Por Giulia Polizeli (giulia.polizeli@usp.br)
Trinta e seis anos após a estreia de Os Fantasmas Se Divertem (Beetlejuice, 1988), nesta quinta-feira (5), os cinemas dão boas vindas a Os Fantasmas Ainda Se Divertem: Beetlejuice Beetlejuice (Beetlejuice Beetlejuice, 2024). Sob a direção de Tim Burton, a sequência tardia é marcada pelo retorno de grandes nomes do elenco original como Winona Ryder e Michael Keaton, além da adição de nomes promissores ao grupo.
Décadas após onde deixamos os personagens ao final do original, o reencontro do público com a família acontece em um futuro inusitado. Abaladas por uma tragédia familiar, Lydia e Delia Deetz (Winona Ryder e Catherine O’Hara) se encontram de volta à Winter River, desta vez acompanhadas da nova integrante da família Astrid Deetz (Jenna Ortega), que mantém uma relação complicada com a mãe e a avó.
Utilizando suas habilidades de médium para trabalhar como apresentadora de TV, Lydia vê sua relação com o pós-vida aflorar ainda mais com o retorno forçado à casa assombrada e os questionamentos da filha sobre eventos do passado. No mundo dos mortos, tudo culmina com o retorno de antigos fantasmas de um certo demônio traiçoeiro, que podem tornar os desafios presentes mais difíceis para a família Deetz.
Após um ano difícil para a Warner e críticas aos trabalhos mais recentes de Burton, reviver o sucesso de bilheteria em 1988 parece uma decisão arriscada do time de produtores, que inclui nomes como Dede Gardner de Moonlight: Sob a Luz do Luar (Moonlight, 2016), Jeremy Kleiner de Querido Menino (Beautiful Boy, 2018), Marc Toberoff Hellraiser – Renascido do Inferno (Hellraiser, 2022), Tommy Harper Top Gun: Maverick (2022), Tim Burton e Brad Pitt. Mas, quatro décadas depois, Os Fantasmas Ainda Se Divertem: Beetlejuice Beetlejuice vem para terminar a onda de má sorte do estúdio e do diretor.
Ao repetir sua fórmula clássica, Tim Burton usufrui de seus personagens perturbadoramente mortos (no bom sentido) para criar um terror cômico que coloca Betelgeuse em um lugar único no cinema. Com ajuda dos visuais marcantes, originalmente criados por uma das melhores equipes de Hollywood dos anos 80, o longa traz de volta a vida ao mundo sombrio e explora novos ângulos da vida pós-morte como imaginada pela mente singular do diretor, sem tirar o sentimento nostálgico para os fãs.
Novos departamentos e uma visita à lua de Saturno, casa do tão temido verme de areia, são pontos animadores do filme para os super fãs da franquia. Os fãs mais antigos e saudosos de Burton também podem matar saudades e receber um gostinho de seus antigos trabalhos com pequenos pedaços de animação incorporados no roteiro para recontar acontecimentos passados.
Apesar de um pouco desorientado para um filme que não promete ser profundo e complexo, o roteiro de Beetlejuice 2 entrega exatamente o que precisa. Enquanto o primeiro filme tem um roteiro que se perde em si, a sua sequência faz um trabalho satisfatório de aprofundamento e dedica tempo para o desenvolvimento das personagens. O roteiro de Alfred Gough e Miles Millar apoia-se no senso de humor característico de Betelgeuse, fazendo a entrega de piadas rápidas com duplo sentido, números musicais e visuais grotescos apresentados com entregas cômicas.
O pecado do filme, no entanto, continua sendo o desenvolvimento corrido de pequenos plots e personagens que parecem ser esquecidos por longos minutos e relembrados no final da trama. O melhor exemplo para isso seria a trajetória de Delores (Monica Bellucci). Apesar de ser uma das chaves principais do filme, a personagem não passa por qualquer tipo de desenvolvimento e desaparece por longos períodos sem qualquer tipo de justificativa, aparecendo apenas quando é conveniente ao roteiro.
E quando falamos de personagens, não podemos deixar de falar sobre Monica Bellucci e Willem Dafoe, que fazem sua estreia no filme como Delores e Wolf Jackson, respectivamente. Como novos membros do pós-vida, Dafoe, utilizado pelo roteiro como alívio cômico em sequências mais intensas, se torna quase essencial para arrancar risadas do público. Enquanto Bellucci faz um ótimo trabalho em assombrar todos aqueles que estão assistindo.
A assombração principal, no entanto, vem de Michael Keaton. Com uma atuação eletrizante e grotesca, aos 72 anos, Keaton faz uma performance triunfal ao retornar a um de seus papéis mais marcantes da carreira. Sendo sempre o personagem mais vivo em cena, mesmo estando morto, é possível duvidar se a personalidade desvairada do demônio vem do roteiro ou do ator, que parece incorporar Betelgeuse e entender o personagem tão bem quanto a si mesmo.
Winona Ryder não fica para trás de seu parceiro de cena: a, agora mais velha, Lydia Deetz é melancólica, instável e levemente perturbada, mas é representada de forma esplêndida. Com pequenos gestos e expressões, Ryder faz com que o público tenha flashbacks da pequena Deetz e se questione se não existe algum tipo de encantamento secreto que transportou a versão mais nova da atriz para a atualidade.
Apesar da jovem Lydia não estar mais presente, o filme encontra uma substituta a altura em Jenna Ortega, responsável por chamar a atenção de um público mais novo para a obra. A atriz, pessoalmente convidada por Burton para trabalhar no filme, tem ganhado espaço na cena do terror e não é para menos, do thriller ao clichê, Ortega entrega perfeitamente o papel de Astrid Deetz, a jovem problemática e gótica que todo filme precisa.
Trabalhando com Tim Burton pela segunda vez, a atriz conhecida por Wandinha (Wednesday, 2022) é protagonista de seus próprios plots dentro da obra. Jenna Ortega empurra os limites de Ryder ao explorar a influência de Lydia na filha Astrid, enquanto mantém a rebeldia de quem tem uma relação turbulenta com a mãe. Por grande parte da trama, ela é acompanhada por Arthur Conti, conhecido por A Casa do Dragão (House Of The Dragon, 2022), que segura bem a outra ponta em relação a sua companheira de cena.
Com um roteiro moderado, elevado pelo elenco que o interpreta, o longa de uma hora e quarenta consegue finalizar a história de forma satisfatória e perturbadoramente séria em comparação com o resto do filme. A pequena abertura deixada pela possibilidade de um terceiro filme pode animar aos fãs que desejarem mais, mas não atrapalha de forma alguma o encerramento do novo enredo.
Marcado por mais momentos musicais, visuais fortes e um elenco impressionante, o filme é o suco de mistura perfeito para um terror cômico. A mente conturbada de Tim Burton trabalha de forma harmoniosa ao lado do roteiro de Alfred Gough e Miles Millar, deixando espaço para que a história envolva o público e reconquiste o coração dos fãs.No geral, tratando-se de uma sequência tardia, Os Fantasmas Ainda Se Divertem: Beetlejuice Beetlejuice surpreende de forma positiva ao revisitar uma história que nunca exigiu uma continuação, mas que todos estamos felizes por existir.
O filme já está em cartaz nos cinemas. Confira o trailer:
*Imagem de capa: Divulgação/ Warner Bros