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Um salto dentro de um retrocesso

A J.Press esteve nas manifestações do dia 28 de abril para ouvir o que os manifestantes pensam a respeito do momento político do Brasil   Por Rodrigo Brucoli (rodrigobrucoli@gmail.com) No dia 28 de abril deste ano, ocorreu uma grande paralisação contrária à reforma trabalhista, à reforma da previdência e ao governo Temer. Embora desde o …

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A J.Press esteve nas manifestações do dia 28 de abril para ouvir o que os manifestantes pensam a respeito do momento político do Brasil

 

Por Rodrigo Brucoli (rodrigobrucoli@gmail.com)

No dia 28 de abril deste ano, ocorreu uma grande paralisação contrária à reforma trabalhista, à reforma da previdência e ao governo Temer. Embora desde o processo de impeachment o Brasil tenha se tornado palco das mais diversas manifestações, a paralisação do dia 28 de abril — convocada por movimentos sociais como uma greve geral — reuniu profissionais dos mais diversos setores, como metroviários, bancários, funcionários públicos, professores estaduais, federais, municipais e de escolas particulares. As áreas de atuação profissional dos manifestantes eram as mais diversas assim como o espectro ideológico ali representado – diverso e plural.

Na última sexta-feira do mês de junho, houve uma outra paralisação contrária ao governo Temer e às suas reformas. O quadro político brasileiro também se agravou com as delações de Joesley e Wesley Batista e as consequências ainda desconhecidas que elas podem trazer à democracia brasileira. Por isso, vale pensar: qual era o perfil dos manifestantes que estavam na manifestação do dia 28 de abril? O que eles pensavam a respeito da política e quais são as suas expectativas em relação ao futuro? A J.Press esteve nas ruas fazendo essas perguntas e, nesse contexto pós-greve geral de junho fazemos um convite para conhecer quem são as pessoas que estão insatisfeitas com os rumos políticos do Brasil.

Ato em frente à prefeitura convocado pelos professores das escolas municipais de São Paulo. (Rodrigo Brucoli/J.Press)

O medo de exercer o direito à manifestação

Era uma sexta-feira fria em São Paulo e a garoa fina mantinha as roupas sempre úmidas. Ainda assim, os manifestantes não se intimidaram: na praça da República havia gente fotografando a cavalaria e os grandes carros da polícia militar que não paravam de chegar. Enquanto os seguranças do metrô fechavam as grades da entrada, alguns manifestantes protestavam dizendo que aquilo era um absurdo, uma ordem deliberada para que eles tivessem dificuldades para voltar para casa, ou para que não pudessem chegar até a Faria Lima, onde as manifestações se estenderiam até a noite. “Tudo isso é para enfraquecer o ato”, dizia um senhor enquanto protestava junto ao segurança.

Na Barão de Itapetininga as pessoas caminhavam juntas, em pequenos grupos, conversando, a maioria sorrindo. Próximo ao Teatro Municipal já se podiam ouvir as palavras de ordem que vinham do carro de som estacionado à frente da prefeitura. O local era ponto de encontro dos professores das escolas municipais, mas eles não eram os únicos que estavam protestando. Thaís, 23 anos, garçonete e moradora do Capão Redondo, foi à manifestação por conta própria. No seu trabalho não houve consenso quanto à paralisação: uns aderiram à greve, outros foram trabalhar, outros tentaram ir ao trabalho mas não conseguiram por falta de transporte. Mesmo com a dificuldade de locomoção, Thaís resolveu ir ao ato pois entende que “o que tá acontecendo é uma manobra pra tirar diversos direitos que os trabalhadores têm, e é óbvio que isso não é certo. Então eu acho interessante a gente se unir e lutar, porque não é o direito meu, é meu e de milhares de outros brasileiros”.

Aron Granier, microempresário, e Thaís, garçonete, se somaram à paralisação dos professores em frente à prefeitura. (Rodrigo Brucoli/J.Press)

Como Thaís, Aron Granier, 23 anos, morador do Campo Limpo, entende as reformas do governo Temer como uma diminuição de direitos. “Eu tenho a pretensão de me aposentar, e outras coisas também, e lutando pelos outros, né? Tem que lutar mesmo.” Tanto Thaís quanto Aron entendiam a paralisação como um recurso para garantir os direitos das gerações futuras, e que, aos poucos, a população estaria tomando consciência do caráter coletivo dessa luta. Segundo Thaís, “a conscientização da necessidade de lutar pelos nossos direitos, de buscar melhorias, vem atingindo cada vez mais um número amplo de pessoas. Então eu acho que pode não ser hoje, pode não ser amanhã, mas acho que em breve a gente vai tá conquistando alguma coisa, até porque essa discussão tá chegando cada vez mais longe.”

No caso dos educadores presentes no ato em frente à prefeitura, havia situações bastante distintas. Eliane de Oliveira Leite, professora da escola Amorim Lima, do Butantã, comentou o quanto a decisão pela paralisação representou não só a opinião dos professores como também a dos pais de alunos na escola. Segundo a educadora, além de todos os professores terem decidido pela greve e estarem em conjunto no ato em frente à prefeitura, os pais “estão super apoiando. Tem faixa lá na Corifeu, teve um ato pela manhã também lá na praça Elis Regina com as escolas particulares, a nossa escola e os pais. Tinham crianças, teve uma ciranda para encerrar o ato.”

Eliane de Oliveira Leite, professora da escola Amorim Lima, do Butantã, ressalta a importância do engajamento de toda a comunidade escolar na paralização. (Rodrigo Brucoli/J.Press)

Porém a decisão por paralisar não foi tomada de maneira unânime em todas as escolas. A gestora de uma EMEI da região de Guarapiranga, Zona Sul, que não quis ser identificada explicou o quanto tomar essa decisão pode ser complexo dentro de um contexto, como o escolar, caracterizado pela diversidade ideológica, de interesses e de necessidades. A gestora, de 43 anos, preferiu não ser identificada pois, de acordo com ela, como a prefeitura era contrária à paralisação, temia possíveis retaliações. Vale destacar que ela não foi a única a evitar a reportagem: diversas pessoas abordadas pela J.Press durante o ato preferiram ou não ser identificadas ou não dar entrevista. Os motivos mais alegados para negar foram o medo de retaliações no emprego e a desconfiança de que, como mídia, pudéssemos manipular as informações.

Conforme relato da gestora da EMEI na zona sul, embora toda a sua escola tenha paralisado, tomar essa decisão foi um processo bastante difícil. “Com os educadores que já estão há mais tempo na rede, é mais tranquilo. Os funcionários novos têm medo de represália por causa de estar em período probatório.” A gestora ainda destacou a descrença de muitos trabalhadores na mobilização política, pois os funcionários da escola já viram muitas paralisações que “não deram em nada”, e por isso acreditam que “então não vai funcionar”.

Além de todos esses motivos, ela destacou o anúncio do corte de ponto, feito pelo prefeito de São Paulo, João Doria, que não teria aberto a possibilidade de negociar uma reposição em caso de falta no dia da greve. Segundo ela, tal condição afeta sobretudo a decisão dos “segmentos que têm salários muito mais baixos”. Como tais funcionários já têm um salário pequeno, um corte poderia gerar dificuldades financeiras. De acordo com a gestora, “articular quem está no período probatório, quem é contratado, quem recebe menos pagamento” é uma grande dificuldade. Aqueles que estão no período probatório e que possuem salários mais baixos são mais resistentes à paralisação, pois podem ser mais afetados. Paradoxalmente, ela entende que esses são os segmentos que podem ser mais afetados pelas reformas propostas pelo governo Temer. Assim, a situação revelaria uma contradição inerente ao próprio contexto político e social.

Manifestantes mostram faixa contra a reforma da previdência em frente à prefeitura de São Paulo. (Rodrigo Brucoli/J.Press)

“Um salto dentro de um retrocesso”

Com um público maior do que o que se reunia na prefeitura, grande parte da avenida Faria Lima estava tomada por manifestantes. Lá conversamos com um grupo de amigos que estudaram no Mackenzie de 1978 a 1984. Eles não quiseram ter seus nomes divulgados e preferiram ser chamados de “esquerda do Mackenzie”.

De acordo com um sociólogo que estava no grupo, “nós somos da época do movimento estudantil. Da reconstrução da UEE, da UNE, nós pegamos tudo isso. A gente pegou essa época de reconstrução do movimento estudantil”.

Para uma funcionária da justiça, nessa época “a gente era uma minoria, vários amigos nossos apanharam bastante”, demonstrando a truculência com que os movimentos de esquerda eram tratados no período da ditadura. As questões que se colocavam na agenda política também eram outras: “A grande briga era votar, né, conseguir votar. Tirar o título da gaveta porque a gente tirava o título de eleitor e não votava”, afirma um engenheiro civil. Quando estudantes, eles participaram da luta pelas Diretas Já, o que eles consideram motivo de muito orgulho nas suas trajetórias.

Na avenida Faria Lima, principal ponto de concentração do protesto, manifestantes se colocam contra as reformas do governo Temer. (Rodrigo Brucoli/J.Press)

Para uma bióloga, integrante do grupo, a amizade deles sempre esteve aliada à luta política. Relembrando o período da ditadura e a luta pelas diretas, ela afirma que “a gente sempre caminhou, daquela época até agora, em busca da democracia e dos direitos. Então hoje a gente tá aqui, tantos anos depois, em busca da mesma coisa, né?, do que a gente acredita. Então nós estamos aqui mais velhos, porém os ideais e o que a gente quer é o mesmo, é a mesma coisa.” Nesse momento, seu amigo engenheiro completou: “E não é nada velho, os nossos ideais nunca são velhos.”

Para o sociólogo da “esquerda do Mackenzie” as reformas que o governo Temer propõe na CLT são um grande retrocesso. Ele explica que “a CLT de 1943, resumiu leis que vêm desde 1917, aliás, desde 1870, passando por 1917. 1917 foi um marco porque foi a primeira greve geral do Brasil que vai fazer 100 anos agora no começo de julho, e nós estamos retrocedendo aquela época.”

Para ele, a história não se faz sem paradoxos, e, por isso, apesar de ser contrário ao governo Temer e suas reformas, entende que vivemos um período positivo:  “A CLT foi promulgada no governo Getúlio Vargas em 1943, governo autoritário, ele não foi eleito. Isso é uma coisa muito legal, porque  foi um salto dentro de um retrocesso, quer dizer, um governo autoritário… É o que nós estamos sofrendo hoje, nós estamos sofrendo uma rasteira, mas nós vamos ter um salto nisso. Essa é a perspectiva”, explica.

 

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