Por Marcos Nona,
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Aquela que começou como uma jornada inesperada finalmente chega ao seu fim. O terceiro e último filme da trilogia O Hobbit: A Batalha dos Cinco Exércitos, teve sua estreia no dia 11 de dezembro nos cinemas, prometendo reunir os fãs do universo de Tolkien em uma última aventura pelas planícies vastas, montanhas elevadas e densas florestas da Terra Média, guiados pelo carismático hobbit Bilbo Bolseiro (Martin Freeman).

Uma produção ambiciosa
A jornada de Bilbo, entretanto, foi planejada muito antes da chegada de Gandalf (Ian McKellen) em sua toca nas entranhas do Condado. Apesar do potencial épico da obra de Tolkien ser facilmente percebido, o esforço para criar uma adaptação que seja no mínima satisfatória é monumental. Em O Hobbit, ao desafio do co-escritor e diretor Peter Jackson se soma a dificuldade de produzir três filmes sem que tudo pareça excessivamente estendido. Atualmente, 13 anos após o lançamento de A Sociedade do Anel (The Lord of the Rings: The Fellowship of the Ring, 2001), a unidade composta pelos três filmes de O Hobbit alcançou a marca de produção cinematográfica mais cara da história.
Às vésperas do lançamento da última e primordial peça da trilogia, as opiniões sobre os filmes até agora dividem os espectadores. A decisão de desdobrar a obra (que por sinal é menor do que qualquer livro da trilogia O Senhor dos Anéis) em três filmes, justificada por Jackson como necessária para fazer jus à riqueza e à complexidade da história, gerou consequências que não agradaram aos fãs mais ferrenhos do livro e principalmente à Christopher Tolkien. O herdeiro do autor e atual detentor dos direitos legais sobre o trabalho de Tolkien fez declarações polêmicas a respeito das adaptações para o cinema, afirmando que “eles destruíram os livros ao transformá-los em filmes de ação para jovens de 15 a 25 anos de idade”. E a crítica continua: “O abismo entre a beleza e a seriedade do trabalho, e o que ele se tornou, me consumiu. A comercialização reduziu a estética e o impacto filosófico da criação a nada. Há apenas uma solução para mim: virar a cabeça”.

Aqueles que leram os livros também não se sentiram contemplados com as adaptações feitas até agora. Personagens que sequer aparecem no livro, como o elfo Legolas (Orlando Bloom), foram utilizados largamente nos longas como instrumentos de identificação com a trilogia original e como forma de atrair novos espectadores. A elfa ruiva Tauriel (Evangeline Lilly), outra personagem que não é mencionada na obra, apareceu unicamente para flechar o coração de Kili (Aidan Turner) e, junto com o anão, compor um triângulo amoroso com o enciumado Legolas e trazer uma dose de romance à saga. A escolha foi recebida com desagrado pelos fãs, visto que elfos e anões são raças com culturas muito distintas e de relacionamento volúv
A lista de discrepâncias é longa, mas assim também é a lista de pontos positivos dos filmes: novamente Peter Jackson acertou em cheio ao reproduzir uma ambientação impecável da Terra Média e de seus habitantes. A preocupação com o último filme é grande, uma vez que Jackson precisa obter sucesso em três frentes distintas: como uma fonte de entretenimento, como a corda que amarra um filme ao outro, e como um encerramento justo para uma trilogia de grandes proporções.
A disputa pela Montanha Solitária
O longa tem início exatamente no clímax trazido pelo segundo filme, e o espectador se vê imediatamente imerso no ataque do dragão Smaug à Esgaroth, a Cidade do Lago, enquanto os créditos passam vagarosamente na tela. As chamas consomem a cidade enquanto o arqueiro Bard (Luke Evans) se encontra preso e impotente frente à fúria devastadora de Smaug. A sequência termina com a morte do dragão e, apesar de estonteante, é acelerada demais para uma introdução e paira no ar a incômoda sensação de que o segundo filme deveria ter terminado ali.

Com a morte de Smaug, a Montanha Solitária é libertada e atrai os olhares de diferentes povos que cobiçam os tesouros em suas cavernas. Os anões da caravana de Thorin (Richard Armitage) sente-se donos por direito, e isolam as cavernas de Erebor do exterior. O povo da Cidade do Lago, agora liderado por Bard, o matador do dragão, foge dos destroços de Esgaroth e busca refúgio nas ruínas da Cidade da Montanha de Valle, próxima à entrada de Erebor. Bard exige a parcela do tesouro prometido ao seu povo. Quando Thranduil chega com seu exército para reivindicar as gemas brancas, tesouro dos elfos, as discordâncias entre os três povos culminam no início da Batalha dos Cinco Exércitos, à qual ainda se somam a tropa de anões liderada por Dáin, primo de Thorin, e a horda de orcs comandada pelo orc branco Azog.

A última batalha do filme e que dá nome à obra dura pouco mais de 40 minutos e é a prova da habilidade de Peter Jackson em reproduzir guerras de grandes proporções. Jackson sabe o que faz ao dar espaço para cada personagem brilhar no campo de batalha, evidenciando os laços de amizade e lealdade formados durante a longa jornada até a montanha. As cenas de ação ocupam a maior parte do longa, mas o desenvolvimento da trama não foi deixado de lado. Vemos o relacionamento entre Tauriel e Kili aflorando sob o julgamento de Legolas, e Gandalf sendo resgatado nas ruínas de Dol Guldur pelos elfos Elrond e Galadriel e pelo mago Radagast, o marrom, em uma cena de efeitos estonteantes que termina com o assustador retorno de Sauron. Os efeitos especiais foram usados em larga escala em uma comparação com a trilogia do Anel e, apesar de bem produzidos, algumas vezes são pouco convincentes, como nos momentos em que claramente temos o modelo 3d de um Legolas que pula entre as rochas de um desfiladeiro. A ambientação, porém, permanece impecável, com direito a cenas deslumbrantes das paisagens da Nova Zelândia, que há muito tempo consolidou-se como um pequeno pedaço da Terra Média em nosso planeta.

Uma conclusão épica para a jornada de um pequeno Hobbit
Quando os créditos sobem na tela acompanhados pela belíssima trilha sonora de Enya, a sensação que se tem ao fim de A Batalha dos Cinco Exércitos é que, apesar das críticas tecidas por Christopher Tolkien e das inúmeras discrepâncias entre o livro e os filmes, as escolhas feitas por Peter Jackson na produção cinematográfica convergiram os seis componentes das trilogias do Anel e do Hobbit em uma única peça homogênea e linear, amarrando os personagens e o enredo de forma coesa. A trilogia que antecede a trilogia original, assim como ocorreu com Star Wars, introduz a ascensão de Sauron e o início da Era dos Orcs em O Senhor dos Anéis, 60 anos após o retorno de Bilbo para o Condado. Jackson cumpriu exatamente o que prometeu ao trazer para as telas todo o potencial épico do livro em uma conclusão de tirar o fôlego, com batalhas em escala incomensurável como as vistas em O Retorno do Rei (The Return of the King, 2003), onde as perdas para ambos os lados são invitáveis.
Os fãs da saga deixarão os cinemas tão desolados quanto Smaug após se despedirem de Bilbo, Gandalf e dos anões da caravana de Thorin nesta que promete ser a última adaptação do vasto universo de Tolkien para os cinemas.