Entre os dias 11 e 13 de julho foi realizada a 47° cúpula do Grupo dos 7 (G7), que acontece desde 1975 entre as maiores potências democráticas mundiais para propor medidas com impactos globais, relacionadas à economia, meio ambiente, direitos humanos e política. Em 2021, os integrantes (Estados Unidos, França, Inglaterra, Canadá, Alemanha, Itália e Japão) abordaram questões vitais que são discutidas há anos.
Em documento oficial liberado à imprensa, o grupo propõe o Build Back Better to the World (B2W), medida norte-americana que visa promover uma alternativa à influência mundial chinesa baseada na Nova Rota da Seda, por meio de investimentos em áreas como infraestrutura e crescimento verde, em especial nos países africanos. Quanto à crise sanitária, as decisões da cúpula são voltadas principalmente para a recuperação mundial após a pandemia, na qual a restauração econômica será unificadora: “nenhuma pessoa, independentemente da idade, gênero ou etnia será deixada de lado”.
Crise sanitária
A preocupação acerca do mundo após a crise generalizada causada pelo coronavírus impulsionou compromissos formalizados na declaração supracitada, os quais pretendem prevenir outras pandemias por meio da redução do tempo médio de produção de vacinas de 12 meses para 100 dias, do fortalecimento da OMS e do incentivo aos países subdesenvolvidos.
Para o secretário-geral da ONU, António Guterres, tais medidas são insuficientes para desenfrear o vírus, haja vista que a urgência deve ser a doação de vacinas. O grupo estabeleceu a distribuição de 2 bilhões de doses até 2022, mas apenas 870 milhões estão garantidas. Outrossim, a data estipulada pode acarretar o vencimento de doses e a morte de muitos outros indivíduos que vivem em países em que a pandemia não está controlada, como o Brasil.
Economia
Foi trazido em pauta a questão dos paraísos fiscais, locais onde há uma maior concentração de multinacionais que “fogem” da taxação de impostos, em razão da fragilidade de leis ambientais e de preservação dos direitos humanos. De acordo com Maurício Santoro, doutor e mestre em Ciência Política e professor na UERJ, “desde os anos 90 houveram medidas de liberalização da economia global para conceder benefícios às grandes empresas visando à prosperidade, entretanto, isso estimulou a desigualdade”.
A proposta do G7 de reforma tributária, para o professor, é extremamente importante para nivelar tais disparidades sociais. Uma vez que ela propõe a arrecadação de, no mínimo, 15% de impostos para multinacionais, tanto em seus países nativos quanto nas localidades em que estão instaladas. Logo, de acordo com Maurício essa tributação “é um esforço global no sentido de redistribuição de renda e de um estado mais assertivo e presente do gerenciamento da economia”.
Política internacional
A política de “exportar a democracia” apresentada por Biden almeja desconstruir regimes que sejam pautados em autocracias, além de ser uma forma de demonstrar um sistema político viável e lucrativo que se oponha ao chinês. Quanto a isso, Carolina Moehlecke, doutora e mestra em Ciências Políticas e professora de Relações Internacionais na FGV, afirma que “O processo de instauração de um sistema político democrático pode levar um tempo, mas a iniciativa impulsiona sua aderência”.
Segundo Moehlecke, as repetidas menções à China — sobre a urgência da contenção do país — geraram uma resposta contrária da nação acusada de inúmeros crimes que transgridem os direitos humanos, e sobre a qual pairam suspeitas da origem do coronavírus por parte da cúpula do G7, que anseia fazer uma investigação aprofundada.
Outro país discutido foi a Rússia, em especial pelas acusações de crimes cibernéticos e ataques contra opositores de Putin, em Belarus. Contudo, consoante à fala dos professores Carolina e Maurício, o país não possui uma influência econômica mundial capaz de abalar as medidas estipuladas na declaração de Carbis Bay.
Meio ambiente
A sustentabilidade, apesar da relevância no cenário atual, não foi o principal tema abordado e metas relacionadas às emissões de gases de efeito estufa foram apenas ratificadas. De acordo com Jefferson Nascimento, coordenador de justiça social e econômica na OXFAM Brasil, “os resultados da cúpula foram abaixo do esperado, isso porque, embora as medidas tomadas tenham relevância, elas são insuficientes para mitigar as crises urgentes, havendo apenas renovação de velhos compromissos. Nesse contexto, ainda que o investimento em infraestrutura verde seja positivo, não resolve a necessidade de financiamento das comunidades impactadas pelas mudanças climáticas”.
Manifestações
Durante a cúpula, manifestantes tomaram as ruas e praias britânicas em protesto pedindo que o grupo tomasse medidas efetivas sobre a crise global, especialmente sobre a sanitária e a climática. O principal apelo dos ativistas era para que o G7 auxiliasse os países mais pobres na vacinação e que acordos efetivos sobre o clima fossem firmados. Em relação a isso, o coordenador da Oxfam Brasil pontua que “a postura dos países do G7, que já vacinaram suas populações, não condiz com a realidade dos que se mantêm em estado de calamidade”.
“É relevante elaborar protocolos para evitar novas pandemias, mas há uma importância crucial na superação da atual crise de covid-19. Pois, se para eles a pandemia aparece no retrovisor, para uma grande parcela do planeta ela ainda é uma realidade.”
Além disso, Jefferson Nascimento diz que “a quantidade de vacinas a serem doadas é insuficiente para atingir a imunidade coletiva de todo o mundo, levando em consideração as duas doses necessárias, seria preciso mais de 11 bilhões de doses. A questão da queda de patentes, defendida apenas pelos Estados Unidos e pela França, não foi abordada como deveria, haja vista a postura restrita dos europeus, especialmente de Boris Johnson e de Angela Merkel.” Para ele, isso representa a defesa dos monopólios farmacêuticos em detrimento da vida de milhões de pessoas.
Impactos no Brasil
Com a saída de Donald Trump, o governo brasileiro perdeu seu principal aliado e o atual presidente norte-americano adotou uma postura crítica quanto ao Brasil, em especial no que se refere ao meio ambiente. Entretanto, para o professor Santoro, “se o Estado Nacional estiver disposto a conversar, pode vir a se tornar uma superpotência ambiental, sendo que a Amazônia e o Cerrado são fundamentais na absorção de carbono e, consequentemente, no controle climático.”
A proposta de zerar a emissão de carbono até 2050 foi reforçada e um compromisso para diminuir a utilização de usinas termelétricas para limitar o aumento da temperatura global foi firmado, ainda que sem prazos definidos. Entretanto, para a professora Carolina, “essa questão é especialmente complicada pela dificuldade europeia em se livrar do carvão”.
A reforma tributária seria de grande importância para o Brasil uma vez que, atualmente, não são cobrados impostos de dividendos. Para Moehlecke, “a reforma é revolucionária, pois a arrecadação pode ser revertida na infraestrutura e em gastos públicos. E, embora precise passar pelo Congresso para ser aprovada, ela tende a ser aceita pela forte influência norte-americana e europeia, além de potencialmente favorecer a economia brasileira”.
*Imagem de capa: [Reprodução/Site oficial do G7 United Kingdom]