Depois do título de 2009, o Los Angeles Lakers vinha com muita força para a temporada seguinte. O experiente time comandado por Kobe Bryant cresceu durante a competição e tornou-se campeão no ano de 2010. Título que consolidou definitivamente a idolatria do craque em Los Angeles e seu legado deixado para o basquete mundial.
Os antecedentes da glória
O Los Angeles Lakers dominou a NBA no início dos anos 2000, vencendo três campeonatos consecutivos. Liderados pela icônica dupla Shaquille O’Neal e Kobe Bryant a equipe aurirroxa não dava chance aos adversários e se garantiu entre os grandes elencos da história de toda a liga. A parceria que trouxe inúmeras alegrias ao torcedor chegou ao fim em 2004, quando, após uma sequência de desentendimentos, Shaq foi transferido para a equipe do Miami Heat, onde seria campeão em 2006.
Após a saída do pivô, os Lakers passaram por um processo de reformulação e voltaram para as finais em 2008 – com o retorno de Phil Jackson, técnico do tri campeonato, e a chegada de Pau Gasol. Porém, perderam justamente para o seu maior rival. O Boston Celtics, composto pelo fantástico trio Paul Pierce, Kevin Garnett e Ray Allen, levou o campeonato em seis jogos e quebrou o jejum de 22 anos sem título.
Em 2009, os Lakers novamente chegaram à final da liga, obtendo a melhor campanha do Oeste na temporada regular. Nos playoffs, passaram pelo Utah Jazz com tranquilidade. Nas semifinais de conferência tiveram um duro embate de sete jogos, no qual acabaram vencendo a equipe do Houston Rockets – que tinha grandes nomes no elenco, como o gigante chinês Yao Ming e Tracy McGrady. Embalados, os Lakers bateram o Denver Nuggets por 4 jogos a 2 chegando com pompa na grande final.
O adversário da vez era o Orlando Magic. O time de Dwight Howard tinha despachado o Cleveland Cavaliers nas semifinais, impedindo o esperado confronto entre Kobe Bryant e LeBron James. “Dwight Howard era seguidamente o melhor defensor da liga, então era um time muito forte e por isso evitou o embate LeBron e Kobe numa final”, analisa Ricardo Bulgarelli, comentarista dos canais ESPN.
Os Lakers venceram a série por 4 a 1, coroando o grande trabalho feito pela equipe. Kobe Bryant foi eleito como MVP (Most Valuable Player, jogador mais importante) das finais marcando mais de 29 pontos em todas as partidas. Com duas finais e um título, o Los Angeles Lakers chegavam na temporada 2009-2010 como favoritos.
A temporada regular
A temporada regular 2009-2010 se encerrou no mês de abril. A equipe que teve a melhor campanha no geral e, consequentemente do Leste, pela segunda vez consecutiva foi o Cleveland Cavaliers, comando por LeBron James. Quem liderou o Oeste mais uma vez foi o Lakers, com 57 vitórias. Outras equipes que se destacaram bastante foram o Dallas Mavericks e Phoenix Suns, no Oeste, e Orlando Magic e Atlanta Hawks, no Leste.
Os times que viriam a fazer a grande final da liga, Lakers e Celtics, se enfrentaram duas vezes durante a temporada, mantendo o equilíbrio com cada um vencendo nos domínios do adversário. A primeira partida entre eles aconteceu em 31 de janeiro de 2010, com uma vitória épica dos Lakers. Kobe Bryant marcou um game-winner (o último e decisivo arremesso do jogo) faltando apenas sete segundos para o final da partida e a equipe de Los Angeles venceu pelo placar de 90 a 89. A revanche aconteceu pouco tempo depois. Ray Allen e Rajon Rondo conduziram o time de Boston para a vitória por 87 a 86, deixando o confronto entre as equipes empatado.
Os destaques individuais
Individualmente quem mais se destacou foi o craque LeBron James, que pelo segundo ano consecutivo levou o prêmio de MVP com médias espetaculares: 29,7 pontos, 8,6 assistências e 7,3 rebotes por partida. Porém, não foi o suficiente para levar os Cavs ao título.Mesmo liderando a liga na temporada regular, a equipe perdeu nas semifinais de conferência para os Celtics.
A classe do draft daquele ano trouxe para a liga nomes que viriam a se tornar jogadores espetaculares, que se tranformariam em all stars e até ganhariam prêmios de MVP – como o espetacular armador do Golden State Warriors, Stephen Curry, e o ala do Houston Rockets, James Harden. A primeira pick foi dos Los Angeles Clippers, que selecionaram Blake Griffin, mas o ala não conseguiu jogar devido a lesões. Porém, o vencedor do prêmio de melhor calouro do ano foi Tyreke Evans, na época jogador do Sacramento Kings.
O MIP (Most Improved Player, premiação que coroa o jogador que mais evoluiu na temporada), ficou com Aaron Brooks dos Rockets. O prêmio de melhor defensor do ano foi, pela segunda vez seguida, para o pivô Dwight Howard, do Orlando Magic. O melhor sexto homem daquela temporada foi Jamal Crawford, que já ganhou o prêmio em três ocasiões.
O esquadrão do Lakers
O quinteto titular dos Lakers era extremamente forte. Quem liderava a equipe na parte técnica e mental era o craque Kobe Bryant, que queria provar a todos que não dependia de um jogador como o Shaquille O’Neal. Renato Campos, criador do site Lakers Brasil, fala sobre o efeito que Kobe produzia naquela equipe: “Kobe já era líder e maduro suficiente para entender o que era necessário para manter um elenco campeão. Sob a tutela de Phil Jackson, e com Pau Gasol como seu fiel escudeiro, o relacionamento dentro do time de poucas vaidades foi essencial para Kobe se sentir à vontade e comandar seus companheiros’’.
O companheiro de Kobe naquele elenco era Pau Gasol. O espanhol que já era consolidado no mundo do basquete, tendo sido MVP de um mundial na época, foi fundamental na conquista do bicampeonato. O pivô fugia dos padrões de jogadores que dominavam o garrafão pela sua força física e se destacava pela técnica apurada nas jogadas. Bulgarelli comenta sobre as qualidades de sobre Gasol: “Ele tem um QI altíssimo, um cara que pensa muito fácil, toma ótimas decisões.Um jogador de grupo, silencioso, trabalhador, por isso ele é multicampeão por onde ele passou”.
O time titular era também composto pelo experiente e multicampeão Derek Fisher, Ron Artest, fundamental no momento defensivo, e Andrew Bynum, jogador mais novo a estrear na NBA e que tinha o papel da força física dentro do garrafão. Bulgarelli acredita que a parceria entre os pivôs deu muito certo: “O Gasol era a cabeça, fundamental na técnica, na leitura para fazer a bola rodar ou chamar a marcação dupla e abrir espaço. Já o Bynum era o corpo, o físico, para abrir garrafão”. Além deles, Jordan Farmar, Sasha Vujacic e Lamar Odom eram alguns importantes nomes que faziam parte da rotação.
Lakers nos playoffs
Depois de terminar a temporada regular com a melhor campanha da Conferência Oeste, com 57 vitórias e 25 derrotas, o time de Los Angeles teria, na teoria, o caminho mais simples até as finais dentro de sua conferência por conta de sua colocação.
Na primeira rodada, o adversário era o Oklahoma City Thunder. O oitavo colocado do Oeste conquistou a última vaga para a fase de mata-mata com 50 vitórias e 32 derrotas – o que significou o maior salto em número de vitórias em relação à temporada anterior na liga, quando o Thunder teve apenas 23 vitórias. O jovem time de Oklahoma contava com jogadores que hoje são grandes estrelas da NBA, como James Harden, Kevin Durant, Russell Westbrook e Serge Ibaka no início de suas carreiras.
O resultado desse embate entre o experiente time de Los Angeles e os garotos de Oklahoma City foi um surpreendente 4 a 2 para os Lakers, com partidas muito disputadas até o último instante. Na sexta e decisiva disputa, aconteceu a jogada mais marcante da série e dos playoffs: faltando 15 segundos para o fim do tempo regulamentar, Thunder liderava por apenas um ponto, então Kobe Bryant levou a bola para o ataque para tentar o arremesso no estouro do cronômetro para vencer a partida. Porém, ele errou o chute, Pau Gasol pegou o rebote e fez a bandeja restando cinco décimos para o fim da partida.
Um pouco menos de emoção na segunda rodada. O time de Los Angeles varreu o Utah Jazz (expressão usada quando um time derrota o outro por 4 a 0 nos playoffs). O quinto colocado do Oeste, que havia vencido o Denver Nuggets na primeira rodada, não foi páreo para a dupla Kobe e Gasol, que tiveram grandes atuações na série. Bryant teve ótima média de 32 pontos por jogo e Pau acumulou médias de mais de 23 pontos e 14 rebotes por partida.
O próximo adversário, o último até o título da conferência, era o Phoenix Suns. O terceiro colocado da conferência chegava com um bom histórico recente nos playoffs contra o time da Califórnia. Em 2006 e 2007, o time do Arizona venceu os Lakers na primeira rodada do mata-mata e a hora da revanche havia chegado.
Com a saída de peças importantes do time e a queda de desempenho de alguns jogadores nesses três anos, os Suns perderam a série de 4 a 2 para Los Angeles, com um desempenho incrível de Kobe Bryant. O ala-armador teve três partidas com mais de 37 pontos e finalizou a série com média superior a sete rebotes e oito assistências por jogo. Então, o caminho até a terceira final consecutiva foi concluído.
O grande time de Boston
Do outro lado do país, a disputa pela Conferência Leste terminou com título do Boston Celtics. O time, que havia concluído a temporada regular na quarta colocação, venceu os dois favoritos a disputar as finais da NBA naquele ano. A equipe bateu o Cleveland Cavaliers, do MVP Lebron James, e o vice-campeão da época, Orlando Magic, do melhor jogador de defesa do ano Dwight Howard, na semi e na final de conferência, respectivamente.
O time de Massachusetts tinha uma geração invejável. Da temporada 2006-2007 para 2007-2008, a equipe trouxe dois jogadores que a fizeram mudar de patamar: o ala-pivô Kevin Garnett, vindo do Minnesota Timberwolves, e o grande chutador de bolas de três Ray Allen, do Seattle Supersonics. No ano de 2008, o time saltaria de 24 vitórias para 66 e seria campeão em cima do Los Angeles Lakers.
Além dos recém-chegados, aquele plantel contava com Paul Pierce, um dos maiores ídolos dos Celtics; Rajon Rondo, jovem armador que vinha se destacando na liga, e Kendrick Perkins, o menos conhecido do quinteto titular, mas que tinha um papel tático fundamental naquela equipe. Bulgarelli conta que foi Kevin McHale, ídolo em Boston e gerente geral do Minnesota, que facilitou a saída de Kevin Garnett para os Celtics, possibilitando a formação daquele supertime. Ainda comenta a importância de Perkins para a equipe: “É um cara de intensidade, um cara de fazer bloqueio pra penetração dos armadores e dos alas, de jogar duro quando tem que jogar duro. É um jogador que faz o serviço sujo e trabalha de forma silenciosa”.
As finais
“A rivalidade é absurda, uma das maiores rivalidades da história de todos os esportes”, afirma Bulgarelli sobre a oposição entre Boston Celtics e Los Angeles Lakers. Rivalidade essa que começou ainda na década de 1960, quando aconteceram as primeiras finais entre os times.
Nos anos 1980, o segundo grande capítulo daquele embate aconteceu. Bulgarelli observa como a própria NBA cresceu muito por conta da chegada de Larry Bird e Magic Johnson nos times. Além disso, lembra como o sentimento de rivalidade se nutriu: “Com a aposentadoria do Bill Russell em 69 e a vontade dos Lakers darem o troco, começou aquele embate nos anos 80. A competição se acirrou com os duelos em 84, 85 e 87 e a disputa entre Larry Bird e Magic Johnson se acentuou ainda mais”.
Em 2008, aconteceu o ressurgimento daquele furor que é a rivalidade Boston/Los Angeles. “Então, aquece novamente o capítulo. Entre 87 e 2008, os caras ficam mais de duas décadas sem jogar uma final”, completa Bulgarelli.
Dois anos depois iria acontecer o reencontro daquelas duas equipes. Renato, do Lakers Brasil, comenta como o clima de revanche existia naquele ano e acrescenta: “A expectativa já era muito grande justamente por conta da rivalidade entre os dois times. O time do Celtics tinha um elenco mais forte, mas a meu ver, naquele momento o time do Lakers estava mentalmente mais preparado para vencer.”
No primeiro jogo, o Los Angeles fez valer seu mando de quadra. Com belas atuações de Gasol e Bryant, dominando os rebotes, a equipe conseguiu uma vitória tranquila por 13 pontos.
Na partida seguinte, o Staples Center não abalou a equipe de Boston como no jogo 1. Em dia inspirado de Ray Allen e Rajon Rondo, a dupla de armadores acabou com o jogo na Califórnia. Rondo conseguiu um triplo-duplo, com 12 rebotes, 10 assistências e 19 pontos, e Allen matou oito bolas de três e totalizou 32 pontos na partida. Os times viajavam para dois jogos em Boston com a série empatada em 1 a 1.
No primeiro jogo em Massachusetts, Kobe liderou seu time com 29 pontos para o segundo triunfo na série, devolvendo a vitória fora de casa que os Celtics tinham conseguido.
O jogo 4 era crucial para o restante da série: o Los Angeles podia abrir 3 a 1 e diminuir muito as chances de Boston ou os Celtics empatavam em 2 a 2 e a chances se mantinham. Diante desse cenário, aconteceu o jogo mais parelho até então, com muitas trocas de liderança no placar, mas que terminou com uma vitória de Boston por sete pontos.
No terceiro e derradeiro jogo no TD Garden, mais um jogo muito disputado. Kobe Bryant com a melhor atuação individual em pontos da série marcou 38, mas Pierce, Garnett e Rondo também tiveram uma ótima partida e colocaram Boston de novo na frente, 3 a 2.
De volta ao Staples Center para os dois últimos jogos, os Celtics precisavam ganhar apenas um para o título. Porém, no jogo 6, Kendrick Perkins se machucou logo no primeiro quarto, ficando fora do restante do jogo e de um eventual jogo 7. A saída do pivô abalou a equipe de Boston, que perdeu muito poder ofensivo e defensivo. Em um dos jogos mais tranquilos da série, Lakers venceram por 89 a 67.
Em todos os seis primeiros jogos, o time que pegou mais rebotes venceu a partida. Esse aspecto não mudou no jogo 7. Sem Perkins, Boston sofreu com Pau Gasol dentro do garrafão. ”Um cara que fez uma falta tremenda no jogo 7, no jogo decisivo”, analisa Bulgarelli sobre a perda do pivô. O espanhol pegou 18 rebotes, sendo nove deles ofensivos, e marcou 19 pontos. Kobe também teve uma grande atuação, foi o cestinha da partida com 23 pontos e ainda pegou 15 rebotes. Então, o time de Los Angeles dava o troco e vencia Boston dois anos depois. “Acho que ficou de bom tamanho, um título em 2008 para Boston e um em 2010 pros Lakers”, conclui o comentarista.
Kobe e seu legado
Bulgarelli comenta como existia um fantasma para que Kobe Bryant vencesse um título como protagonista. Acerca disso, Renato acrescenta: ”Kobe finalmente mostrou que era um líder e que poderia vencer títulos sem o peso de que era ‘coadjuvante’ de Shaq no início dos anos 2000”.
Com cinco títulos da liga, um prêmio de MVP da temporada regular, quatro de MVP do jogo das estrelas e dois de MVP das finais, o Black Mamba marcou história no time de Los Angeles. “Hoje é fácil afirmar que a decisão da diretoria por manter o jogador na franquia por 20 anos fez dele o maior Laker de todos os tempos”, finaliza Renato. Sua marca na equipe está estampada nos dois números que aposentou por lá, o 8 do primeiro tricampeonato e o 24 do bicampeonato.
“Kobe me parece ser esse cara de ter essa gana por vencer, essa vontade de ser melhor a cada dia, de fazer parte de um time vencedor, de fazer parte da história e ele fez”, observa Ricardo Bulgarelli. Essa mentalidade vencedora, a Mamba Mentality como ficou conhecida, foi mais um legado deixado pelo jogador, que marcou uma geração de apaixonados pela NBA e por basquete.
Infelizmente, em janeiro de 2020, Kobe Bryant sofreu um acidente de helicóptero na Califórnia e faleceu junto à sua filha e mais sete pessoas. O legado que ele deixou em Los Angeles e no esporte pelo mundo jamais será apagado.