por Ian Alves
ian.andrade.alves@gmail.com
O novo filme de Woody Allen conta a história do novaiorquino Bobby (Jesse Eisenberg), que sempre sonhou em participar da mais glamourosa indústria de cinema dos Estados Unidos – Hollywood. Entre críticas às atitudes mesquinhas da alta sociedade hollywoodiana e à relativização de ideologias religiosas e políticas, o aspecto mais interessante e provocativo do longa é questionar quão sólidas são as escolhas amorosas que fazemos todos os dias. Se você terminou um relacionamento amoroso há pouco tempo, cuidado: Café Society (Café Society, 2015) pode ser uma escolha pesada.
Woody Allen é considerado um “judeu ateísta” (parece estranho, mas não é contraditório, uma vez que o judaísmo comporta aspectos religiosos e étnicos) e, apesar de sua descendência judaica, o diretor brinca em seu novo longa com a fragilidade de credo, mostrando alguns personagens que relativizam dogmas semitas frente a seus interesses individuais. Os personagens do filme, na verdade, funcionam como caricaturas da sociedade nova-iorquina na década de 30: o mafioso do Brooklyn, o socialista utópico que se casa com uma professora, o jovem que sonha com uma vida em Hollywood. Nesse sentido, a ambientação histórica do filme é detalhista, com carros antigos, trilha sonora jazzística, e lançamentos de Fred Astaire e Ginger Rogers no cinema.
Menos verossímil, porém, é a atuação de Kristen Stewart, que não convence o espectador como portadora da “vitalidade” e da “beleza excepcional” que lhe são atribuídas no longa. Já a estrela da série Gossip Girl (2007-2012), Blake Lively, que faz um papel secundário, não surpreende nem decepciona, embora a superficialidade de sua personagem possa ser facilmente confundida com uma interpretação superficial. E Jesse Eisenberg, como é característico dos protagonistas dos filmes de Woody Allen, atua exatamente da mesma maneira que o diretor atuaria em seu lugar. O ritmo acelerado na fala, a inquietude dos gestos, as frases com maior número de palavras do que o normal: tudo se assemelha a performances de Allen em filmes como Noivo Neurótico, Noiva Nervosa (Annie Hall, 1977) e Misterioso Assassinato (Manhattan Murder Mistery, 1993). As atuações mais primorosas ficam com os pais do protagonista, interpretados por Jeannie Berlin e Ken Stott.
Já é fato conhecido que Woody Allen imprime um certo teor autobiográfico em suas obras, e em Café Society não é diferente. Além da constante presença do jazz, da crítica à sociedade hollywoodiana e do retrato de uma família judaica de Nova Iorque, o longa funciona como um simulacro da vida amorosa do diretor, que casou com sua enteada 25 anos mais nova. Em linhas gerais, sem dar spoilers, o que é exibido no filme é a naturalização de um relacionamento entre um homem mais velho e uma moça muito mais nova, sem nenhuma condenação a seu caráter abusivo e com espaço a justificativas misóginas de um homem que trai sua esposa: “o sexo com minha esposa é bom, mas com a outra é simplesmente fantástico”.
Apesar de todas essas questões, o roteiro de Café Society é inteligente e o ritmo do filme é mantido, prendendo a atenção dos espectadores. A grande provocação do filme, relacionada a nostalgias amorosas e à estranha sensação de se prender a “tudo aquilo que poderia ter acontecido”, é feita de maneira sutil, deixando quem assiste ao filme com uma pulga atrás da orelha. A trilha sonora é linda, os diálogos são interessantes e a carga emocional é pesada – mas é fundamental assistir ao filme sabendo que ele é mais um volume da machista saga amorosa de Woody Allen.
Café Society estreia dia 25 de agosto nos cinemas. Confira o trailer:
https://www.youtube.com/watch?v=e1ThJ2Y09xs