Gustav descobre que será levado por soldados nazistas, pega um diário e um lápis para poder escrever sobre seu cotidiano, fazendo anotações desde que chega a Buchenwald. Mas Gustav não escreve apenas para fazer um relato, como disse o escritor no prefácio: “A motivação de Gustav, ao escrever, não era fazer um registro, mas preservar a própria sanidade” (p. 14). Ter um diário é um risco. Gustav sabe que se seus registros forem descobertos, ele pode ser morto. Por isso, mantém o diário escondido tanto na roupa quanto no beliche. O caderno permanece com o protagonista até o final, e serve de base para o livro. 

A trajetória de Fritz e Gustav mostra, detalhadamente, a injustiça da guerra, do preconceito, da violência e do ódio. Muitas cenas são intrigantes e estimulam indignação, outras emocionam pela presença de esperança e bondade nas pessoas, mesmo que rara. A história prende quem a lê. No entanto, em alguns momentos, pausas são necessárias para refletir sobre passado e futuro.

Diante de tamanha crueldade, lágrimas são inevitáveis, e é impossível continuar a leitura. Além de os olhos cheios de lágrimas bloquearem a visão, a mente já está cheia de informações negativas e precisa de um tempo para processá-las e refletir sobre o caminho da humanidade.

O livro vai muito além de uma obra literária. Além de gerar reflexão, também proporciona vasto aprendizado sobre o Nazismo e a Segunda Guerra Mundial. Algumas das informações fornecidas não são nem aprendidas nas escolas, por isso a leitura é tão essencial. As atrocidades nazistas também eram pouco conhecidas pelo mundo na época. Poucas pessoas sabiam dos campos de extermínio, que só foram conhecidos após a derrota alemã. 

Há, na obra, um breve comentário sobre o jornalismo na época: quando jornais internacionais publicavam reportagens sobre crimes cometidos pelo Estado Nazista, Hitler acusava-os de falsos e exagerados. Com isso, é possível ver que o ataque à imprensa, sobretudo a investigativa, não é algo de hoje. Jornais também exercem um papel significativo no livro: a questão internacional é mostrada a partir de trechos reais de jornais, muitas vezes mais aprofundados no apêndice, que é necessário ser lido para uma maior compreensão da narrativa e também da História.

O garoto que seguiu o pai para Auschwitz narra de maneira surpreendente um desastre histórico que, embora tenha se iniciado há mais de 80 anos, ainda deve ser debatido e refletido. A linguagem literária o torna mais acessível do que um livro propriamente histórico, de modo que é possível ter uma leitura mais fluida e mais profunda sobre o tema. Mas isso não significa que ler a obra é uma tarefa fácil. É preciso ter maturidade para aguentar os fatos narrados e compreender que não são ficcionais – de fato ocorreram. Os momentos de esperança e felicidade, mesmo que breves, também são admiráveis no livro. A leitura é obrigatória para quem quer aprender e se transformar como ser humano.

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