Construído nos moldes dos contos de fadas, Sombras da Noite (Dark Shadows. EUA. 2012.) apresenta o elemento do fantástico, do irreal, combinado à realidade do flower power – movimento hippie de contracultura; forte no início da década de 70, época em que a maioria da trama é ambientada. Apesar de possuir uma proposta de mesclar o mundo da magia – de vampiros e bruxas – com o contexto da segunda metade do século XX, gerando humor, o filme de Tim Burton acaba sendo repetitivo, apesar de divertido.
A história tem seu início em 1772, quando Barnabas Collins, vivido por Johnny Depp, um jovem herdeiro dos negócios pesqueiros da família Collins, se apaixona por Josette DuPres e recusa o amor de Angelique Bouchard, uma das funcionárias de sua mansão, Collinswood. Ela, por sua vez, esconde o fato de ser uma bruxa. Cega de ciúmes e revoltada com a rejeição sofrida, Angelique decide matar os pais do rapaz, e enfeitiçar Josette, para que ela se suicide e não possa se casar com Barnabas. Além disso, como castigo, o transforma em um vampiro, condenado à vida eterna.
Com isso, a moça promove uma perseguição a Barnabas, que é enterrado vivo pelos habitantes de Collinsport. Até que, após duzentos anos, o protagonista se vê livre e retorna à sua casa com o intuito de dar continuidade aos negócios da família. Em 1972, ao chegar à mansão Collinswood – que estava bem decadente, por sinal –, o vampiro encontra uma linhagem familiar consideravelmente diferente da sua, e falida. Dessa forma, ele deve recuperar o poder econômico dos Collins e aprender a viver em tempos modernos.
Como a maioria dos trabalhos de Tim Burton, Sombras da Noite apresenta o horror de forma divertida e infantilizada. E nisso o diretor acerta, ao transformar a história de um vampiro em algo humorístico e leve. Todo o filme tem um tom de piada, e mescla cenas de caráter épico, ou de ação – como a perseguição com tochas e toras ao vampiro, o que pode ser uma alusão à Bela e a Fera (Beauty and the Beast. EUA. 1991.) – com outras que têm o sentido apenas de gerar descontração, como as em que o protagonista aparece dormindo de cabeça para baixo, como um vampiro e/ou um morcego, em diversos lugares, inclusive em seu caixão.
Também cabem elogios ao cenário, à maquiagem, e ao figurino escolhidos. As roupas de época dão um tom de glamour à história, e contribuem para a ambientação do interlocutor naquele período. A mansão da família Collins ajuda a construir a atmosfera de riqueza decadente necessária para caracterizar os personagens. As cores fortes e quentes utilizadas em toda a trama também a tornam mais agradável visualmente.
Apesar disso, o longa apresenta alguns erros de lógica e continuidade, e outros elementos que o tornam repleto de mais do mesmo. A história da família rica falida já foi abordada em Desventuras em Série (Lemony Snicket’s A Series of Unfortunate Events. EUA. 2004.) e de uma forma mais original e interessante, diga-se de passagem. Além de que os personagens são todos extremamente estereotipados: a bruxa má, a adolescente hippie revoltada, a babá boazinha, a psiquiatra com problemas psicológicos – papel de Helena Bonham Carter, esposa do diretor, que completa o trio filmográfico Depp-Carter-Burton –, o pai leviano e a criança que vê fantasmas.
Os efeitos especiais também são fracos, e é notável que as cenas de perseguição e de ação ficaram ainda no âmbito rudimentar; assim como os fantasmas criados. A obra de Burton também perde o sentido quando Barnabas resolve reformar as estalagens pesqueiras e as moderniza, com um dinheiro que a família não tem, visto que, mesmo com o tesouro escondido pelo protagonista, faliu.
Entretanto, a ideia de integrar um vampiro à geração hippie e à modernidade soa interessante. E a atuação, em geral, não deixa a desejar. Johnny Depp aparece bem no longa, porém impregnado de trejeitos de seu mais conhecido personagem, o capitão Jack Sparrow, de Piratas do Caribe (Pirates of the Caribbean. EUA. 2003. 2006. 2007. 2011). Ao se levantar do caixão, após estar trancado por duzentos anos, o andar do ator ainda é o mesmo de Jack, o que tira um pouco da singularidade de Barnabas. Contudo, ao longo da trama o desempenho de Depp tem uma melhora considerável.
Sombras da Noite é um filme leve para se ver com a família, por garantir diversão e entretenimento para diversos tipos de gostos. É uma pena que a proposta do enredo não tenha sido cumprida como deveria, tornando-o vago, opaco e pouco marcante.
Por Malú Damázio
damaziomalu@gmail.com