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A Valsa dos Adeuses: o bailar das consequências

Imagem: Capa do Livro (Reprodução) Por Samantha Prado (sampradogp@gmail.com) Poucos livros sintetizam tão bem metaforicamente o enredo através de um título. A Valsa dos Adeuses (Companhia de Bolso, 2010) é um desses. É uma obra-cebola: tantas camadas em uma mesma história que você é absorvido entre os aprofundamentos dos tramas de cada personagem. É como se …

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Imagem: Capa do Livro (Reprodução)

Por Samantha Prado (sampradogp@gmail.com)

Poucos livros sintetizam tão bem metaforicamente o enredo através de um título. A Valsa dos Adeuses (Companhia de Bolso, 2010) é um desses. É uma obra-cebola: tantas camadas em uma mesma história que você é absorvido entre os aprofundamentos dos tramas de cada personagem. É como se todos eles estivessem em um salão dançando uma valsa imaginária – uma valsa do acaso – na qual trocam de parceiros conforme a música, a fim de tudo se entrelaçar no desfecho de maneira surpreendente.

A narrativa se concentra em um caso principal: Ruzena é uma enfermeira de uma estação de águas – onde mulheres fazem tratamento em busca da fertilidade – e tem um caso de uma noite com Klima, um famosos trompetista casado. Depois disso, ele a evita por semanas até ela conseguir encurrala-lo para contar que está grávida. Klima passa a viver um pesadelo que evidencia toda problemática de sua infidelidade compulsiva, sua misoginia e sua imagem. O leitor é colocado dentro da mente apavorada do trompetista, que constrói todo um plano para convencer Ruzena de abortar: conquistá-la, persuadi-la e, então, desaparecer de sua vida – mantendo sua esposa sem desconfianças e sua imagem intacta.

A jovem enfermeira entra em um jogo de poder, no qual se mostra um tanto manipulável e volúvel. A ideia de um filho não lhe transmite afeição, mas sim uma sede de poder. Cobiça o controle sobre os outros: sobre seu próprio feto, sobre seu amante, sobre a visão que terceiros tem dela – tratando a posição de “mãe” como um tipo de testemunho de superioridade. Nesse meio tempo, um rapaz misterioso passa a persegui-la, deixando claro que ela tem um passado não evidenciado e que tenta escondê-lo de toda forma possível.

Em meio a este trama, encontram-se também Doutor Skreta, Jakub e Olga. Skreta é o único médico da pequena cidade tcheco-eslováquia em que se passa o romance. Famoso por, supostamente, proporcionar milagres a mulheres inférteis que buscam sua ajuda para terem filhos, é uma das peças principais do plano de Klima, concordando em ajudá-lo a aprovar Ruzena pela comissão que liberará seu aborto – em troca de um concerto com o trompetista.

Jakub é um ex-militante da revolução comunista que almeja deixar o país após a decepção com os resultados do movimento. É um dos melhores amigos do doutor, a quem confia sua protegida: Olga. Esta perdeu o pai para revolução quando mais nova e Jakub tomou como seu dever zelar por ela – que acaba por desenvolver sentimentos por ele. Olga é uma das personagens mais interessantes e profundas, com um olhar crítico e original a tudo que observa, sentindo-se deslocada em uma cidade tão dominada pela pequena mentalidade.

Todos os personagens têm posturas questionáveis em diversos pontos do livro. É difícil se apegar a qualquer um deles, mas é fascinante observar o entrelaçar casual das consequências de suas atitudes. A narrativa é extremamente analítica, tornando-se um pouco incômoda em diversos pontos em que se encontram diálogos e monólogos machistas e misóginos, fazendo-nos questionar até onde é um discurso do personagem e não do próprio autor.

De qualquer forma, é um excelente exercício literário digno do autor de A Insustentável Leveza do Ser. O acaso é moldado pelas consequências dos atos das personagens, sendo o leitor um convidado íntimo a vivenciar ao o que cada uma delas dá o seu “adeus”.

 

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