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Remakes: tradução ou reciclagem

As boas histórias do cinema acabaram ou são tão boas que não podem morrer no passado?

Os remakes sempre existiram na história do cinema. Desde clássicos que são sempre refeitos, até tramas que são revitalizadas. Mas, com uma alta nas produções que revivem o passado, tem surgido uma grande questão entre os fãs de cinema: os remakes são realmente necessários ou não? 

A jornalista e cineasta Gabriela Franco, em entrevista para o Cinéfilos, diz que depende muito do filme e da situação. Entre a positividade e negatividade de um remake, surge a vertente do interesse mercadológico das grandes produtoras e a correção de erros em uma história boa, mas datada. Essa relação pode ser observada explicitamente em dois filmes lançados recentemente: O Rei Leão (The Lion King, 2019) e Amor Sublime Amor (West Side Story, 2021).

No primeiro caso, é perceptível a tentativa de reciclagem da mesma história por meio do live action, com propósito meramente comercial, como explica a criadora do site Minas Nerds: “No fundo, quem amou a primeira animação vai continuar consumindo coisa do Rei Leão, não importa o que você coloque, [pode ser)] um boneco de palito fazendo O Rei Leão, ele vai lá e vai ver, porque o fã é assim. Fã joga o dinheiro na cara da produtora, não importa o que ela faça. Então ele [produtor] aposta no fandom, visando lucrar ainda com o mesmo produto. É pura questão mercadológica”.

Do lado esquerdo, a versão animada do Simba sendo levantado, a direta, a mesma cena só que em live action.
Comparação de cenas de O Rei Leão (The Lion King, 1994) e O Rei Leão (The Lion King, 2019). [Imagens: Divulgação/Walt Disney Pictures]

Já em Amor Sublime Amor, é claro o objetivo de reapresentar sua conhecida história, que antes de filme já era peça, para um novo público, por meio de sua atualização e da correção de erros, como a substituição de atores que, na versão de 1961, eram brancos pintados para “parecerem” porto-riquenhos, por profissionais originalmente latinos, além de um aprofundamento nas relações de classes sociais. 

Do lado esquerdo, três dançarinos brancos com os braços levantados e uma das pernas no ar. Do lado direito, três dançarinos latinos pulando, com pessoas comemorando ao fundo.
Comparação de cenas de Amor Sublime Amor (West Side Story, 1961) e Amor Sublime Amor (West Side Story, 2021) [Imagens: Divulgação/Seven Arts Production, 20th Century Studios]

A crítica de cinema também ressaltou que existem remakes que não valem a pena serem produzidos porque são frutos da própria época. Esse é o caso de Esqueceram de Mim (Home Alone, 1990), cujo remake foi um fracasso, justamente pelo sucesso atemporal do primeiro, o qual, segundo Franco, se dá pelo contexto de seu lançamento nos anos 90 e pelo ator prodígio Macaulay Culkin.

Do lado direito, um menino de cerca de 8 anos, loiro, com uma blusa vermelha, olhando para baixo segurando uma lata de tinta. Do lado esquerdo, um menino com idade parecida, usando óculos, cabelo escuro tigela, olhando para baixo.
Comparação de cenas de Esqueceram de Mim (Home Alone, 1990) e Esqueceram de Mim no Lar Doce Lar (Home Sweet Home Alone, 2021) [Imagens: Divulgação/20th Century Studios]

Por outro lado, também é possível destacar aqueles filmes que não pertencem a nenhuma época, uma vez que são repetidamente adaptados de geração em geração. Um exemplo é As Quatro Irmãs (Little Women, 1933), que, além de já ser originalmente a adaptação do livro Mulherzinhas (Louisa May Alcott, 1868),  ainda contou com dez remakes ao longo da história cinematográfica (dois deles minisséries), sendo o mais recente lançado no ano de 2019.

Quatro imagens das irmãs March nas diferentes adaptações.
A mãe e as irmãs March nas respectivas adaptações: As Quatro Irmãs (Little Women,1933), Quatro Destinos (Little Women,1954), Adoráveis Mulheres (Little Women,1994) e Adoráveis Mulheres (Little Women, 2019). [Imagens: Divulgação/RKO Radio Pictures, MGM, Columbia Pictures]

Outro longa que pode ser citado é Nasce Uma Estrela (A Star Is Born, 1937), cujo último filme fez grande sucesso entre o público, já teve quatro remakes, sempre mantendo o cerne da história, mas adaptando-se ao contexto atual de seus lançamentos. 

Em cada foto há uma mulher na frente do microfone cantando
A protagonista de Nasce Uma Estrela nas versões de 1937, 1954, 1976 e 2018, respectivamente. [Imagens: Divulgação/Selznick International Pictures, Transcona Enterprises, Barwood Films, MGM]

E o clássico Romeu e Julieta (Romeo and Juliet, 1936), história que o público conhece de cor, também não podia faltar. A trama já recebeu inúmeras adaptações desde seu surgimento como peça durante o século XVI por William Shakespeare, e no cinema, serviu de enredo para dezenas de remakes, alguns, seguindo à risca o contexto da história (como nas adaptações de 1936, 1968 e 2013), e outros, propondo releituras, como na icônica versão de 1996 (com Leonardo DiCaprio no papel de Romeu), na animação Gnomeu e Julieta (Gnomeo and Juliet, 2011) e, até mesmo, no próprio Amor Sublime Amor, mencionado acima.

Comparação de cenas dos filmes no trecho acima citados, em ordem cronológica. [Imagens: Divulgação/MGM, BHE Films, 20th Century Studios, Touchstone Pictures, Amber Entertainment]

Estas histórias, que são constantemente readaptadas, podem ser encaradas como atemporais, já que dialogam com questões que estão presentes em qualquer época, como ressalta a jornalista: “Acho que vale a pena você contar uma boa história de novo quantas vezes for necessário. Ela vai ser bem contada, vai ressoar, vai impactar de forma diferente”.

Opinião do público 

A divisão de opinião do público sobre os remakes ainda é acirrada. Enquanto alguns mantêm um preconceito acerca dessas produções e outros as demandam, se torna uma incógnita qual caminho o cinema deve tomar.

Existem aqueles que acreditam que certos filmes não tem a menor necessidade de um remake, e que as novas versões são piores do que as originais. É o caso de Iolanda Souza Lima, de 86 anos, que, ao ser questionada sobre a nova versão de 2019 de um dos seus clássicos preferidos, Quatro Destinos (Little Women, 1954), respondeu: “Eu não gostei. Achei o primeiro bem mais autêntico. Mesmo com toda essa tecnologia e apresentação, os filmes antigos tem muito mais alma, eles interpretam e transmitem [as emoções] melhor”. Outra entrevistada foi Bruna, de 15 anos, que acredita que alguns clássicos são, sim, intocáveis, como seu preferido E.T. O Extraterrestre (E.T. The Extraterrestrial, 1982), e diz não conseguir imaginar alguém querendo alterar essa eterna obra-prima. 

Por outro lado, também existem aqueles que só conhecem alguns filmes pelos seus remakes e desconhecem os originais. Bianca Camarotto e Joaquim Oliveira, ambos com 15 anos, afirmam em entrevista que adoram os filmes It – A Coisa (It, 2017) e A Fantástica Fábrica de Chocolate (Charlie and the Chocolate Factory, 2005),  mas nunca imaginariam que as obras eram remakes de versões originais mais antigas, mostrando que estas produções podem ser uma porta de entrada das novas gerações para conhecer velhas histórias.

Na parte superior, fotos em comparação dos filme It: a Coisa, em que um palhaço está dentro de um bueiro. Na parte inferior, comparação de A Fantástica Fábrica de chocolate, em cada foto um grupo de crianças e adultos estão em um jardim
Na metade superior, comparação de cenas de It: Uma Obra-prima do Medo (It, 1990) e It – A Coisa e, abaixo, comparação de cenas de  A Fantástica Fábrica de Chocolate (Charlie and the Chocolate Factory, 1971) e A Fantástica Fábrica de Chocolate. [Imagens: Divulgação/Lorimar Television, New Line Cinema, Warner Bros.]

Franco também trouxe um ponto importante na entrevista ao Cinéfilos: “Eu não acho que clássicos são intocáveis, não. Eu acho que clássicos também são produtos da época. São clássicos porque uma geração chegou e falou ‘nossa, isso é um clássico’, porque colocou-se num pedestal. Eu acho que vale a pena você questionar, justamente: foi um clássico, mas é racista. Foi um clássico, mas é misógino. É clássico, mas tem um monte de problema. É bom a gente melhorar, evoluir sempre é bom. Então, filmes que corrigem erros são sempre bem-vindos”.

As bilheterias no cinema podem ser um grande indicativo de para qual conclusão está tendendo essa discussão, mas, uma coisa é certa: entre cinema e streamings, os remakes predominam em um lugar. Segundo a cineasta, os streamings viraram um lugar para arriscar, enquanto o cinema precisa ter mais segurança no que vai lançar, porque tem muito em jogo, por isso as grandes produtoras apostam em histórias velhas que acreditam já ter sucesso garantido. A jornalista também ressalta que, assim como Hollywood sempre se sustentou pelas mesmas histórias, os remakes estão longe de sumir de cartaz: “O cinema é feito de boas histórias, e quando uma história rende, nada mais lógico do que contar essa história novamente”. 

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