Pelo vidro do carro, a menina olhava as gotas de chuva que caíam intensamente naquele momento. Apesar de estar meio emburrada por ter que doar seus brinquedos, a garota estava indo visitar um orfanato com sua mãe. Seu guarda-chuva amarelo era uma das únicas coisas que a acompanhavam. E assim se inicia Umbrella (2019), animação brasileira de oito minutos que tem chances, inclusive, de ser qualificada para a disputa do próximo Oscar (a primeira produção nacional do gênero a ter essa oportunidade).
Em um primeiro vislumbre, o que mais chama a atenção é a qualidade da animação apresentada pela equipe brasileira. Lembrando o traço artístico desenvolvido por produtoras como Pixar, DreamWorks, entre outras, parece que estamos vendo uma obra de arte em movimento em determinados momentos, tal como o flashback demonstrado durante a narrativa. Apesar disso, as cores envolvidas na animação focam mais no marrom e cinza, harmonizando com a chuva presente na maioria do tempo.
A cor que quebra essa coloração neutra é o amarelo. Como muitos sabem, a cor amarela simboliza o sol, ou seja, a prosperidade e a felicidade. E de fato, para Joseph, protagonista desta obra e morador do já citado orfanato, aquele guarda-chuva amarelo é a lembrança que o garotinho tem do pai e de todos os momentos que viveram juntos, até o instante que é deixado na porta de seu novo lar. Mas para ele, o guarda-chuva também é esperança e a chance de ter um futuro promissor.
O nome do filme não é em vão, tendo conexão com o roteiro e sendo a peça principal para seu andamento. Joseph precisa do guarda-chuva amarelo da nova menina, pois é sua base de sustentação, o que leva a um significado parecido com os símbolos auspiciosos do Budismo. Na religião de Buda, o guarda-chuva representa a segurança e o refúgio, além da proteção contra o mal. Órfão, Joseph precisa deste local seguro.
Em uma passagem do longa A Máquina do Tempo (Time Machine, 2002), o personagem de Jeremy Irons cita uma frase que se encaixa perfeitamente no contexto desta animação: “Todos nós temos nossas máquinas do tempo. Algumas nos levam para trás, são chamadas de memórias. Outras nos levam para frente, são chamadas sonhos”. Joseph, de Umbrella, encontra sua máquina do tempo em um simples guarda-chuva, única lembrança real e alcançável naquele momento.
O curta é mudo, mas mesmo sem palavras, ele diz muito. O carinho e o sentimento envolvido podem ser percebidos instantaneamente. “Cada cena de Umbrella é muito emocionante para nós; cada cor e textura e cada personagem é inspirado por alguém ou algo em nossas vidas”, comenta a diretora Helena Hilario, em entrevista ao site Revista Crescer. Para ela, a principal mensagem do curta é a empatia, e é exatamente isso que vemos no desenrolar da história.
“Todo mundo passa por situações que nem imaginamos, por isso devemos ser gentis uns com os outros. Por isso pensamos em trazer a empatia e a esperança para essa narrativa. Algo que precisamos cada vez mais e mais”, comenta a diretora. Considerando o contexto vivido atualmente pelo mundo, Helena não poderia estar mais certa.
Inspirado em uma situação vivenciada por uma pessoa próxima da diretora, Umbrella virou destaque por onde passou: Chicago International Film Festival, Tribeca, Cinequest, entre outros. E devido a esse sucesso, a animação pode realmente entrar na disputa pelo Oscar.
O curta ficará disponível gratuitamente entre os dias 7 e 21 de janeiro no canal de Youtube da Stratostorm. Conselho de amigo cinéfilo: assistam até o final, pois os créditos mostram momentos importantes para o entendimento completo da narrativa. Confira o trailer:
*Imagem de capa: Divulgação/Stratostorm